segunda-feira, 24 de junho de 2013

redesenhando macalé

o blog banda desenhada faz aniversário de dois anos de vida e quem ganha presente é você! ou eu. ou nós. ou todos. disponível para download gratuitoe volto pra curtir é um tributo a jards macalé tendo seu disco de estreia, lançado originalmente em 1972, como bússola conceitual. estão lá suas dez faixas mais o hit “vapor barato”  que gal costa gravou em 1971 e jards somente em 1998 (no disco o q faço é música), interpretados por jovens artistas de várias partes do país sob curadoria de márcio bulk (o idealizador da banda desenhada). olha a capa do disco de jards, um dos melhores da música brasileira.


como todo tributo que se preze, e volto pra curtir é irregular e cada ouvinte terá suas preferidas. gostei de “farinha do desprezo” do letuce, “let's play that” do metá metá, “mal secreto” do apanhador só (música que deu nome ao esforçado e, portanto, tem um importante valor sentimental aqui por essas bandas), “revendo amigos” de márcia castro e das versões mínimas de “78 rotações” de arícia mess e “movimento dos barcos” de bruno cosentino & marcos campelo. não gostei de “vapor barato” das garotas suecas, “hotel das estrelas” de léo cavalcanti e “meu amor me agarra & geme & treme & chora & mata” do filipe catto & pipo pegoraro. no disco original de jards existem dois covers numa faixa só, “farrapo humano” (luiz melodia) e “a morte” (gilberto gil), que no tributo viraram faixas independentes interpretadas por rafael castro (com tulipa ruiz nos vocais) e ava rocha, respectivamente. gostei de ambas, mas ainda tenho problemas com ava, algo cerebral demais me incomoda no seu canto. mas baixe o tributo e tire suas próprias conclusões. jards nunca é demais.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

marcelo D2, o imparável

mais um perfil grande e bacana pra revista da gol, e dessa vez com marcelo D2, sujeito rapper que eu ainda não tinha entrevistado. conversamos por cerca de uma hora na loja temporária que abriu na galeria ouro fino, nos jardins, após as fotos tiradas por alex batista que ilustram o perfil. como todo bom carioca, D2 fala com desenvoltura, franqueza e humor, e fala de tudo. o resultado foge do papo manjado para lançar trabalho novo (no caso, o bom nada pode me parar) e tem uma parte que me interessou pessoalmente que é a sua visão sobre o passado, o presente e o futuro do rap brasileiro (e da sua contribuição nele). e aqui no esforçado, como sempre, uma versão um pouco maior da que foi impressa e com fotos que tirei durante o encontro.



LIBERDADE É PRA QUEM TEM

Comemorando 20 anos de carreira, e 15 do primeiro trabalho solo, Marcelo D2 lança Nada Pode Me Parar e em entrevista exclusiva fala sobre família, a volta do Planet Hemp e a boa fase do rap brasileiro

Rua Augusta, São Paulo, 4h20 da tarde. Marcelo D2 arruma o boné para cobrir o cabelo que está crescendo absolutamente fora de controle e já com vários fios brancos. Não aparenta 45 anos, principalmente vestido assim de bermuda e tênis, mas basta o fotógrafo pedir que se agache diante de um mural desenhado pelo amigo Flip para seus ossos reclamarem. Nessa hora o título do novo disco do rapper, Nada Pode Me Parar, faz um sentido todo especial e ele ri da situação.

De tempos em tempos a sessão de fotos é interrompida por fãs querendo levar uma lembrança, dar um abraço, fazer alguma piada, e D2 atende a todas e todos. Os tipos que o abordam são os mais diversos: de uma grávida a um jovem engravatado, passando por seguranças dentro de um carro-forte e um bêbado carregando um velocípede. Alguns o conhecem desde os tempos do Planet Hemp, mas uma boa parte já o acompanha na sua procura pela batida perfeita na mistura de rap com samba.

“Já vi que vai ter um monte de gente falando que o Nada Pode Me Parar é a minha volta ao rap, muito por causa do disco cantando Bezerra da Silva [lançado em 2010], mas eu nunca saí do rap! É engraçado isso porque pro rap eu sou do samba e pro samba eu sou do rap [risos]. A verdade é que o disco do Bezerra me deu confiança pra cantar e acabei me aprofundando bastante no samba, quero ir mais fundo até, mas sou do rap e queria que esse fosse um disco de rap”, diz sobre seu sexto trabalho com inéditas exatos 15 anos após sua estreia solo em Eu Tiro é Onda.

D2 está em São Paulo para lançar uma loja temporária com roupas de sua marca Manifesto 33 1/3 (até então vendida apenas em estabelecimentos multimarcas), shapes de skate, isqueiros, copos americanos, fones de ouvido, bonés e outros produtos relacionados ao seu novo disco (sua ideia é levar a loja junto com a turnê no segundo semestre). A abertura acontecerá em dois dias e já está quase tudo pronto, com direito a neon na parede (“Cara, acho que só montei essa loja por causa do neon! Sempre quis ter um neon!”, confessa e gargalha). Após a segunda e última rodada de fotos para ilustrar esta reportagem ele pode então se esparramar no sofá, abrir uma cerveja e falar tranquilamente.


“O título do disco veio de uma lembrança de quando morava numa kitchenette no Catete com o Skunk [um dos fundadores do Planet Hemp, morto precocemente em 1994]. Tinha uma frase pixada no quarto... ‘Eu já caí no chão só que me levantei / Eu faço meu sistema, / Eu dito a minha lei! / Nada pode me parar’, que é um dos versos de um rap do Thaíde & DJ Hum. Era um hino pra gente. Algumas pessoas ficaram incomodadas com o título, mas eu adoro porque acho que tem aquela arrogância boa do rap”, e de vez em quando D2 olha para a TV da loja, no qual são exibidos os clipes que a cineasta Gandja Monteiro fez para todas as 15 faixas do disco.

No telão aparecem cenas de D2 em Nova York, Amsterdam, Los Angeles, Rio de Janeiro, Recife e Luanda, um pouco da grande jornada global que foi a gravação de Nada Pode Me Parar. “Foi com certeza o disco mais longo da minha carreira. Comecei no carnaval de 2011 em Florianópolis e o processo todo levou um ano e pouquinho. Ser um disco assim road movie aconteceu naturalmente porque fui gravando em lugares onde estava indo ou que achava interessante fazer algo”.

Entre escolhas e oportunidades internacionais, o carioca gravou “Na Veia” com banda completa no lendário estúdio Electric Lady criado por Jimi Hendrix em Nova York, convidou os espanhóis do Cooking Soul (que já trabalharam com Jay-Z e Kanye West) para produzir “MD2”, conheceu o cantor Aloe Blacc que acabou participando de “Danger Zone”, e registrou “Vou Por Aí” com o amigo Mário Caldato Jr. (Beastie Boys) em Los Angeles por causa do livro On The Road de Jack Kerouac. Ainda contou com as presenças do trio californiano Pac Div e da cantora nova-iorquina Joya Bravo.

No Brasil, com exceção do amigo de longa data DJ Nuts, o rapper acabou se cercando mais uma vez de uma nova geração: Nave, Renan Saman e os conterrâneos Papatinho e Batoré (ConeCrew), Akira Presidente e Hélio Bentes (Ponto de Equilíbrio). E, claro, o filho mais velho Stephan, cada vez mais atuante. “Me sinto renovado trabalhando com eles, parece que sou eu dez anos atrás. Eles tem o gás que acho necessário e importante pro disco e pra mim”.

O exemplo de Nave é revelador desse bom trânsito que D2 tem entre gerações. O curitibano tinha 22 anos em 2005 e estava começando a produzir bases quando recebeu a ligação do já popstar rapper carioca. “Não acreditei na hora, achei que era trote, mas era ele mesmo e foi louco porque ele e o Planet Hemp foram a minha maior influência em termos de rap brasileiro”, relembra Nave. Hoje, três discos e 11 parcerias depois [quatro neste Nada Pode Me Parar], diz que D2 “alcançou um nível de amadurecimento artístico, um equilíbrio entre simplicidade e sofisticação, que qualquer um reconhece e sabe o que ele está fazendo, desde a minha tia até um criança de 7 anos”.


Voltando ao Nada Pode Me Parar, se o processo de gravação foi repleto de milhagens, novos e velhos amigos, a pós-produção reservou algumas surpresas. “Pra lançar o disco acabou demorando mais um ano porque tive problemas com samples [trechos de músicas]. Acabei tirando muita coisa porque não consegui autorização. Esse foi o lado ruim. O bom da demora foram os shows do Planet Hemp”, e lembra que a banda, celebrando duas décadas de seu surgimento, ainda fará dois ou três shows esse ano. De certo mesmo um no Central Park, em Nova York, e outro no Festival Lollapalooza, em Chicago.

“Posso te listar umas dez coisas legais dessa volta, mas o mais legal mesmo foi a gente voltar a se falar. Colocou as coisas em seus devidos lugares. Sei agora o que é do Planet Hemp e o que é do meu trabalho solo. As coisas ficaram mais claras pra mim. E foi revigorante tocar Planet depois de dez anos parado, foi f***, foi demais!”, e mata, em um gole só, o resto da cerveja e pede licença. “Cara, preciso ir ali no banheiro se não vou começar a responder rapidão tipo ‘sim’, ‘não’, ‘pode ser’, ‘com certeza’ [risos]”.


Volta então aliviado e propõe mais uma rodada de saideira. “Aproveito mais hoje em dia que antigamente. Tenho mais de 40 anos, quatro filhos – Stephan (21), Lourdes (13), Luca (11) e Maria Joana (8) – , estou casado há 13 anos, não dá mais pra ser aquela coisa doidona do tempo do Planet Hemp. A família me ajudou nisso também. Sempre fui um pai carinhoso, mas não era presente. Nunca fiz com o Stephan o que faço com os mais novos de acordar zumbi às 6 da manhã pra levar na escola. Nos últimos anos, finalmente, me tornei um pai de verdade”.

Para melhorar ainda mais o humor de D2, o ótimo momento pessoal vive em harmonia com a cidade que tanto ama e que é cantada em rimas e beats em “Rio”, uma das faixas de Nada Pode Me Parar. “Sem hipocrisia nenhuma... hoje tenho dinheiro, moro bem, então a cidade está boa pra mim [risos], mas percebi que o carioca voltou a gostar muito da cidade. Não gosto de elogiar ninguém, sou contra tudo e contra todos, mas acho que a política de segurança tem sido feita de uma forma interessante... porra, o Rio voltou a ter carnaval de rua, que é demais, um monte de gente bonita na rua e não precisa comprar abadá pra participar... tenho gostado da cidade, mas é também outro momento meu nela”.


Positivo e operante na cultura hip hop há 20 anos, D2 tem ainda acompanhado com curiosidade e interesse a renovação do rap nacional, além de ter ideias bem claras de alguém quem está por dentro dessa história toda. “Acho que o rap demorou pra se renovar no Brasil. Teve uma década ou até mais que todo mundo só queria ser Racionais, sem ser culpa deles, lógico. Racionais é Racionais, é bom pra c******, mas eles são eles. Nessa época estava fazendo outra coisa, mas aquilo me incomodava pra caramba, parecia uma igreja”.

O que D2 está falando, entre um gole e outro, é da liberdade que o hip hop, e consequentemente o rap, contém em sua essência e que não pode e nem deve ser parada por nada neste mundo. “O rap é uma música urbana que se apropria das outras, não pode ser puro, não pode ter uma cara só, e esses moleques novos tem essa liberdade de fazer a sua parada, cada um no seu papel. Tem a loucura da ConeCrew, a sabedoria do Emicida, a vontade de experimentar do Criolo, e por aí vai”. Mas, modéstia às favas, sabe que contribuiu e muito para esse estado das coisas.

“Hoje em dia essa mistura de rap com samba tá mais atual que na época que comecei a fazer, quinze anos atrás. Sinceramente não vejo como o rap brasileiro possa ser uma música respeitada sem usar elementos brasileiros. Isso é uma coisa. Só que acho que o rap ainda é turminha... gostaria muito ver minha tia ouvindo rap, por exemplo... quer dizer, ainda tem um caminho longo para o rap ser popular como um Zeca Pagodinho, mas hoje vejo o caminho mais aberto”, e mata a terceira cerveja, hora de ir embora. Em entrevista por telefone, Pagodinho retribui a gentileza: “Temos a mesma levada de partideiro, essa coisa da rima e do improviso. Ele tem carisma, é inteligente, e fala a nossa língua, fala da nossa realidade e denuncia através das músicas dele coisas que muita gente não sabe”.

O dia seguinte reserva ao rapper-partideiro alguns móveis para arrastar, quadros para pregar e, talvez, uma festa. Sorri com a lembrança dessa agenda. “Quando ficar maduro a gente volta a falar sobre essa parada da maturidade”.





BOX - D2, um bom driblador

Apaixonado por futebol e flamenguista doente, Marcelo D2 já fez até rap homenageando o ex-jogador Ronaldo Fenômeno (“Sou Ronaldo”), atual membro do comitê organizador da Copa do Mundo FIFA de 2014. Sobre o evento e a Copa das Confederações, que começa agora em junho, tem uma posição bastante clara e realista. “O que você prefere? 100 % de nada ou 50 % de alguma coisa? A Copa é meio isso. Acho que vai ser uma coisa importante pra caramba pro brasileiro e o brasileiro gosta de se sentir importante. A gente tá num momento f***, todo mundo viajando, o dinheiro tá forte, a autoestima tá boa, e acho que a Copa veio num momento perfeito com o Brasil tentado se arrumar. E cada um que se vire com isso. Quer fingir que não tá sendo enganado e continuar ficar assistindo sua TV de plasma? Fica aí. Quer fazer disso uma oportunidade e crescer realmente? Taí também. Acho que a gente vive um bom momento. Tem coisa pra consertar? Pra c******! Por isso que digo que o Brasil é um país ótimo pra fazer rap. Quer mais assunto pra rapper do que aqui?”, afirma.