LIBERDADE É PRA QUEM TEM
Comemorando 20 anos de carreira, e 15 do primeiro trabalho
solo, Marcelo D2 lança Nada Pode Me Parar
e em entrevista exclusiva fala sobre família, a volta do Planet Hemp e a boa
fase do rap brasileiro
Rua Augusta, São Paulo, 4h20 da tarde. Marcelo D2 arruma o
boné para cobrir o cabelo que está crescendo absolutamente fora de controle e
já com vários fios brancos. Não aparenta 45 anos, principalmente vestido assim
de bermuda e tênis, mas basta o fotógrafo pedir que se agache diante de um
mural desenhado pelo amigo Flip para seus ossos reclamarem. Nessa hora o título
do novo disco do rapper, Nada Pode Me
Parar, faz um sentido todo especial e ele ri da situação.
De tempos em tempos a sessão de fotos é interrompida por fãs
querendo levar uma lembrança, dar um abraço, fazer alguma piada, e D2 atende a
todas e todos. Os tipos que o abordam são os mais diversos: de uma grávida a um
jovem engravatado, passando por seguranças dentro de um carro-forte e um bêbado
carregando um velocípede. Alguns o conhecem desde os tempos do Planet Hemp, mas
uma boa parte já o acompanha na sua procura pela batida perfeita na mistura de
rap com samba.
“Já vi que vai ter um monte de gente falando que o Nada Pode Me Parar é a minha volta ao
rap, muito por causa do disco cantando Bezerra da Silva [lançado em 2010], mas eu nunca saí do rap! É engraçado isso porque
pro rap eu sou do samba e pro samba eu sou do rap [risos]. A verdade é que o disco do Bezerra me deu confiança pra
cantar e acabei me aprofundando bastante no samba, quero ir mais fundo até, mas
sou do rap e queria que esse fosse um disco de rap”, diz sobre seu sexto
trabalho com inéditas exatos 15 anos após sua estreia solo em Eu Tiro é Onda.
D2 está em São Paulo para lançar uma loja temporária com
roupas de sua marca Manifesto 33 1/3 (até então vendida apenas em
estabelecimentos multimarcas), shapes de skate, isqueiros, copos americanos,
fones de ouvido, bonés e outros produtos relacionados ao seu novo disco (sua
ideia é levar a loja junto com a turnê no segundo semestre). A abertura
acontecerá em dois dias e já está quase tudo pronto, com direito a neon na
parede (“Cara, acho que só montei essa loja por causa do neon! Sempre quis ter
um neon!”, confessa e gargalha). Após a segunda e última rodada de fotos para
ilustrar esta reportagem ele pode então se esparramar no sofá, abrir uma cerveja
e falar tranquilamente.
“O título do disco veio de uma lembrança de quando morava
numa kitchenette no Catete com o Skunk [um
dos fundadores do Planet Hemp, morto precocemente em 1994]. Tinha uma frase
pixada no quarto... ‘Eu já caí no chão só que me levantei / Eu faço meu sistema,
/ Eu dito a minha lei! / Nada pode me parar’, que é um dos versos de um rap do
Thaíde & DJ Hum. Era um hino pra gente. Algumas pessoas ficaram incomodadas
com o título, mas eu adoro porque acho que tem aquela arrogância boa do rap”, e
de vez em quando D2 olha para a TV da loja, no qual são exibidos os clipes que a
cineasta Gandja Monteiro fez para todas as 15 faixas do disco.
No telão aparecem cenas de D2 em Nova York, Amsterdam, Los
Angeles, Rio de Janeiro, Recife e Luanda, um pouco da grande jornada global que
foi a gravação de Nada Pode Me Parar.
“Foi com certeza o disco mais longo da minha carreira. Comecei no carnaval de
2011 em Florianópolis e o processo todo levou um ano e pouquinho. Ser um disco
assim road movie aconteceu
naturalmente porque fui gravando em lugares onde estava indo ou que achava
interessante fazer algo”.
Entre escolhas e oportunidades internacionais, o carioca
gravou “Na Veia” com banda completa no lendário estúdio Electric Lady criado
por Jimi Hendrix em Nova York, convidou os espanhóis do Cooking Soul (que já
trabalharam com Jay-Z e Kanye West) para produzir “MD2”, conheceu o cantor Aloe
Blacc que acabou participando de “Danger Zone”, e registrou “Vou Por Aí” com o
amigo Mário Caldato Jr. (Beastie Boys) em Los Angeles por causa do livro On The Road de Jack Kerouac. Ainda
contou com as presenças do trio californiano Pac Div e da cantora nova-iorquina
Joya Bravo.
No Brasil, com exceção do amigo de longa data DJ Nuts, o
rapper acabou se cercando mais uma vez de uma nova geração: Nave, Renan Saman e
os conterrâneos Papatinho e Batoré (ConeCrew), Akira Presidente e Hélio Bentes
(Ponto de Equilíbrio). E, claro, o filho mais velho Stephan, cada vez mais
atuante. “Me sinto renovado trabalhando com eles, parece que sou eu dez anos
atrás. Eles tem o gás que acho necessário e importante pro disco e pra mim”.
O exemplo de Nave é revelador desse bom trânsito que D2 tem
entre gerações. O curitibano tinha 22 anos em 2005 e estava começando a
produzir bases quando recebeu a ligação do já popstar rapper carioca. “Não
acreditei na hora, achei que era trote, mas era ele mesmo e foi louco porque
ele e o Planet Hemp foram a minha maior influência em termos de rap brasileiro”,
relembra Nave. Hoje, três discos e 11 parcerias depois [quatro neste Nada Pode Me Parar], diz que D2
“alcançou um nível de amadurecimento artístico, um equilíbrio entre
simplicidade e sofisticação, que qualquer um reconhece e sabe o que ele está
fazendo, desde a minha tia até um criança de 7 anos”.
Voltando ao Nada Pode
Me Parar, se o processo de gravação foi repleto de milhagens, novos e velhos
amigos, a pós-produção reservou algumas surpresas. “Pra lançar o disco acabou
demorando mais um ano porque tive problemas com samples [trechos de músicas]. Acabei tirando muita coisa porque não
consegui autorização. Esse foi o lado ruim. O bom da demora foram os shows do
Planet Hemp”, e lembra que a banda, celebrando duas décadas de seu surgimento,
ainda fará dois ou três shows esse ano. De certo mesmo um no Central Park, em
Nova York, e outro no Festival Lollapalooza, em Chicago.
“Posso te listar umas dez coisas legais dessa volta, mas o
mais legal mesmo foi a gente voltar a se falar. Colocou as coisas em seus
devidos lugares. Sei agora o que é do Planet Hemp e o que é do meu trabalho
solo. As coisas ficaram mais claras pra mim. E foi revigorante tocar Planet
depois de dez anos parado, foi f***, foi demais!”, e mata, em um gole só, o
resto da cerveja e pede licença. “Cara, preciso ir ali no banheiro se não vou
começar a responder rapidão tipo ‘sim’, ‘não’, ‘pode ser’, ‘com certeza’ [risos]”.
Volta então aliviado e propõe mais uma rodada de saideira.
“Aproveito mais hoje em dia que antigamente. Tenho mais de 40 anos, quatro
filhos – Stephan (21), Lourdes (13), Luca (11) e Maria Joana (8) – , estou
casado há 13 anos, não dá mais pra ser aquela coisa doidona do tempo do Planet
Hemp. A família me ajudou nisso também. Sempre fui um pai carinhoso, mas não
era presente. Nunca fiz com o Stephan o que faço com os mais novos de acordar
zumbi às 6 da manhã pra levar na escola. Nos últimos anos, finalmente, me
tornei um pai de verdade”.
Para melhorar ainda mais o humor de D2, o ótimo momento
pessoal vive em harmonia com a cidade que tanto ama e que é cantada em rimas e
beats em “Rio”, uma das faixas de Nada
Pode Me Parar. “Sem hipocrisia nenhuma... hoje tenho dinheiro, moro bem,
então a cidade está boa pra mim [risos],
mas percebi que o carioca voltou a gostar muito da cidade. Não gosto de elogiar
ninguém, sou contra tudo e contra todos, mas acho que a política de segurança tem
sido feita de uma forma interessante... porra, o Rio voltou a ter carnaval de
rua, que é demais, um monte de gente bonita na rua e não precisa comprar abadá
pra participar... tenho gostado da cidade, mas é também outro momento meu nela”.
Positivo e operante na cultura hip hop há 20 anos, D2 tem ainda
acompanhado com curiosidade e interesse a renovação do rap nacional, além de
ter ideias bem claras de alguém quem está por dentro dessa história toda. “Acho
que o rap demorou pra se renovar no Brasil. Teve uma década ou até mais que
todo mundo só queria ser Racionais, sem ser culpa deles, lógico. Racionais é
Racionais, é bom pra c******, mas eles são eles. Nessa época estava fazendo
outra coisa, mas aquilo me incomodava pra caramba, parecia uma igreja”.
O que D2 está falando, entre um gole e outro, é da liberdade
que o hip hop, e consequentemente o rap, contém em sua essência e que não pode
e nem deve ser parada por nada neste mundo. “O rap é uma música urbana que se
apropria das outras, não pode ser puro, não pode ter uma cara só, e esses
moleques novos tem essa liberdade de fazer a sua parada, cada um no seu papel.
Tem a loucura da ConeCrew, a sabedoria do Emicida, a vontade de experimentar do
Criolo, e por aí vai”. Mas, modéstia às favas, sabe que contribuiu e muito para
esse estado das coisas.
“Hoje em dia essa mistura de rap com samba tá mais atual que
na época que comecei a fazer, quinze anos atrás. Sinceramente não vejo como o
rap brasileiro possa ser uma música respeitada sem usar elementos brasileiros. Isso
é uma coisa. Só que acho que o rap ainda é turminha... gostaria muito ver minha
tia ouvindo rap, por exemplo... quer dizer, ainda tem um caminho longo para o
rap ser popular como um Zeca Pagodinho, mas hoje vejo o caminho mais aberto”, e
mata a terceira cerveja, hora de ir embora. Em entrevista por telefone,
Pagodinho retribui a gentileza: “Temos a mesma levada de partideiro, essa coisa
da rima e do improviso. Ele tem carisma, é inteligente, e fala a nossa língua,
fala da nossa realidade e denuncia através das músicas dele coisas que muita
gente não sabe”.
O dia seguinte reserva ao rapper-partideiro alguns móveis
para arrastar, quadros para pregar e, talvez, uma festa. Sorri com a lembrança
dessa agenda. “Quando ficar maduro a gente volta a falar sobre essa parada da
maturidade”.
BOX - D2, um bom driblador
Apaixonado por futebol e flamenguista doente, Marcelo D2 já
fez até rap homenageando o ex-jogador Ronaldo Fenômeno (“Sou Ronaldo”), atual membro
do comitê organizador da Copa do Mundo FIFA de 2014. Sobre o evento e a Copa
das Confederações, que começa agora em junho, tem uma posição bastante clara e
realista. “O que você prefere? 100 % de nada ou 50 % de alguma coisa? A Copa é
meio isso. Acho que vai ser uma coisa importante pra caramba pro brasileiro e o
brasileiro gosta de se sentir importante. A gente tá num momento f***, todo
mundo viajando, o dinheiro tá forte, a autoestima tá boa, e acho que a Copa
veio num momento perfeito com o Brasil tentado se arrumar. E cada um que se
vire com isso. Quer fingir que não tá sendo enganado e continuar ficar
assistindo sua TV de plasma? Fica aí. Quer fazer disso uma oportunidade e
crescer realmente? Taí também. Acho que a gente vive um bom momento. Tem coisa
pra consertar? Pra c******! Por isso que digo que o Brasil é um país ótimo pra
fazer rap. Quer mais assunto pra rapper do que aqui?”, afirma.
2 comentários:
Marcelo D2 nunca fui a nenhum show mais tenho todos os cd completo meus 18 anos agora e ai sim vou começar a participar mais o chato e q moro em Recife terra d Chico Science mais eu vou realizar meu sonho de ir ao show do D2 e do Planet Hemp que tbm acompanho sou muito fã ando por ai com camisas rsrsrs e o D2 com esse Carinho q ele tem pelos fãs essa inteligência ele e f### pro Brasil Planet Rock, A procura da batida Perfeita, eu tiro e onda e outros e agora Nada Pode Me Parar, Grande D2.
sempre foi um vacilão..... nunca bateu um prego , vagabundo.
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