terça-feira, 31 de março de 2009

samba 65

março tá acabando. e exatos três anos atrás saiu um texto meu na saudosa bizz de ricardo alexandre. a pauta veio dele: o encontro do pessoal da bossa nova com os compositores do morro, ano de 1965. e na revista ficou entre uma matéria sobre o evanescence (a capa) e uma entrevista com o fatboy slim.

um de meus textos mais longos, uma das reportagens mais complexas que tive nas mãos (e aí vai um agradecimento especial a ronaldo evangelista que ajudou a descascar o abacaxi). detalhe importante: a imagem que ilustra o texto é do indispensável acervo hermínio bello de carvalho.

CONEXÃO ENTRE O MORRO E O ASFALTO

Ou de como Zé Kéti, Nara Leão, Cartola, Carlos Lyra e outros bambas tentaram, aos trancos e barrancos, estabelecer uma ponte entre a bossa nova e o samba

As balas perdidas não mentem: o asfalto e o morro não se entendem mais, e isso não é de hoje. Mas no terreno da música tudo vai muito bem, obrigado: o samba é a voz de toda uma nova geração, da Lapa carioca até a Vila Madalena paulistana e espalhada por todo o Brasil. Hoje é fácil Marcelo D2 dizer que “Você quer sair do gueto / Mas a sua mente é o gueto / Você quer fugir do gueto / Mas o mundo inteiro é o gueto”, mas quando Nara Leão gravou, no início da década de 1960, sambas de compositores do morro então desconhecidos, como Zé Kéti, o buraco era mais embaixo. Uma cantora branca, moradora de um apartamento com vista para o mar e ligada à bem sucedida, e também jovem, bossa nova cantando sambas de compositores negros e mais velhos sobre a realidade dos morros soou estranho para muita gente. A bossa nova de barquinhos e tardinhas deveria ser engajada? O morro e o asfalto podiam se entender? A criação, em 1961, do Centro de Cultura Popular da UNE e o surgimento, em 1963, do Zicartola, a primeira casa de samba do Brasil, estabeleceram as primeiras conexões entre pontas soltas da realidade social e musical brasileira.

“Na bossa nova era muito uma questão de forma, e depois de um tempo tudo foi se tornando uma mesmice”, diz o violonista e compositor Carlos Lyra. Autor de clássicos como “Lobo bobo”, “Saudade fez um samba” e “Maria Ninguém”, gravadas por João Gilberto em seu primeiro LP, Chega de saudade (1959), Lyra foi um dos membros mais ativos e polêmicos da primeira geração da bossa nova. “A forma era importante, mas eu também queria que houvesse uma preocupação maior com o conteúdo e que tivesse realidade nas letras", esclarece, tomando para si os méritos de ter dado o pontapé inicial à criação de uma bossa nova mais “realista”.

Ligado ao Partido Comunista e ao Teatro de Arena, Lyra foi um dos fundadores, ao lado do ator e dramaturgo Oduvaldo Vianna Filho (Vianinha), do poeta Ferreira Gullar e do cineasta Leon Hirszman, do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, o CPC-UNE, em 1961. "Fiz parte desse sonho do CPC de mudar o Brasil. Era um ambiente muito democrático e muito produtivo, apesar do pouco dinheiro que tínhamos", relembra Lyra. O CPC atuou em diversas áreas culturais, desde o cinema e o teatro até a literatura, mas foi no terreno mais acessível da música que teve seu maior cartaz. “Nosso objetivo era procurar a raiz da música brasileira nos morros e no Nordeste. Isso daria um conteúdo realista para a música que vinha da bossa nova”, diz Lyra. Era uma doce utopia este encontro sem ressentimentos entre os intelectuais e músicos burgueses cariocas e os compositores das periferias de então, mas de real mesmo aconteceu, em dezembro de 1962, a 1ª Noite da Música Popular Brasileira no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, reunindo Pixinguinha, Vinicius de Moraes e a bateria da Portela.

De fora dos movimentos estudantis e da música cantada pela Zona Sul carioca, e dentro do mundo das escolas de samba, o então pouco conhecido compositor Elton Medeiros relembra o período: “O pessoal da bossa nova tinha um interesse legítimo na realidade social brasileira e mesmo os que não eram politizados traziam uma atitude de renovação. E se provoca uma transformação cultural, tem um cunho ideológico, consciente ou não”. No entanto, não deixa de ser esclarecedor que por trás das boas intenções da diretoria do CPC existisse um discurso extremamente elitista, fruto da intelectualidade da UNE. Publicado em 1962, o Manifesto do CPC-UNE definiu a instituição como “fruto da própria iniciativa, da própria combatividade criadora do povo” para logo depois afirmar que “os membros do CPC optaram por ser povo”. Tal atitude paternalista não passava de populismo que acabava sendo revelado, sem meias palavras, em outro trecho do manifesto: “a arte do povo é tão desprovida de qualidade artística e de pretensões culturais que nunca vai além de uma tentativa tosca e desajeitada de exprimir fatos triviais dados à sensibilidade mais embotada”. Existia um grande, imenso, abismo entre o povo idealizado pela UNE e o povo real, qualquer que fosse ele.

hermínio sentadinho no palco improvisado com
nelson cavaquinho ao violão e zé keti cantando


Mas não existia nada de tosco ou desajeitado nas músicas de Cartola, Zé Kétti e Nelson Cavaquinho, presenças regulares nos shows produzidos pelo próprio CPC nas universidades. “São compositores maravilhosos, muito fortes, e foi revitalizador este encontro porque era um contraste muito estimulante”, afirma Lyra. Faltava somente um lugar para todos se encontrarem e ainda comer, beber, selar parcerias, salvar o Brasil e o mundo, fazer e ouvir música. No ano de 1963, em um sobrado na Rua da Carioca, número 53, centro do Rio de Janeiro, surgiu o Zicartola, restaurante e bar comandado pelo sambista Cartola e sua mulher, Dona Zica. “Foi a primeira casa de samba do país", afirma o jornalista Sérgio Cabral. Opinião compartilhada com o compositor, poeta e produtor musical Hermínio Bello de Carvalho: “O Zicartola era um reduto de intelectuais de esquerda, e era o centro de discussões estéticas importantes para o cinema, a dramaturgia e a música popular. Digo sempre que ali se fincaram as raízes de dois importantes musicais: o Rosa de Ouro e o Opinião, onde levado pelo amigo Vianinha, estreei como compositor”. Outro freqüentador, Elton Medeiros, chegou ao bar para mostrar seus sambas e se apresentar, mas acabou conhecendo “o pessoal da Zona Sul”. “Era um lugar para ouvir e cantar junto, mas também de trocas entre pessoas que tinham preocupações semelhantes. O pessoal do Cinema Novo, do CPC, artistas plásticos, jornalistas, escritores, sambistas e muitos outros. Nunca existiu nada parecido nem antes nem depois em todo o Brasil”, acredita.

O Zicartola não possuía luxo algum, mas tinha um cardápio com sambas de todos os tipos e idades. “O idealizador das noitadas musicais do Zicartola foi, indiscutivelmente, o Zé Kéti. Eu apenas formatei a parte musical e, inclusive, datilografava os cardápios iniciais da casa”, explicou Hermínio sobre os shows de quartas e sextas. Outros dois amigos, Sérgio Cabral e Albino Pinheiro (fundador da Banda de Ipanema), também faziam as vezes de produtores musicais. “Tinha muito improviso. Por exemplo, eu inventei a Ordem da Cartola Dourada para agraciar os convidados especiais que iam lá dar uma força pro Cartola”, seguiu Hermínio nas lembranças e Cabral completou que “foi um jeito de chamar músicos que de outra forma não iriam porque não tínhamos cachê. Desse jeito apareceram Tom Jobim, Dorival Caymmi, Ataulfo Alves, Elizeth Cardoso, um monte de gente. Aí rolava sempre uma canja”. Jovens talentos também apareciam e um deles, o tímido Paulinho da Viola, veio por insistência de Hermínio.

Casa cheia, muita música, muitos planos e em meio a toda esta movimentação Cartola via sua carreira de compositor tomar um novo fôlego, após mais de vinte anos de silêncio e pobreza. No entanto, corria 1964, o ano que viu a manhã do dia 1º de abril ser tomada por tanques em muitas capitais e os militares darem um golpe de Estado, depondo o presidente João Goulart. A UNE foi extinta (e consequentemente o CPC), sua sede foi queimada e todos os seus membros foram presos ou colocados sob vigilância. O Zicartola sobreviveu, mas com medo.

Curiosamente, a primeira alfinetada da música brasileira em direção aos militares veio pela voz de um jovem cantora estreante, Nara Leão, que lançou seus dois primeiros LPs em 1964. O LP de estréia, Nara, trouxe Nelson Cavaquinho (“Luz negra”), Zé Kéti (“Diz que fui por aí”) e a dobradinha Cartola e Elton Medeiros (“O sol nascerá”), além do primeiro hino pós-golpe, assinado por Carlos Lyra e Vinicius de Moraes (“Marcha da quarta-feira de cinzas”), com seus melancólicos versos “Acabou nosso carnaval / Ninguém ouve cantar canções”. Na seqüência veio Opinião de Nara com mais Zé Kéti (“Acender as velas” e “Opinião”) e a chegada de João do Vale (“Sina de caboclo”). Todos freqüentadores do Zicartola. Em ambos os discos uma hábil mistura de bossa nova e samba, alegria e melancolia, e a opinião de Nara, através dos versos de Zé Kéti, era bem clara: “Podem me prender / Podem me bater / Podem até deixar-me sem comer / Que eu não mudo de opinião / Daqui do morro eu não saio não”.

Mas Opinião acabou indo mais longe e rachou de vez a turma da bossa nova. Em inúmeras entrevistas da época Nara renegou o gênero “alienado” e defendeu o “samba puro” e a “expressão do povo”. A réplica da turma, e de alguns setores da imprensa carioca, não tardou e a musa do protesto foi chamada de “ingrata” por cuspir no prato que lhe deu fama e “oportunista” por cantar as mazelas do povo brasileiro no conforto de seu apartamento com vista para o mar. Os irmãos Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle foram os mais diretos em “A resposta” (gravada em 1965 no disco O compositor e o cantor, de Marcos): “O samba pode ser feito de céu e de mar / O samba bom é aquele que o povo cantar / De fome basta a que o povo na vida já tem / Pra que lhe fazer cantar isso também? / (...) Falar de terra na areia do Arpoador / Quem pelo pobre na vida não faz um favor / Falar de morro morando na frente do mar / Não vai fazer ninguém melhorar”. Zé Kétti, Cartola & Cia. passavam ao largo desta discussão de comadres, afinal estavam sendo gravados, faziam shows e isso era dinheiro no bolso. Eles, que eram brancos, que se entendessem.

O cenário de repressão nas ruas deu um caráter de urgência para o show Opinião que reuniu, em um mesmo palco, a jovem branca bem nascida Nara Leão, o sambista negro Zé Kéti e o nordestino, também negro, João do Vale. Burguesia, operariado e campesinato, juntos. Uma utopia musical criada nas mesas do Zicartola por integrantes do recém-extinto CPC. Dirigido por Augusto Boal do Teatro de Arena, escrito por Vianinha e com produção musical de Carlos Lyra, o show estreou em 11 de dezembro de 1964 no pequeno Teatro Super Shopping Center, em Copacabana, e logo passou da condição de pequeno espetáculo para se transformar em evento político de amplas proporções. Ir ao Opinião significava ser contra a ditadura e a favor da democracia e da liberdade e não havia nada que os militares pudessem fazer contra o espetáculo, pois qualquer intervenção acarretaria um desgaste político que as Forças Armadas ainda não estavam prontas para bancar. Nara Leão não perdia tempo e em determinado momento do show afirmava delicadamente: “Não acho que porque vivo em Copacabana só posso cantar determinado estilo de música. Mas é mais ou menos isso, quero cantar toda música que ajude a gente a ser mais brasileiro. Que faça todo mundo querer ser mais livre. Que ensine a aceitar tudo, menos o que pode ser mudado”.

Os problemas da reforma agrária e das favelas, as desigualdades sociais e a defesa da cultura brasileira estavam representados em músicas como “Carcará”, “O favelado”, “Sina de caboclo”, “Marcha da quarta-feira de cinzas”, “Malvadeza Durão” e até “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, da trilha sonora do filme homônimo de Glauber Rocha. Porém, com pouco mais de um mês de apresentações, Nara Leão pediu licença por motivo de estafa e em fevereiro de 1965 uma cantora conhecida apenas no circuito universitário de Salvador ocupou seu lugar. Seu nome, Maria Bethânia. O registro do show em LP, no entanto, saiu logo no início de 1965 e não capturou a elogiada participação da cantora baiana.

“O Opinião tinha uma preocupação igualitária e passava um sentido de agregação muito bonito. Era o projeto de um país, um país que é nosso, não das Forças Armadas, nem dos advogados, nem do marceneiro ou do pedreiro”, explicou Elton Medeiros, que começava a ter suas composições gravadas, entre elas a nada política “Mascarada”, marcha feita em parceria com Zé Kéti. Após a saída , Nara voltou aos estúdios para gravar o LP O canto livre de Nara e registrar novas composições de Zé Kéti (“Malvadeza Durão” e “Nega Dina”) e João do Vale (“Carcará”), estouradas por causa do show-evento, além de “Samba da legalidade”, uma parceria inédita entre Carlos Lyra e Zé Kéti que foi, apesar de tantos encontros e boas vontades, a única concretização musical entre os compositores do morro e do asfalto.

Paralelamente ao Opinião, mas com ênfase no samba urbano e na cultura popular, aconteceu também o show Rosa de Ouro que reuniu uma cantora veterana (Araci Côrtes), uma iniciante com mais de sessenta anos (Clementina de Jesus) e um jovem grupo de compositores e instrumentistas liderado por Zé Kéti (Paulinho da Viola, Nelson Sargento, Elton Medeiros, Jair do Cavaquinho e Anescarzinho do Salgueiro), tudo sob a direção e produção de Hermínio Bello de Carvalho. Menos político e mais musical, o Rosa de Ouro ganhou registro em vinil no mesmo ano de 1965 e ainda teve uma segunda edição dois anos depois. O tal grupo de acompanhamento vivia nas mesas e noites do Zicartola e devido ao sucesso do show adotou oficialmente o nome de A Voz do Morro e lançou dois discos intitulados Roda de samba também em 1965. “Os shows Opinião e Rosa de Ouro são filhos legítimos do Zicartola e foram a concretização de um casamento entre a classe média e o morro”, atestou Sérgio Cabral. Tudo parecia correr às mil maravilhas, mesmo sob o manto de uma crescente repressão, mas o que era de vidro finalmente quebrou-se.

Apesar de viver lotado, o Zicartola fechou as portas em 1965 por dificuldades financeiras, afinal Cartola sabia muito de música e nada de números (e os clientes e amigos viviam pendurando as contas além de, ironicamente, o show Opinião ter garfado uma boa parte do público do bar). Chegou ao fim, após quase dois anos de existência, o mais importante ponto de encontro cultural entre a Zona Norte e a Zona Sul. Se a bossa nova continuava a fazer cada vez mais sucesso no exterior cristalizando-se enquanto fórmula, no Brasil passou a se misturar com outros ritmos e gêneros dando início ao que se convencionou chamar de MPB. O samba estava incluído nesse balaio, mas novamente deixou de ser o protagonista com a entrada de novos atores e atrizes.

Mesmo à margem, o samba conseguiu garantir seu nicho no mercado fonográfico após as experiências do Zicartola, do Opinião e do Rosa de Ouro. Produtores como Hermínio Bello de Carvalho e os paulistas Fernando Faro, J. C. Botezelli (Pelão) e Marcus Pereira conseguiram lançar, no final da década de 1960 e durante os anos 70, os primeiros LPs solo de Cartola, Nelson Cavaquinho, Clementina de Jesus e Elton Medeiros, entre outros. Paulinho da Viola saiu do grupo A Voz do Morro após o terceiro e último disco (Os sambistas, 1966), estreou ao lado do amigo e parceiro Elton Medeiros no LP Na madrugada (1966) e deu início a uma bem sucedida carreira solo unindo as pontas soltas do encontro do samba com a bossa nova, e ainda acrescentando sua formação de choro. O jovem estreante Chico Buarque também construiu sua carreira a partir deste encontro. Todos juntos ampliaram ainda mais a área de influência do samba dentro da música popular brasileira possibilitando que o gênero fosse misturado a outros nas décadas seguintes e surgissem provocações como as de Chico Science e sua Nação Zumbi. Afinal, não importa de que lado você samba, desde que sambe bem.

majestade, com certeza

essa veio do mano edson franco, que disse apenas: "do caralho!". aí fui ouvir/ver e me deparei com roberto carlos, jovem de tudo, cantando "coimbra" (raul ferrão e josé galhardo). o ano é 1966 e esse video veio do programa rtp memória, da emissora portuguesa rtp, que recuperou gravações históricas como essa do programa canção é espetáculo. suingue e timidez, é isso aí...


documentário é música

não sabia da existência do festival in-edit até chegar um e-mail da adriana lopes, amiga dos tempos da sociais-usp que há anos mora em barcelona. o in-edit é um festival internacional de documentários musicais que foi criado há seis anos em barcelona (espanha) e já se espalhou por santiago (chile), buenos aires (argentina) e puebla (méxico). a primeira edição do festival no brasil será realizada este ano entre 25 de junho e 05 de julho em são paulo, e entre 9 e 12 de julho no rio de janeiro. o objetivo é “promover o documentário sobre os diversos aspectos da música além de promover e difundir este gênero, oferecendo ao público a oportunidade de ver títulos difíceis de encontrar nos circuitos comerciais”. as inscrições para a edição brasileira podem ser feitas no site e o festival será dividido em mostra internacional (seleção de 30 documentários estrangeiros recentes), panorama nacional (10 documentários nacionais recentes) e mostra competitiva (5 documentários nacionais inéditos selecionados pelo comitê de seleção).

segunda-feira, 30 de março de 2009

tabelinha pra semana

o blog uma por dia tinha entrado recentemente na minha lista de favoritos quando recebi por e-mail, lá no gafieiras, um alô de seu dono, carlos cuenca. brasileiro temporariamente radicado na bela buenos aires, cuenca criou o blog no final de 2008 como um canto para "mostrar músicas pros amigos" em doses diárias. conceito parecido com a coluna 5prauma do gafieiras. então fiz o convite, ele disse sim e é isso. tão lá no gafieiras as indicações de carlos cuenca pra essa semana que começa e no uma por dia os respectivos downloads (entre outras coisas, sempre). boa semana.

domingo, 29 de março de 2009

domingueira

ouvi essa música pela primeira vez no começo desse ano, via matias. não sabia da existência do grupo alemão can, e só conhecia o termo krautrock por alto (aquelas coisas que o gui barrela ouve), mas quando ouvi essa "vitamin c"... porra! funkeada, sintética e, ao mesmo tempo, ligeiramente progressiva. baixei alguns discos da banda, mas dois se sobressaíram: tago mago (1971) e ege bamyasi (1972), que tem essa vitamina e ainda "i'm so green", "one more night" e "sing swan song". nessa horas a gente pensa, "porque não ouvi isso antes?".



e um maninho ainda fez um clipe sensacional da música em algum supermercado no canadá.

sexta-feira, 27 de março de 2009

mixtape #1 reggae

o reggae entrou na minha vida já tem uns dois anos. veio junto com o dub. acho que de uma hora pra outra comecei a ouvi-los em muitas músicas e nas entrevistas de um monte de gente (quase contemporâneos e também mais novos, muitos brasileiros, alguns gringos). era jamaica pra lá, kingston pra cá, e pensei, só pra citar um exemplo, “o nação zumbi não pode estar errado”. e fui ouvir.

logo descobri o you & me on a jamboree e passei a tomar repetidos tapas na cara – e nunca poderei agradecer o bastante aos caras que mantém o blog, principalmente ao greg, com quem conversei por e-mails para fazer uma matéria para o gafieiras. quanta coisa linda. quanta história. tanta gente. tanta música. minha cabeça deu um nó e, enquanto o nó se agravava, carolina passou a duvidar da minha sanidade e os amigos zombavam surpresos. e eu lá, embasbacado com a habilidade, o balanço e a alegria dos músicos/cantores(as) jamaicanos. outra periferia, mais áfrica.

do reggae conhecia, e detestava, apenas o que todos conhecem, principalmente bob marley. pra mim ele sempre foi (e ainda é) o renato russo do reggae, o raul seixas do reggae. o mártir, o poeta, o santo, e por aí vai. claro que todos são muito mais interessantes e geniais do que é urrado/louvado sobre eles, e isso é constante e humilde aprendizado, mas estou me perdendo e me complicando... porque só queria dizer que fiz uma mixtape, uma coletânea, um best of com algumas das músicas mais bonitas que ouvi nesses últimos anos, reggaes variados, de épocas variadas, homens e mulheres, instrumentais e cantados, mas muito pouquinho, é só um começo... bob marley entrou, claro, e essa, pelo menos, carolina ama.

baixem AQUI. comentem, se possível.

essa é a primeira mixtape do esforçado e outras virão, outros gêneros, outras paradinhas...

seguem as faixas (algumas destas datas são aproximações, afinal a indústria fonográfica jamaicana não era das mais rigorosas em termos de informações, principalmente na virada da década de 1960 para 70).


01 bob marley & the wailers - chances are (1960s)
02 dawn penn - no, no, no (1967)
03 ken boothe - everything i own (1974)
04 hortense ellis - wooden heart (1967)
05 johnny nash – cupid (1973)
06 susan cadogan – fever (1976)
07 jackie mittoo - drum song (1970)
08 freedom singers - come together (1969)
09 im & david - soul brother (1970)
10 barrington levy - englishman (1979)
11 augustus clarke - black foundation (1976)
12 horace andy - skylarking (1972)
13 johnny osbourne - truth and rights (1979)
14 george faith - i've got the groove (1976)
15 the drastics - bulletproof (2005)
16 lee perry - pussy man (2004)
17 sly dunbar - river niger (1980s)
18 the lions - sweet soul music (2008)
19 easy star all-stars & citizen cope - karma police (2006)
20 dj raiz (ministereopublico) - na baixa do sapateiro [bonus] (2009)

quinta-feira, 26 de março de 2009

mamma áfrica mia

não tem jeito, a áfrica é a mãe, o pai, os filhos, primos, tias e avós da melhor música que existe neste planeta. pode prestar atenção nas grandes nações musicais: brasil, estados unidos, jamaica e cuba. tudo é áfrica [pensei depois: claro que nessa tese ficaram de fora a genial tradição árabe e todas as variáveis da música cigana, que vão da índia até a espanha, passando pela explosiva música dos leste europeu; afinal, isso são outras histórias]. em tempos de p2p consegui ter acesso a um tanto bom de músicas novas e velhas do continente e... putz, é mundo grande demais que tem tanto fela kuti (e os filhos femi e seun) quanto el rego et ses commandos, e ainda amadou & mariam, tinariwen, sila & the afrofunk experience, k'naan, mulatu astatke, ignace de souza, king sunny adé, geraldo pino, todo o pessoal do kuduro de angola, etc. ah, e os blogs? dê um pulo e se perca em sítios como likembe, matsuli e awesome tapes from africa, além do blog/selo analog africa. aliás, foi por este que conheci muita coisa, principalmente do benin e de togo, países vizinhos da grande nigéria de fela kuti. um exemplo explosivo, diretamente retirado do disco african scream contest - raw & psychedelic afro sounds from benin & togo 70s (analog africa, 2008), é a orchestre poly-rythmo de cotonou.



baixei o african scream contest e chapei, claro. quando descobri que o o dono do selo é um tunisiano que mora na alemanha, e que ocasionalmente faz viagens de (boa) exploração musical por alguns países africanos, mandei um e-mail para um casal de amigos (daniela e davi), que passaram o ano de 2008 em berlim. a dani achou o disco, comprou e mandou. chorei. é um das coisas mais bonitas que tenho na minha cdteca (imagine, disco fodão mais libreto cheio de fotos e textos históricos e por um preço razoável, isso é coisa impossível de acontecer em terras brasilis). ah, dá pra comprar o disco na excelente loja virtual dusty groove.

quarta-feira, 25 de março de 2009

eles acreditam no semáforo

ok, acabou de acontecer o radiohead em são paulo e no rio, delírio geral, mas podem ter certeza que hoje à noite, mais precisamente no multishow (22h45), o vanguart apresentará um showzaço. acompanhei a gravação em dezembro de 2008 e fiz uma reportagem pra edição de março da monet. o especial, que também sai em cd e dvd, trouxe algumas inéditas, uma cover de dorival caymmi e as partipações de mallu magalhães, luiz carlini e arthur de faria. falei com este último pra matéria da monet, mas a conversa acabou não entrando na edição final (coloquei então a conversa no blog da monet e no gafieiras; versões ligeiramente diferentes conforme o veículo, claro).
então, som na caixa.


o quinteto em foto de marcos hermes

SOM DE GENTE GRANDE

Vanguart vem de vanguarda, mas também de um vídeo sobre o artista plástico Andy Warhol, o que na verdade dá no mesmo. Mas o Vanguart vem mesmo é de Cuiabá, Mato Grosso. Cinco sujeitos, um frontman decidido e, em comum, o rock, mais precisamente o folk rock. Pois então, este grupo é protagonista de uma boa história sobre novos tempos para a música nacional. Revelados por um intenso boca-a-boca na internet e sacramentados pelo sucesso no circuito de festivais independentes Brasil afora, e com apenas um disco cheio de canções em inglês no currículo, o quinteto passou por muita coisa até chegar a recente gravação do especial Multishow Registro – Vanguart. Hélio Flanders, garoto de fala fácil, bom humor e muitas canções pela cabeça, pode conta melhor.

“A gente já entrou no turbilhão quando veio para São Paulo em 2005. Mas até o final do ano passado tudo estava acontecendo em doses homeopáticas. Quer dizer, a gente ia gravar esse show de qualquer jeito, mas seria uma coisa de guerrilha, tanto por não ter condições financeiras, quanto por querer uma coisa mais louca.” Era uma quarta-feira qualquer de janeiro, três e pouco da tarde, e o show havia sido gravado pouco mais de um mês. “Em novembro recebemos o convite do Multishow e sabíamos que seria melhor ter uma ajuda nessa parte [o registro do show]
. A garçonete interrompe e Hélio, depois de pensar um pouco e ver a hora no relógio, solta: Olha, não vou beber cerveja não, vou de suco de pitanga.” O quinteto assinou contrato com a gravadora Universal e se enfurnou por quase 20 dias em estúdio para ensaios e outras milongas pantaneiras, incluindo aí a lapidação de algumas inéditas.

Alheio a modismos que fazem tanto o gosto de grandes gravadoras, o Vanguart ainda conseguiu o surpreendente feito de assumir a produção e direção musical do show, que será lançado em CD e DVD alguns dias após a exibição no Multishow. “A gente quis que o trabalho fosse feito do nosso jeito. Foi uma maneira de nos protegermos de qualquer problema. E não é que não queremos ouvir ninguém, ou que a gente toque pra c******, mas executamos nossa música de uma maneira que precisa ser ouvida com mais atenção. E isso fica mais evidente nesse show e a gente sabe isso melhor que ninguém. Dá pra perceber nuances que normalmente não se consegue ouvir numa casa noturna.”

O quinteto subiu ao palco do Avenida Club, em São Paulo, na úmida noite de 11 de dezembro e a platéia que o esperava era formada por fãs que estavam lá para jogar a favor. “A gente nunca foi inacessível com os fãs, e como não somos da moda, eles são para sempre. São fãs de guerrilha, de fazer boca a boca, de espalhar a banda. Mas acho que isso foi algo que a gente plantou, sabe? Respondemos e-mails, conversamos de igual para igual e recebemos no camarim numa boa. Antigamente você ligava numa rádio e tinha que ouvir o que estava tocando. Hoje na internet tem um milhão de coisas, então pra alguém ouvir a sua música é algo muito especial. Valorizo muito isso.” Ao fundo do palco, uma grande árvore estilizada e assinada pelo cenógrafo Zé Carratu aguardava entre luzes azuis o grupo, seus três convidados (Mallu Magalhães, Luiz Carlini e Arthur de Faria) e ainda um quarteto de cordas. “São pessoas sensacionais que não estão na grande mídia, com exceção da Mallu, e qualquer um que ouví-los vai perceber que são incríveis e deram um upgrade nas músicas.”

Totalmente à vontade no palco, Hélio Flanders brincou com a platéia (“Noite especial, minha gente, até fiz o cabelo! Mentira! Jamais!”) e comandou um show em alta rotagem, no qual alternou sucessos próprios como “Semáforo”, “Cachaça” e “He Yo Silver”, apenas um cover (“O Mar”, de Dorival Caymmi, em versão divertida e veloz) e quatro inéditas (“Entre Ele e Você” e “Promessas de Navegação”, entre elas). Cada vez mais cantando e compondo em português, Flanders assume as mudanças com naturalidade. “Mesmo que algumas pessoas possam achar que por causa disso estamos nos ‘dobrando ao mercado’ tenho absoluta certeza que qualquer compositor que faça músicas em inglês no Brasil se frustra cedo ou tarde. Senti a necessidade de criar canções que mexessem com as pessoas e que desse uma resposta imediata. Os compositores que mais admiro são aqueles que cutucam as pessoas - Lou Reed, John Lennon, Bob Dylan, Chico Buarque e Cartola, por exemplo - e de uma maneira bem modesta também queria fazer isso.”

Amparado pelos amigos Luiz Lazzaroto (teclados), David Dafré (guitarra, vocais), Reginaldo Lincoln (baixo, vocais) e Douglas Godoy (bateria), o decidido Flanders quer ampliar os horizontes do Vanguart e emplacar parcerias com outros músicos. “Um dia desses estava pensando assim: não é a gente que é bom, é o resto que é ruim. O rock brasileiro é muito tosco, em sua grande maioria. É tocado muito mal, gritado, não existe capricho no som. Mas aí, de uma hora pra outra, ouvi umas dez bandas muito boas. Aí pensei: f****!!! Vamos ter que sacudir, tocar muito bem, porque tem gente boa por aí. E o mais bacana é que nenhum deles vai parar de produzir porque não estourou.” Música também serve para isso, continuar vivendo.

sobre os convidados...

Mallu Magalhães
A sensação Mallu e Hélio Flanders namoraram por alguns poucos meses no ano passado e se tornaram bons amigos desde então (criaram um projeto paralelo chamado Overcoming Folk Trio). Ela canta e toca gaita em “The Last Time I Saw You”.

Luiz Carlini
Uma das lendas vivas da guitarra brasileira, Carlini é membro-fundador da Tutti-Frutti, banda que acompanhou Rita Lee entre os anos de 1973 e 78 (época dos discos Fruto Proibido e Babilônia). Tocou slide guitar na inédita “You Know Me So Well”.

Arthur de Faria
O gaúcho maluco e genial possui carreira sólida como instrumentista, compositor, arranjador e produtor, mas ainda é pouco conhecido para além dos Pampas. Toca acordeon em “Robert” e assina arranjos de cordas em três outras músicas.

duelo de titãs

"... a verdade é que aqui a gente fica grávido de gêmeos de adjetivos!"
amaury jr., sobre as belezas da casa de clodovil em ubatuba

"mas você tem uma xoxota velha trancada que não libera, heim, amaury!!!"
clodovil, aos risos, sobre um certo encabulamento de amaury jr.

e é tudo verdade.

terça-feira, 24 de março de 2009

caixa de entrada

essa veio do oga, que mandou: "melhor refrão do rap... rs". speed e tigrão, ponte musical entre niterói e são gonçalo, barbarizando a clássica "easy lover" de phil collins e philip bailey (não lembram? ah, olha só aqui). detalhe: speed é autor dos discos expresso (2001) e meu nome é velocidade (2008), parceiro de black alien e co-autor do hit "quem que caguetou?"; tigrão é integrante da dupla aliança 21, também formada por mahal (filho de luiz melodia), e que lançou o disco apocalipse (2007). aumente o volume!


segunda-feira, 23 de março de 2009

ary “dubhead” barroso

mais bahia. conheci lá no sombarato o coletivo ministereopúblico, um sistema de som baiano que acaba de disponibilizar gratuitamente algumas músicas em seu blog. reggae, dub, dancehall e, principalmente, ragga estão em um cardápio irregular, mas cheio de vontade (tem ainda "redoma" e "necessidade", boas demais). destaque para essa genial versão dub da clássica, e baianíssima, "na baixa do sapateiro" (feita pelo mineiro-carioca ary barroso e lançada originalmente em 1938 pela luso-carioca carmem miranda). escuta só.

ô betz

nunca entrevistei maria bethânia. é uma daquelas "coisas pra se fazer antes de morrer", principalmente se for pro gafieiras. então, quando estreou na tv o documentário música é perfume, do suiço georges gachot (janeiro de 2008), fiz uma matéria pra monet e como bethânia não me deu moral (não ela, claro, mas sua assessoria) pensei em falar com algumas cantoras e ver qual era a influência da grande dama em suas carreiras. as gentis (e talentosas) alzira e, rita maria e fabiana cozza me atenderam e o texto saiu assim. ah, lembrei de bethânia porque marcus preto escreveu ontem na folha sobre um blog que compartilha gravações ao vivo da cantora que nunca saíram em disco. é o maria bethânia re(verso). e esse post é dedicado às adoradoras de betz que conheço. minha amada carolina e as amigas daniela, adriana, gabriela, cris e ludmila (que fez aniversário ontem, parabéns). esqueci alguém?

PERFUME DE BETHÂNIA

Bendita entre as cantoras, Maria Bethânia vem conseguindo manter, há pouco mais de 40 anos, uma das carreiras mais originais, coerentes e comercialmente bem sucedidas da história da música popular brasileira. Protagonista do documentário Música é Perfume, uma das estréias do mês no Canal Brasil, a intérprete baiana é mostrada em toda sua paixão e meticulosidade, tanto em shows e ensaios quanto em sua intimidade, tudo sob o olhar atento do cineasta Georges Gachot. Especialista em música erudita, o suíço se encantou com a forte presença de palco de Bethânia em um show no célebre Festival de Montreux. Mas isso é coisa mais que sabida pelo público brasileiro e por inúmeras gerações de cantoras nacionais que a tomaram como referência (mesmo porque não existem “seguidoras de Maria Bethânia”).

Alzira E, Rita Maria e Fabiana Cozza, cantoras de trajetórias e gerações diferentes, já sentiram essa força estranha que tomou o gringo pelos olhos e ouvidos. Cada uma a sua maneira. Mato grossense radicada em São Paulo, Alzira E (E de Espíndola), 50 anos, tem sete discos no currículo e canções gravadas por figuras como Ney Matogrosso e Zélia Duncan, boa parte delas feita em parceria com Itamar Assumpção. “Conheci Bethânia no final dos anos 1960, cantando ‘Carcará’, e ela me passou uma força tão grande com aquela voz e aquele sotaque. Foi quando me interessei por toda uma cultura musical nordestina que até então era muito distante pra mim”. Desde então, as músicas cantadas por Bethânia entraram de vez no repertório da ouvinte e fã. “Ela no palco é tão intensa e real, mas do seu repertório o que mais me acompanhou foi do disco Drama – Anjo Exterminado (1972). Todas ali são muito especiais pra mim”. E ela tem algum defeito, algum ponto fraco? “Só se for o meu, quando escuto
Anjo Exterminado”, e dá uma risada.

Mais jovem e com apenas um disco lançado, Fora de Órbita (2005), a cantora e compositora Rita Maria, 33 anos, ouvia Bethânia em casa por influência dos pais. “Depois veio o programa Plunct Plact Zum, em 1984, com a canção
Brincar de Viver. Mas a primeira audição consciente foi por volta dos 15 anos quando descobri o vinil de Recital na Boite Barroco (1968)”. Pouco mais tarde, quando começou a cantar, a paulistana sentiu as diferenças. “Mesmo não tendo a voz grave ou buscando no meu gesto vocal toda a teatralidade que ela traz, usei isso, a força da interpretação do texto, como uma referência pessoal, inclusive na hora de compor. Vejo o trabalho dela ser construído com muita coerência, tudo o que ela canta vem com a assinatura da intérprete, traz uma marca, uma cara, e transita por muitos repertórios”.

Já Fabiana Cozza, 31 anos, uma das mais elogiadas intérpretes de samba da atualidade e com dois discos na bagagem (o mais recente, Quando o Céu Clarear, acabou de ser lançado) declarou que “ouço Bethânia desde muito pequena. As primeiras canções de que tenho recordação são
Explode Coração e Sangrando, ambas do Gonzaguinha”. Hoje em dia, Cozza se espelha em Bethânia nessa busca da intérprete. “Ela fez uma escolha pelo caminho da intérprete, o que amplia a visão da arte dela e nos presenteia com essa grandeza. Costumo dizer que você pode ser uma ótima cantora ou uma intérprete do canto, um ótimo ator ou um intérprete do teatro. Bethânia é essa voz que pode se desdobrar no que quiser sobre o tablado porque tem o palco como espaço do sagrado”. Palavras delas ao som da Abelha Rainha.

e agora, uma pequena entrevista que fiz por e-mail com o diretor georges gachot.

MONET - Quais foram suas primeiras impressões ao ouvir Maria Bethânia? E o que te levou a decidir fazer um filme sobre ela?
GEORGES GACHOT - A primeira vez que ouvi Maria Bethânia foi em Montreux. Acho que em 1996. Foi também meu primeiro contato com a música brasileira. Nesta noite descobri uma fantástica artista que sabe como dividir sentimentos musicais com seu público. Fiquei impressionado por sua musicalidade pura, pela escolha de repertório e pelo modo como passa de uma música para outra. O poder de sua voz pode ser comparado com a força de um planeta! Desde 1989, o sentido da minha vida é transpor sentimentos musicais para a tela. Por causa disso estou permanentemente em busca deste poder musical e de artistas que o carreguem. Não quis produzir uma biografia e sim fazer com que o poder de sua voz fosse visualmente acessível.

Quais foram as maiores surpresas que você teve ao pesquisar e, posteriormente, falar com e sobre ela?
A maior surpresa que tive veio em forma de música. Ainda estou sob o encanto de canções como
Motriz (Caetano Veloso), Luar do Sertão (Catulo da Paixão Cearense e João Pernambuco) e Negue (Adelino Moreira e Enzo de Almeida Passos). Bethânia também me fez descobrir Chico Buarque. Nossa visita a Santo Amaro da Purificação e o encontro com Dona Canô e Caetano Veloso nos deram um panorama maior de como encarar a arte de Bethânia. Também fiquei muito impressionado com suas convicções, concentração, profissionalismo e o jeito como constrói sua arte no trabalho diário. Por causa dela acabei fazendo de um dos versos da música Samba da Benção (Baden Powell e Vinicius de Moraes) - “É melhor ser alegre que ser triste” – a filosofia que tento seguir dia após dia.

Como está caminhando este seu novo documentário sobre a Nana Caymmi?
Bethânia me fez entrar no mundo da música brasileira e assim descobri Nana Caymmi. Queremos apresentar um lado de Nana Caymmi que o público brasileiro não conhece e ao mesmo tempo com um apelo diferente para o público internacional. Esperamos finalizar o documentário até o fim de 2009.

sexta-feira, 20 de março de 2009

do piano de rolo ao mp3

o pedro alexandre entrevistou o produtor pena schmidt sobre o compartilhamento de música na internet, o negócio da indústria, etc. imperdível. separei esse trecho.

pena schmidt - não sabem [a indústria fonográfica] fazer de outra maneira, e querem que o mundo todo pare para eles, para eles continuarem sem descer do mundo. não estão tendo capacidade a se adaptar a um novo meio de comunicação. estamos falando de uma indústria que sempre lidou com essa ambiguidade. a indústria, sempre, desde o seu princípio, deu para poder vender. no tempo que a música ainda era no piano de rolo, chiquinha gonzaga e zequinha de abreu eram demonstradores de loja. ficavam tocando piano para chamar atenção das pessoas. as primeiras vitrolas ficavam na calçada tocando música. quando começam a rádio nacional e as gravadoras, já era exatamente isso: toca no rádio para vender o disco, e de lá até 1990 e... quando mesmo fechou a última rádio de música [risos]? ainda tem uma ou outra, né? enfim, o caminho normal seria am, fm, mp3. os três significam a mesma coisa, veículos para divulgar. a indústria se recusou a entender a internet como isso. dá até para entender no primeiro momento, mas se recusou a se adaptar, pô, durante já 15 anos, dez no mínimo.

who watches the watchmen?

opa, opa & opa. vi lá no nassif que o gilmar mendes, o juiz menos ajuizado do brasil, solicitou censura às reexibições do programa comitê de imprensa (tv câmara) com os jornalistas leandro fortes (carta capital) e jailton de carvalho (o globo). assunto? "grampo do protógenes: como a mídia deve proceder nas escutas ilegais". discussão boa, franca, objetiva, nada partidária. felizmente já caiu na internet. seguem aqui parte 1, parte 2 e parte 3.

mais uma vez, sem provar nada, a veja saiu disparando para os lados de sempre (e desviando atenção dos assuntos-dantas de sempre). mais uma vez, o autoritário e falastrão gilmar mendes seguiu atrás (ele que, recentemente, no acre tentou intimidar o jornalista altino machado que o indagou, "ministro, o senhor tem se manifestado constantemente em defesa da propriedade, contra as invasões, mas em nenhum momento o senhor se manifestou contra dezenas, centenas de assassinatos de lideranças de trabalhadores rurais. isso decorre do fato de o senhor ser ministro ou pecuarista?").

leandro fortes publicou uma carta aberta aos jornalistas do brasil.

e o pau comendo no salgado!

o programa sem meias palavras já é um medalhão entre os clássicos brasileiros do youtube, mas fazia um tempo que não lembrava dele. hoje, coincidentemente, vi uma matéria nova sobre uma lésbica maconheira que foi presa sob a acusação de mandar um boa noite cinderela em um sujeito (olha aqui). aí rolou aquele momento flashback. transmitido pela tv jornal (sbt) lá de caruaru, pernambuco, o programa já mostrou ao mundo figuras como jeremias, o velho que comeu uma prostituta e não pagou, o leonaldo, e tantos(as) outros(as). mas ninguém bate (em) lucivânia, a valentona.

duas fotos

catedral, fortaleza, ceará

sobral, ceará

quinta-feira, 19 de março de 2009

o aldemir dos gatos

falando em cearense internacional acabei lembrando do aldemir martins (1922-2006). encontrei com o homem uma vez e da minha visita ao seu ateliê saiu esse texto que foi publicado na tam magazine de agosto de 2005. figura interessante e tão familiar com sua cara de índio cearense, e tão lúcido que lendo o texto hoje tenho a impressão que tirei menos do encontro que poderia. mas de qualquer forma teve um momento ótimo que foi o ritual do artista tirar uma falsificação de seu trabalho do mercado.

olha o aldemir aí

UM ARTISTA SEM VERGONHA

Ele desce do carro e segue a pé rumo ao ateliê que conserva há 25 anos no bairro de Sumaré, São Paulo. Passos curtos, cautelosos e decididos. Logo abre o portão e desaparece sob as muitas plantas de uma casa moderna, feita em concreto armado, assinada pelo arquiteto Carlos Lemos. Um dos mais importantes e conhecidos pintores brasileiros está feliz da vida. Prestes a completar 83 anos, o cearense Aldemir Martins ganha sua primeira retrospectiva que o flagra desde a juventude em 1945 até o presente ano de 2005. Intitulada Sete décadas de sucessos artísticos, a exposição segue no MASP até 28 de agosto e resume tão longa e premiada carreira em 192 obras (136 pinturas e 56 gravuras em papel).

“É uma loucura ver o quanto já trabalhei”, diverte-se Aldemir ao relembrar de um passeio recente pelos corredores do MASP durante a montagem da exposição. Agora, para botar essa loucura de pé, nas paredes, foi preciso o jornalista, médico e colecionador Benemar Guimarães dar início, há três anos, a uma pesquisa profunda sobre toda sua obra. O trabalho contou com a ajuda dos filhos do artista, Mariana e Pedro Martins, e Umberto Mateus, arquiteto e assistente administrativo de Aldemir. Tal pesquisa também se transformou no luxuoso livro Aldemir Martins por Aldemir Martins (BestPoint Editora), lançado simultaneamente à exposição, que traz pouco mais de 400 ilustrações, reportagens e depoimentos do artista e de seus familiares, além de um prefácio assinado por Emanoel Araújo.

MAS ANTES – Filho de um funcionário público ligado a rede ferroviária com uma índia bugre, Aldemir Martins é do dia 8 de novembro de 1922, do distrito de Ingazeiras, município de Aurora. Ceará. Um Ceará quase Paraíba. Começou a pintar quando prestou o Colégio Militar, já em Fortaleza, e tornou-se ‘cabo-pintor’ para aumentar o soldo. Após voltar à vida civil, e largar de mão dos tanques e caminhões que criava/reproduzia, Aldemir aprendeu mais sobre técnica com mestres pintores acadêmicos como Raimundo Cela (1890-1954). Mas não demorou muito para sentir os primeiros sopros de liberdade artística com o amigo Mário Barata (1915-1983). Incentivado pelo crítico de arte paulistano Paulo Emílio Salles Gomes, que o conheceu em Fortaleza, o cearense decidiu sair de sua terra e tentou o Rio de Janeiro, mas mudou o rumo para São Paulo, aonde chegou em 1946. “Fui um dos primeiros paus-de-arara a chegar aqui, mas não senti medo, porque nem fazia idéia do que era São Paulo”, relembra e logo completa “que o que mais me interessou em São Paulo foi o respeito, porque aqui as pessoas sabiam que eu era artista plástico e eu também sabia. Sempre houve respeito. Fora o fato de que casei aqui, tive meus filhos e fiz toda minha vida nessa cidade”.

E no que o Ceará contribui para a obra de Aldemir Martins? “O Ceará me deu tudo. Tudo o que fiz até hoje é para pagar o que o Ceará me deu e que ainda dá. Minha terra continua me alimentando com vontade de trabalhar, capacidade de fazer coisas bonitas e muito carinho pelo povo”, e o peito octogenário enche ao dizer isso.

DURANTE – A conversa é interrompida por dois donos de galeria que chegam ao ateliê com uma tela falsificada comprada em um leilão de artes no Rio de Janeiro. É o retrato de uma mulher. Quando encontram telas sem certificado, os donos de galeria mais responsáveis as levam para um especialista; é a prova dos nove, digamos assim. Aldemir sorri quando a vê. “Acho divertido ver falsificações do meu trabalho. Você vê que a pessoa tenta imitar e não consegue, e muitas das vezes nem se deu ao trabalho de estudar minha obra. Olha, nunca usei esse tipo de pincel, muito menos esse cor-de-rosa, e a tela que uso é feita artesanalmente”, explica pausadamente enquanto mergulha em um curioso ritual para tirar a tela falsa do mercado.

Tudo começa com a tela sendo fotografada. Depois é danificada pelo próprio Aldemir com um X pintado na frente e atrás para depois o assistente escrever ‘tela falsa’. Aldemir assina. Nova foto. Só então é feito um documento atestando a falsidade da obra que será levado à delegacia para abrir um boletim de ocorrência. Pronto, entrevista segue.

E DEPOIS - Aldemir não demorou a se integrar ao mundo artístico da metrópole e ganhou prêmios importantes nas três primeiras Bienais no início da década de 1950. Tipos nordestinos como cangaceiros e rendeiras pulavam de suas telas, ágeis e modernos, e logo alcançaram fama mundial depois da premiação como Melhor Desenhista Internacional na Bienal de Veneza em 1956. Viajou muito a partir daí. Esteve, e morou, na França, Inglaterra, China, Japão e Estados Unidos, entre outros países. Mas nenhum desses países deu motivos para suas pinturas: “Não sei fazer outra coisa que não seja Brasil”.

Mas mesmo com tantos prêmios e reconhecimento mundial, Aldemir Martins acabou se tornando popular por causa de um felino. Até os mais leigos em artes plásticos conhecem os gatos de Aldemir. A história de como tudo começou é, mais ou menos, a seguinte: “Foi uma encomenda de uma amiga, uma senhora alemã que morava no Rio de Janeiro. Ela queria um companheiro e me pediu para desenhar um gato. Faço gatos até hoje por causa dela e também porque o gato é um ser feminino, tem aqueles movimentos de se torcer e enroscar. Gosto dessa feminilidade do gato. Mas nesses anos todos acho que eles não mudaram nada... quer dizer, só engordaram”, e dá uma risada.

Os gatos o fizeram popular, mas é outro tema, também cheio de movimento, que atrai o artista desde a infância: o futebol. Corintiano devoto, Aldemir retratou Pelé, Rivelino e muitas e diversas jogadas. “É estranho. Aqui no Brasil as pessoas acham que o futebol é coisa de pobre. As pessoas têm vergonha de ser índio. Eu nunca tive vergonha de nada na minha vida e continuo interessado em tudo”, afirma categoricamente. Pausa. Aldemir abre seu livro em uma página qualquer e se perde em pensamentos. Na página, dois galos brigam, espalhando sangue.

p.s.: aqui embaixo uma entrevista que achei no youtube. a entrevistadora... sei não... mas é bom ouvir o aldemir, de qualquer jeito.

chamado da terrinha

acabei de conhecer lá no matias um blog que entrou diretamente na lista dos favoritos aí do lado.
é o cearenses internacionais.
onde mais saberia que tenho conterrâneos tão ilustres como franz kafka, quentin tarantino, mahmoud ahmadinejad, tom wolfe e donatella versace?

p.s.: e o bruno descobriu que é do mesmo autor do wagner & beethoven, o mauro. genial. e conseguiu entrevistar o sujeito aqui.

time dos sonhos

uuuuuuuhhhh.
public enemy + the roots + antibalas lá no late night do jimmy fallon.
pesquei do original pinheiros style.

update na vida

vi santiago do joão moreira salles. foda.



p.s. de alguns dias depois: de uns tempos pra cá venho achando bobo (pra não me alongar nesses assunto agora) fazer "crítica de cinema", ou "crítica de música", ou "crítica" de qualquer coisa. mas porque falei sobre os outros documentários e só tasquei um "foda" para santiago? um tanto pelo documentário ser muito, muito superior aos outros, e pela consequente enorme variedade de assuntos/camadas possíveis de reflexão. o tempo, a consciência, a memória, a criação e a tal luta de classes (lembram dela?), tem tudo isso no filme. tem mais. vou maturar ali e já volto...

quarta-feira, 18 de março de 2009

daniela mercury por tom zé

música novinha, fresquinha. homenagem divertida e sem cerimônias, bem ao jeito do baiano. (ou)vi lá no blog dele. a letra tá aqui, com algumas correções, mas só dá pra ouvir lá.

daniela ferrari (tom zé)

é mercury, muito bem,
e sendo mercury até que já tá bem.

porque quem tem 500 velas como ela
e na passarela aquele charme que chamusca
podia ser até um fusca.

é mercury, muito bem,
e sendo mercury até que já tá bem.

mas poderia ser toyota ou citroen
puma, honda até uma mercedes benz
na verdade ela tem um jeitinho de jaguar
mitsubishi, ferrari
rolls royce ia bem, pontiac, bugatti
oldsmobile... maserati
e para eternizar
uma motorizada conclusão
a doce daniela, até montada numa sela
vai passar de avião.

pois cantora que não roda meu acorde
vai acabar de romisetta, dkv, simca chambord
e se não levanta
a bandeira do tom zé
ela não vai dar
nem no banco de trás
de um chevrolet.

para ler e refletir...

a veja. isso mesmo, a veja. em um projeto ambicioso e totalmente livre, a revista disponibilizou na rede todas suas edições. são 40 anos de uma das revistas mais influentes da história do país. vale pra ler matérias históricas escritas em plena ditadura (ditabranda?) e vale ainda mais para entender como a atual direção da revista destruiu, aniquilou e/ou enlameou, em pouco mais de dez anos, toda a invejável reputação do semanário. vai lá no acervo digital. mas esqueça o passado recente. é melhor.

para ouvir...

o freestyle, amiguinhos e amiguinhas. criado por marcílio gabriel em abril de 2007, o freestyle é um excelente programa de rádio na internet totalmente dedicado ao hip hop alternativo. já passaram por lá dj kl jay & edi rock (racionais mc's), relatos da invasão, elo da corrente, mzuri sana, kamau, mamelo sound system, paulo napoli e contra fluxo, entre outros. a mais nova edição trouxe os chapas do projeto manada, sempre naquelas de bate-papo com boas indicações musicais. o marcílio, aliás, deu seus pitacos na coluna 5prauma do gafieiras.

para entender...

ontem foi lançado na internet um livro que pode e dever ser espalhado por aí. organizado por juliano spyer, do não zero, para entender a internet - noções, práticas e desafios da comunicação em rede reúne 38 autores que tratam de diversas facetas, usos e desafios da internet nos dias de hoje (estão presentes figuras como alexandre matias, soninha francine, sérgio amadeu, edney souza, cris dias, rodrigo savazoni e ronaldo lemos). é trabalho coletivo aberto a interferências via licença creative commons e com versão em pdf disponível gratuitamente aqui. ah, o projeto tem um blog próprio.

spyer, aliás, explica assim a proposta do livro: "muitas pessoas ainda sentem que a tal revolução trazida pela web é uma festa para a qual eles não foram convidados. muitos professores de escolas públicas e privadas, empreendedores, executivos, comunicadores, administradores públicos e uma boa parte da sociedade civil não entendem o motivo de tanta euforia em relação à internet. esse livro pretende ser um convite para que elas entrem e participem da festa".

terça-feira, 17 de março de 2009

e agora, joão?

nessa linha it's all true segue uma matéria que fiz pra monet de novembro de 2008. já tinha trocado alguns e-mails com joão moreira salles por causa da segunda reportagem que fiz pra piauí (a do cemitério de animais), então foi fácil chegar nele. o difícil foi marcar uma entrevista. por telefone, sem chance (também não queria). aí ele me disse que vinha pra são paulo participar de uma palestra na puc sobre os dois anos da revista. mesmo assim não ia dar tempo pr'uma entrevista nos conformes e o jeito foi acompanhar a palestra, mandar uma pergunta durante e ouvir/observar bastante. saiu o texto abaixo. agradecimento aos chapas da cia. de foto pelo retrato de joão. 


O QUE FAZ JOÃO FILMAR?

A mesa parece muito pequena ali no meio do palco, mesmo com a presença de garrafas d’água, copos, microfones e pingüins de geladeira. Pingüins? A simpática ave ganhou uma boina à la Che Guevara e virou símbolo da piauí, revista que momentaneamente tirou João Moreira Salles do circuito de documentários para lhe jogar no mercado editorial. Extremamente tímido em qualquer meio, o carioca de 26 anos precisará domar algumas vergonhas para ser o protagonista de uma noite no qual falará para alunos da PUC paulistana sobre os dois anos da revista, realidade e cinema, muito cinema. Mas ainda falta uma hora para o bate-papo começar. Calma.


Diretor de Entreatos (2004), uma das estréias do mês no Canal Brasil ao lado de Peões (2004) do ídolo e mestre Eduardo Coutinho, João Moreira Salles tem o mesmo nome do avô paterno e é seis anos mais novo que o irmão Walter Salles Jr. (Linha de Passe). Começou a trabalhar com documentários ao lado do irmão, no final da década de 1980, na extinta TV Manchete, mas só ficou mais conhecido em 1998 ao dirigir, em parceria com Arthur Fontes, a série Futebol, sobre a dura saga de garotos em busca do sonho boleiro. Coincidentemente, no mesmo ano que o irmão estourou mundialmente com Central do Brasil. Daí para frente, João Moreira foi mergulhando mais fundo na realidade brasileira e produzindo documentários, sempre documentários. Fundou, também com o irmão, a produtora Videofilmes.


Antes do bate-papo começar, o cineasta e um professor da universidade decidem arrastar a mesa um pouco para frente, mais próxima da platéia. Parece tudo certo agora e assim começa. “Sou um documentarista. Sempre tratei da não-ficção, do mundo - a ficção, na minha família, é outro quem faz [risos] -, e o que aprendi em dez, doze anos de trabalho com isso é que documentário não é necessariamente o tema. É mais como você fala, o jeito que você conta”. Um ano depois de Futebol, João Moreira reuniu-se com Kátia Lund e fizeram o explosivo Notícias de uma Guerra Particular, média-metragem sobre a escalada da violência urbana no Rio de Janeiro. Foi neste vídeo que surgiu Rodrigo Pimentel, então oficial do BOPE. Após duras críticas à política de combate ao tráfico, Pimentel saiu da instituição (mais tarde foi um dos roteiristas de Tropa de Elite). João Moreira também acabou saindo machucado dessa história ao ser acusado de favorecer o traficante Marcinho VP, patrão no Dona Marta, morro da Zona Sul carioca onde foi filmado Notícias.


“O que me faz filmar é o fato de acordar de manhã e ter que exercer uma profissão. Não existe uma grande missão. Ah, preciso filmar porque sou um artista... não sou um artista! Filmo porque foi a profissão que escolhi. Não tem nada de épico ou glorioso nisso. Pelo menos nunca teve pra mim. O que nós fazemos como documentaristas é dar forma ao mundo e organizar as informações para que façam sentido. Aí você joga sobre a realidade o manto da narrativa. (...) Claro que existem temas que me interessam, mas o mais importante é contar uma história de um jeito que ninguém contou”. Com este ímpeto saiu da violência dos morros cariocas para as salas de concerto européias ao filmar Nelson Freire (2003), seu primeiro longa feito para cinema.


Mas antes de lançar o filme sobre o famoso pianista clássico, João Moreira havia registrado, em outubro de 2002, a reta final da campanha presidencial de Luis Inácio Lula da Silva. O cineasta levou quase dois anos para reduzir as 220 horas captadas para uma duração factível. “Tempo é algo essencial. Tempo penetra no DNA do filme, ou da reportagem, e o transforma em outra coisa. É preciso de tempo para pensar, refletir e estabelecer as conexões”. Com o tempo ao seu lado também driblou possíveis usos políticos, afinal Entreatos poderia tanto ser usado pelo Governo quanto pela oposição. “Goste-se ou não do Lula, o fato dele se eleger em 2002, ou de ter tido a chance de se eleger, é um fato único na história do Brasil. Nunca ninguém com sua origem social e política teve uma chance real de se eleger Presidente da República. Aquilo era um fato único e para o documentário o que é único sempre interessa”.


Outro fato único foi a opção de não filmar nenhum ato público. Apenas os bastidores, ou “momentos fracos”, como classificou o próprio cineasta. “São aqueles momentos vividos relaxadamente. Momentos de espera, elevador, quarto de hotel ou traslado. Se perguntassem ao Lula, ali durante a campanha, quais foram os acontecimentos marcantes do dia anterior ele jamais lembraria esses momentos porque só existiram para preencher o espaço entre um e outro momento forte da campanha. Não teve importância nenhuma. Mas isso se torna importante no filme porque foi organizado para ser assim”. E os silêncios, olhares e papinhos acabam sendo mais reveladores que a euforia de 200 mil pessoas em um comício.


Em 2006, João Moreira, ávido leitor, deu uma tacada ousada ao lançar a piauí porque queria ler uma revista que não existia. As estimativas iniciais de pessoas ligadas ao mercado editorial chutavam de 5 a 12 mil leitores para uma revista com grandes reportagens, humor ferino e posição ideológica indefinida. Dois anos depois os números variam de 30 a 35 mil e o sucesso da empreitada fez o cineasta optar por se afastar das câmeras. Mas não da ilha de edição (lançou o íntimo Santiago em 2007) e nem da produção (Jogo de Cena, de Eduardo Coutinho, no mesmo ano). “Escrevi na piauí um texto sobre o Fernando Henrique Cardoso, fiz um documentário sobre o Lula e o procedimento foi rigorosamente o mesmo. A única coisa que mudou foram os instrumentos. Hoje estou na revista, mas amanhã posso voltar a fazer documentários, e mesmo assim não mudo de profissão porque continuo no campo da não-ficção”. E a não-ficção, na forma do apresentador do evento, irrompeu com o anúncio do fim da conversa. Realidade é assim. Quando menos se espera...

segunda-feira, 16 de março de 2009

sim, é tudo verdade

depois do maradona by kusturica entrei, mais uma vez, numas de documentário. não sei se existe isso de "morte da ficção", mas que pessoalmente tenho me interessado cada vez mais por não-ficção (também conhecida como realidade), isso é certo. tanto no cinema quanto na literatura. seguem abaixo 4 filmes que baixei (e vi) recentemente nos torrents da vida.

this film is not yet rated (2006), de kirby dick
- o melhor da leva. político, bem humorado, ousado e rápido no raciocínio. uma investigação sobre os mistérios, absurdos e ilegalidades do sistema de classificação para filmes nos "democráticos" estados unidos. tudo patrocinado pelo falecido e nada saudoso jack valenti e pela mpaa (motion picture association of america). o diretor kirby dick chega a contratar uma detetive particular para descobrir quem são as pessoas, cujas identidades são inexplicavelmente mantidas em sigilo pela mpaa, que... enfim, censuram os filmes nos eua em parceria com os grandes estúdios/corporações. o lance é tão profissionalmente mafioso que faz a censura brasileira dos tempos militares (ditabranda?) parecer coisa de coroinha. segue o trailer.



helvetica (2007), de gary hustwit - dirigido por uma das revelações do gênero este documentário trata exclusivamente da história, dos usos, da influência e das críticas sobre a invisível e onipresente fonte helvetica (criada no final da década de 1950). repleto de ótimas imagens da helvetica espalhada pelo mundo, nas mais diferentes funções, e de boas entrevistas com famosos tipógrafos e designers gráficos, inclusive com o inglês matthew carter que criou esta fonte que você lê agora (verdana), o filme não teme criticar seu próprio assunto, o que é bom para todos. aqui, o site oficial e abaixo, o trailer.



dear zachary: a letter to a son about his father (2008), de kurt kuenne - um chute na boca do estômago, ou na ponta do coração. documentarista e compositor, kuenne fica sabendo da morte de um de seus melhores amigos (adrian bagby), do outro lado dos eua, e começa a produzir um filme para homenageá-lo. nos seis anos que demorou para ser terminado, o filme sofreu radicais mudanças de rumo, principalmente quando se descobriu que a assassina de adrian, uma ex-namorada mais velha, estava grávida. os pais da vítima se mudam para o canadá pra lutar pela custódia da criança e para acelerar o processo de extradição, mas a inacreditável demora/irresponsabilidade da justiça canadense faz a vida de todos sofrer uma nova virada em um filme assumidamente emocional (impossível não sê-lo). aqui, o site oficial e abaixo, o trailer.



moog (2004), de hans fjellestad - nada de indignações ou choros compulsivos neste documentário. trabalho tranquilo sobre o robert moog, o criado do famoso sintetizador moog.
um tantão técnico, um tantinho filosófico (moog é um engenheiro boa praça que andou com muitos músicos malucões), o filme é ótimo passatempo, fica ali no raso, e foi produzido por gary hustwit (helvetica). participações de money mark, keith emerson, rick wakeman, etc.



se quiser saber mais sobre novidades no gênero, uma boa pedida é ir lá no bruno, que já fez documentários sobre chico buarque, maria bethânia e jota quest (além do pouco visto, aqui no brasil, dub echoes).

domingo, 15 de março de 2009

atualizando gafieiras

escrevi lá sobre o genial disco novo de maria alcina, confete e serpentina (outros discos), costurando com verônica ferriani (soul sity records), gostosa estréia da cantora de ribeirão preto.

tem também nova coluna 5prauma, desta vez com dicas do jornalista e fotógrafo otávio valle.

domingueira

então vamos dar aquela levantada no astral porque o sujeito solitário do post abaixo deu uma pesada. ô desgraceira. então, ouvindo recentemente uns remixes e mashups feitos pelo joão brasil lembrei da sua nova onda: misturar lambada e tamborzão com rock'n'roll (e outras coisas). uma das primeiras que ele fez foi pegar "left behind" do cansei de ser sexy e misturar com duas pedradas do kaoma, "dançando lambada" e "chorando se foi". pra melhorar ele também remixa o clipe. requebra, lovefoxxx!



e aqui, a versão original da música no genial clipe da renata abbade. "left behind" é música de donkey (trama, 2008), segundo disco do cansei (ou css, para os gringos). tenho certeza que foi um disco meio ignorado no brasil. dor de cotovelo, claro. escrevi no gafieiras um texto sobre o disco em julho do ano passado.

sábado, 14 de março de 2009

que solidão que nada



taí um homem sincero.
vi lá no matias e acabei conhecendo o dukaramba.
boa noite.

diálogo de dois

casa cláudia - quando são paulo lembra paris?
stéphane malysse (antropólogo usp) - quando saio do cinema reserva cultural, passo na fnac e tomo um café com brownie parece que estou mais perto de jeanne moreau.

hã?

quinta-feira, 12 de março de 2009

frase da noite

"errou? põe shoyu! continuo errado? joga queijo ralado"
olavo schmidt jr., o biah, em pleno fechamento

calado, cão, no chão

loucura total aqui na monet. fechamento da edição de abril com uma matéria de capa que tá dando um trabalho danado, mas tá ficando massa (os 50 melhores filmes do século 21, até agora - escolhidos por um júri composto por 250 personalidades daqui e da gringa). enquanto isso, mais pra dar um oi, dois clipes geniais de um artista idem: romulo froés. o paulistano está pra lançar seu terceiro disco, no chão sem o chão (previsto para abril pela yb discos), e tem outros dois no currículo, calado (bizarre music, 2004) e cão (yb discos, 2006), de onde saíram as músicas "suíte" e "sobre a gente", respectivamente.