sábado, 29 de outubro de 2011

yahoo #17

tenho uma queda por concurso de miss, quem me conhece sabe. quer dizer, eu e carolina. não consigo imaginar assistir um concursos desses sem a companhia dela, rindo junto, comentando junto. na boa, se a bandeirantes quisesse realmente divertir o espectador precisava nos contratar. seríamos a versão gonzo do casal william bonner e fátima bernardes. esse texto para o yahoo foi sobre outros dois concursos, um de bumbum que ainda está rolando e outro de travestis que aconteceu no início do mês. coisas impagáveis e profundamente brasileiras. no mais, lá no ultrapop tem texto novo: "classe econômica, ida e volta", sobre viagens e o que a gente pode aprender nelas.

ess'aqui sou eu, te juro!

MISS DE TUDO UM POUCO

Quando em maio de 2009 escrevi, meio que de brincadeira, um texto sobre a transmissão do Miss Brasil não imaginaria que dois anos depois o Brasil seria, pela primeira vez na história, o palco do Miss Universo. A coisa toda virou assunto quente nas redes sociais, e não só aqui, já que os venezuelanos ficaram tão fulos da vida com a derrota de sua candidata (a bela angolana saiu vitoriosa) que xingaram muito no twitter dizendo que foram roubados. O tal glamour de eras passadas não voltou e nem voltará, mas como tudo é negócio e os negócios não podem parar, e ainda precisam se diversificar, os concursos de beleza estão de novo “na moda”.

O problema é quando a grana maquia demais o absurdo e a divertida cafonice da competição. Como é produzido nos Estados Unidos, o Miss Universo já está devidamente domado. Não existe espaço para o mico acontecer. E o Miss Brasil está indo pelo mesmo caminho. Nessas é a diversão que sai perdendo.

Sorte dos bem humorados(as) que outros concursos de miss ainda mantém aquela aura de loucura, tanto que dois viraram notícias recentemente exatamente por acontecimentos sem pé nem cabeça. No Miss Bumbum, a candidata do Maranhão fez questão de provar com uma radiografia que seus glúteos não possuem nenhum tipo de prótese (o que a desclassificaria). Já na terceira edição do Miss Gay de Bom Jesus, cidade do Rio Grande do Norte, a final que aconteceu agora em 8 de outubro viu tabefes, artes marciais e uma espetacular virada de mesa.




“Vamos ser finas, gente!”, grita uma travesti descabelada após todo o sururu. É que Jamily, que logo no início do vídeo recebe contrariada a notícia que pegou o terceiro lugar, e uma amiga concorrente colocaram a derrota na conta da drag-inimiga Pietra Ferrari, que estava lá para entregar o grande prêmio (talvez também fosse jurada). A bagunça em cima do palco acabou forçando a organização a escolher o primeiro lugar através do voto (grito) popular. E quem ganhou foi a briguenta! Quer dizer, caos total.

Outro tanto de caos permeava o e-mail da assessoria de imprensa do Miss Bumbum. Senão vejamos: “Depois de ter sido acusada por outras participantes do concurso Miss Bumbum Brasil de ter prótese no glúteo, a candidata pelo estado do Maranhão, Gracielle Carvalho, apresentou uma foto de uma radiografia que comprova não ter implantes. (...) ‘Vou esfregar o resultado na cara de quem me acusou. Meu bumbum é resultado de muita malhação, dieta, disciplina e dedicação! Querem me destruir. Silicone, só nos seios: coloquei 520 ml em cada um’, revela”.

Em anexo, fotos de Gracielle (que na verdade é paulista) empinando orgulhosa seu atributos naturais ao lado de um raio X muito mais revelador do que ela pretendia. E todo esse quiprocó para ganhar suados 5 mil reais lá em dezembro (a votação é pela internet no site oficial).

Bumbuns nacionais ou travestis no Rio Grande do Norte, não importa, tudo isso é muito de verdade e a graça está nesse jeito meio mambembe, e absurdamente autoconfiante, de querer ser a mais bonita. Eventos assim sempre me fazem lembrar de “Miss Suéter”, um dos muitos clássicos da parceria de João Bosco e Aldir Blanc: “Eu conheço uma assim / Uma dessas mulheres / Que um homem não esquece / Ex-atriz de TV / Hoje é escriturária do INPS / E que, dia atrás / Venceu lá no concurso de Miss Suéter”. Toda mulher, e todo travesti, tem o direito de ser miss qualquer coisa.


laerte da semana #31

esse pessoal do fundo... laerte é um deles, certeza


terça-feira, 25 de outubro de 2011

jamaica entre nós

tenho uma história com o bid, não vou negar. um dos dois textos que fiz pra folha de s. paulo foi sobre bambas & biritas vol. 1 (mcd, 2005), tirei uma fotos da turma e uma delas foi publicada no jornal por ocasião do show de lançamento e, por acaso, acabei escrevendo um release do mesmo. então foi com muita curiosidade que acompanhei as primeiras notícias sobre bambas dois (soul city/natura/universal, 2011) há uns dois anos atrás. mais curioso fiquei ao saber, e isso já foi nesse ano, que no lugar do samba e do soul entrariam o reggae e o forró (e o disco que bid produziu para chico césar em 2008, o ótimo francisco, forró y frevo, tem papel fundamental nessa história).



e lá no canal do bamba dois no youtube tem mais uma porrada de videos sobre as gravações na jamaica. mas olha, sem mais delongas, ouça o disco e tire suas próprias conclusões.

BAMBAS DOIS by Bambas2

é claro que bambas dois tem muito mais que reggae e forró. tem dub, maracatu, ragga, xote e um frescor de misturas muito intensas e quase todas inéditas (e o disco tem apenas uma regravação, "something", de george harrison). é disco de produtor atento, aberto, cheio de camadas e sutilezas. agora, pelo seu caráter fragmentário e cheio de convidados, bambas dois correrá o mesmo risco de bambas & biritas: será extremamente difícil divulgá-lo em shows. mas isso é outra história. o lance agora é curtir.



ah, e essa faixa que ganhou o primeiro clipe, "only jah love", recebeu um tratamento dubstep em remix assinado por felipe wrechiski. peguei lá do site oficial do disco e coloquei aqui pro serviço ficar completo.

BiD (Bambas Dois) - ONLY JAH LOVE (Felipe Wrechiski Dub Mix) by dafnesampaio4


uma pena que o blogger limite a quantidade de tags, mas faço questão de colocar aqui um pouco mais desse timaço de músicos reunidos no disco: the heptones, jah marcus, kymani marley, oku onuora, ernest ranglin, luciano, i wayne, queen ifrica, joey altruda, daniel ganjaman, dengue, lúcio maia, zé pitoco, marcelo cabral, bi ribeiro, gilmar bolla 8, marlon sette, tiquinho, adriano magoo, as negresko sis (céu, thalma de freitas e anelis), bruno buarque, james muller e felipe pinaud.

p.s.: poxa, esqueci de mencionar gilberto gil, o pioneiro nesse cruzamento nordeste/jamaica desde os anos 1970 e que sintetizou muito bem todos esses sons no disco kaya n'gan daya (warner, 2002).

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

é de graça, meu rei!

cada vez mais comum ver artistas brasileiros, muito independentes sim senhor, disponibilizando seus novos trabalhos para download gratuito. aproveitei a deixa de três novidades - os igualmente excelentes discos de wado (samba 808), karina buhr (longe de onde) e junio barreto (setembro) - para fazer uma lista com 15 discos nacionais lançados dessa forma no decorrer do ano. tem mais coisa, claro, mas essa selecta dá uma boa ideia da alta qualidade e diversidade do que temos ouvido por aqui.

1. wado (samba 808)

2. karina buhr (longe de onde)

3. junio barreto (setembro)

4. camarones orquestra guitarrística (espionagem industrial)

5. rafael castro (rc canta rc)

6. lirinha (lira)



9. china (moto contínuo)

10. bonifrate (um futuro inteiro)


12. rael da rima (música popular do 3º mundo)

13. nuda (amarénenhuma)

14. romulo fróes (um labirinto em cada pé)

15. academia da berlinda (olindance)

sábado, 15 de outubro de 2011

yahoo #16

lá no novo ultrapop já tem texto novo, é o "miss de tudo um pouco", que trata de concursos de beleza um tanto mambembes e seus bafos ultramarinos. e aqui segue o anterior, "ajoelhou tem que dançar", que fiz durante as férias (talvez por isso tenha sido o menor dos textos que já fiz pra coluna). a turma maluca dos comentários até me deu um descanso, muita gente gostou do video da pastora ana lúcia, mas não deixei de ser acusado de fazer "críticas" aos evangélicos (não sei onde viram isso, paciência). só fiz uma pequena correção na versão do texto aqui para o esforçado: pela informação na página do youtube achei que a igreja fosse em madureira (zona norte carioca), mas na verdade é na estrada de madureira que fica em nova iguaçu (baixada fluminense). no mais, agradecimentos ao trabalho sujo de alexandre matias que postou esse video e me salvou no último momento (iria escrever sobre a claudia leitte no rock in rio e foi ótimo não tê-lo feito porque o pedro alexandre sanches mandou muito bem no seu "claudia leitte e os arianos").


AJOELHOU TEM QUE DANÇAR

Música e religião sempre andaram juntas, rostinho colado, desde que o mundo é mundo. Para entrar em transe, elevar o espírito, entrar em contato com algo supremo ou passar uma mensagem, de amor ou fé. Não sou um estudioso do assunto, mas acredito que em todas as religiões criadas pela humanidade a música seja um dos componentes mais importantes e presentes.

Estava eu de férias batendo perna pelo Velho Mundo, mais precisamente Viena, quando entro na Igreja de São Pedro (1733) e me deparo com uma combinação rebuscada de arquitetura barroca e um dos órgãos mais antigos da cidade soltando melodias de Johann Sebastian Bach pelos quatro ventos. Coisa mais linda do mundo, podem pensar alguns, mas eu particularmente não me emociono com música clássica e por isso acabo achando a atmosfera um tanto opressora, intimidante.

De volta ao hotel, poucas horas depois, entro na internet para checar emails e começar a escrever essa coluna e me deparo com um vídeo que consegue, em pouco mais de 8 minutos, fazer com que cantos gregorianos pareçam ranger de portas. Com vocês, Ana Lúcia, pastora e cantora de alguma pequena igreja evangélica na baixada fluminense.



Nunca entendi o temor a Deus em suas diversas manifestações: o peso da culpa judaico-cristã, a sisudez muçulmana e a caretice evangélica, por exemplo. E não é por ser ateu (ai Jesus, polêmica à vista?) que acho isso e sim porque acredito que a espiritualidade deveria ser uma declaração de amor à vida. E amor é alegria, compreensão, respeito, suor e calor.

Foi uma surpresa e tanto – e uma ótima surpresa – ver essa igreja evangélica pegando fogo ao som de um samba reggae acelerado cuja intensidade e os batuques são profundamente devedores ao candomblé. E o pessoal girando e girando como elevados dervixes turcos. Sem falar em Ana Lúcia, uma mistura rascante de Tim Maia e Mr. Catra. Quer dizer, é o famoso samba do crente doido e pra mim isso tudo faz muito sentido.

Gosto desse Deus que dança e gosto ainda mais que ele seja negro e brasileiro.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

vermelho é a cor

ano interessantíssimo esse 2011 com revoltas democráticas pelo mundo árabe, o quebra-quebra de londres e agora essa ocupação em várias cidades dos estados unidos (mais informações no site oficial do occupy wall street), sem falar nas nossas marchas da maconha, da liberdade e tantas outras ocupações de espaços públicos (esse é o segredo, essa é a chave). na segunda, dia 10 de outubro, o filósofo esloveno slavoj zizek esteve na liberty plaza, em nova york, condensou algumas de suas mais conhecidas teorias recentes e disparou um discurso muito bom sobre o presente, o futuro e o estado das coisas. a tradução abaixo é de rogério bettoni, feita para o blog da boitempo editorial. também é possível ver o homem em ação no meio da galera em inúmeros videos espalhados pelo youtube (por exemplo nessa trilogia aqui parte 1, parte 2 e parte 3).


A TINTA VERMELHA
por Slavoj Zizek


Não se apaixonem por si mesmos, nem pelo momento agradável que estamos tendo aqui. Carnavais custam muito pouco – o verdadeiro teste de seu valor é o que permanece no dia seguinte, ou a maneira como nossa vida normal e cotidiana será modificada. Apaixone-se pelo trabalho duro e paciente – somos o início, não o fim. Nossa mensagem básica é: o tabu já foi rompido, não vivemos no melhor mundo possível, temos a permissão e a obrigação de pensar em alternativas. Há um longo caminho pela frente, e em pouco tempo teremos de enfrentar questões realmente difíceis – questões não sobre aquilo que não queremos, mas sobre aquilo que QUEREMOS. Qual organização social pode substituir o capitalismo vigente? De quais tipos de líderes nós precisamos? As alternativas do século XX obviamente não servem.

Então não culpe o povo e suas atitudes: o problema não é a corrupção ou a ganância, mas o sistema que nos incita a sermos corruptos. A solução não é o lema “Main Street, not Wall Street”, mas sim mudar o sistema em que a Main Street não funciona sem o Wall Street. Tenham cuidado não só com os inimigos, mas também com falsos amigos que fingem nos apoiar e já fazem de tudo para diluir nosso protesto. Da mesma maneira que compramos café sem cafeína, cerveja sem álcool e sorvete sem gordura, eles tentarão transformar isto aqui em um protesto moral inofensivo. Mas a razão de estarmos reunidos é o fato de já termos tido o bastante de um mundo onde reciclar latas de Coca-Cola, dar alguns dólares para a caridade ou comprar um cappuccino da Starbucks que tem 1% da renda revertida para problemas do Terceiro Mundo é o suficiente para nos fazer sentir bem. Depois de terceirizar o trabalho, depois de terceirizar a tortura, depois que as agências matrimoniais começaram a terceirizar até nossos encontros, é que percebemos que, há muito tempo, também permitimos que nossos engajamentos políticos sejam terceirizados – mas agora nós os queremos de volta.


Dirão que somos “não americanos”. Mas quando fundamentalistas conservadores nos disserem que os Estados Unidos são uma nação cristã, lembrem-se do que é o Cristianismo: o Espírito Santo, a comunidade livre e igualitária de fiéis unidos pelo amor. Nós, aqui, somos o Espírito Santo, enquanto em Wall Street eles são pagãos que adoram falsos ídolos.


Dirão que somos violentos, que nossa linguagem é violenta, referindo-se à ocupação e assim por diante. Sim, somos violentos, mas somente no mesmo sentido em que Mahatma Gandhi foi violento. Somos violentos porque queremos dar um basta no modo como as coisas andam – mas o que significa essa violência puramente simbólica quando comparada à violência necessária para sustentar o funcionamento constante do sistema capitalista global?


Seremos chamados de perdedores – mas os verdadeiros perdedores não estariam lá em Wall Street, os que se safaram com a ajuda de centenas de bilhões do nosso dinheiro? Vocês são chamados de socialistas, mas nos Estados Unidos já existe o socialismo para os ricos. Eles dirão que vocês não respeitam a propriedade privada, mas as especulações de Wall Street que levaram à queda de 2008 foram mais responsáveis pela extinção de propriedades privadas obtidas a duras penas do que se estivéssemos destruindo-as agora, dia e noite – pense nas centenas de casas hipotecadas…


Nós não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que merecidamente entrou em colapso em 1990 – e lembrem-se de que os comunistas que ainda detêm o poder atualmente governam o mais implacável dos capitalismos (na China). O sucesso do capitalismo chinês liderado pelo comunismo é um sinal abominável de que o casamento entre o capitalismo e a democracia está próximo do divórcio. Nós somos comunistas em um sentido apenas: nós nos importamos com os bens comuns – os da natureza, do conhecimento – que estão ameaçados pelo sistema.


Eles dirão que vocês estão sonhando, mas os verdadeiros sonhadores são os que pensam que as coisas podem continuar sendo o que são por um tempo indefinido, assim como ocorre com as mudanças cosméticas. Nós não estamos sonhando; nós acordamos de um sonho que está se transformando em pesadelo. Não estamos destruindo nada; somos apenas testemunhas de como o sistema está gradualmente destruindo a si próprio. Todos nós conhecemos a cena clássica dos desenhos animados: o gato chega à beira do precipício e continua caminhando, ignorando o fato de que não há chão sob suas patas; ele só começa a cair quando olha para baixo e vê o abismo. O que estamos fazendo é simplesmente levar os que estão no poder a olhar para baixo…


Então, a mudança é realmente possível? Hoje, o possível e o impossível são dispostos de maneira estranha. Nos domínios da liberdade pessoal e da tecnologia científica, o impossível está se tornando cada vez mais possível (ou pelo menos é o que nos dizem): “nada é impossível”, podemos ter sexo em suas mais perversas variações; arquivos inteiros de músicas, filmes e seriados de TV estão disponíveis para download; a viagem espacial está à venda para quem tiver dinheiro; podemos melhorar nossas habilidades físicas e psíquicas por meio de intervenções no genoma, e até mesmo realizar o sonho tecnognóstico de atingir a imortalidade transformando nossa identidade em um programa de computador. Por outro lado, no domínio das relações econômicas e sociais, somos bombardeados o tempo todo por um discurso do “você não pode” se envolver em atos políticos coletivos (que necessariamente terminam no terror totalitário), ou aderir ao antigo Estado de bem-estar social (ele nos transforma em não competitivos e leva à crise econômica), ou se isolar do mercado global etc. Quando medidas de austeridade são impostas, dizem-nos repetidas vezes que se trata apenas do que tem de ser feito. Quem sabe não chegou a hora de inverter as coordenadas do que é possível e impossível? Quem sabe não podemos ter mais solidariedade e assistência médica, já que não somos imortais?


Em meados de abril de 2011, a mídia revelou que o governo chinês havia proibido a exibição, em cinemas e na TV, de filmes que falassem de viagens no tempo e histórias paralelas, argumentando que elas trazem frivolidade para questões históricas sérias – até mesmo a fuga fictícia para uma realidade alternativa é considerada perigosa demais. Nós, do mundo Ocidental liberal, não precisamos de uma proibição tão explícita: a ideologia exerce poder material suficiente para evitar que narrativas históricas alternativas sejam interpretadas com o mínimo de seriedade. Para nós é fácil imaginar o fim do mundo – vide os inúmeros filmes apocalípticos –, mas não o fim do capitalismo.

Em uma velha piada da antiga República Democrática Alemã, um trabalhador alemão consegue um emprego na Sibéria; sabendo que todas as suas correspondências serão lidas pelos censores, ele diz para os amigos: “Vamos combinar um código: se vocês receberem uma carta minha escrita com tinta azul, ela é verdadeira; se a tinta for vermelha, é falsa”. Depois de um mês, os amigos receberam a primeira carta, escrita em azul: “Tudo é uma maravilha por aqui: os estoques estão cheios, a comida é abundante, os apartamentos são amplos e aquecidos, os cinemas exibem filmes ocidentais, há mulheres lindas prontas para um romance – a única coisa que não temos é tinta vermelha.” E essa situação, não é a mesma que vivemos até hoje? Temos toda a liberdade que desejamos – a única coisa que falta é a “tinta vermelha”: nós nos “sentimos livres” porque somos desprovidos da linguagem para articular nossa falta de liberdade. O que a falta de tinta vermelha significa é que, hoje, todos os principais termos que usamos para designar o conflito atual – “guerra ao terror”, “democracia e liberdade”, “direitos humanos” etc. etc. – são termos FALSOS que mistificam nossa percepção da situação em vez de permitir que pensemos nela. Você, que está aqui presente, está dando a todos nós tinta vermelha.
dica para trilha sonora: "put some red on it", música nova de spoek mathambo em versão remixada pelo shabazz palaces.
Spoek Mathambo - Put Some Red On It (Shabazz Palaces Remix) by Voler

5 dias em kinshasa

e lá se foi damon albarn mais uma vez para a áfrica. após produzir o disco mali music (2002), algumas faixas para tony allen (o célebre baterista de fela kuti) e outras para o disco welcome to mali (2008), de amadou & mariam, o inglês chamou um grupo de amigos (dan the automator, richard russell, etc.) e todos partiram para kinshasa, capital do congo. em cinco dias gravaram com um pancada de músicos locais, jovens e velhos, e o resultado é o espetacular kinshasa one two (warp music, 2011). já é possível comprar sua versão digital, mas o disco e o vinil só saem no início de novembro. álbum cheio de camadas para ser ouvido e descoberto muitas e muitas vezes, kinshasa one two é encontro rico entre gerações e culturas. escute aí as primeiras faixas do disco.

DRC Music - Kinshasa One Two (see http://drcmusic.org ) by DRC Music

segue abaixo o trailer promocional do disco.



e aqui abaixo um pequeno flagra de um diálogo exclusivamente musical entre damon albarn e jupiter okwess (nenhum fala a língua do outro). impagável a cara de damon quando jupiter erra uma nota.



opa! e já tem o video, com imagens da gravação mesmo, de "hallo", faixa que abre o disco com a presença da cantora nelly liyemge e do grupo tout puissant mukalo.

domingo, 9 de outubro de 2011

domingueira nederhop

na eurotrip da vez foi em amsterdam - de novo, porque ano passado foi lá que descobri stromae - que conheci música nova. e rap, mais uma vez. foi em uma das poucas vezes na viagem que liguei a tv e de repente aparecem uns maninhos locais andando por um parque (imagino que seja o vondelpark), moças bonitas aparecendo sensuais e um quê de violão brasileiro sampleado. depois descobri que o que foi sampleado pelo quarteto flinke namen (algo como "grandes nomes") foi "y dejá", música cubana numa versão latino-brasileira por willie collón e ruben bladés no disco canciones del solar de los aburridos (fania, 1981).

mas enfim, o flow em holandês funciona (nunca tinha ouvido rap nessa língua, também conhecido como "nederhop"), "als zij langs loopt" é uma baita música boa (e é de 2009), só que a turma formada por sef, fit, murth e o dj the flexican não deixa o video ser incorporada em blogues (ouça/veja aqui). azar! porquê nessas acabei achando outros artistas da cena rapper batava. saca só.



porra, o lourinho faberyayo manda muito bem, essa "uniform" é foda e abre uma mixtape que fez em parceria com o produtor vic crézee lançada ano passado. het grote gedoe, aliás, está para download gratuito desde então. ok. vamos então a um segundo exemplo do rap dos canais, e igualmente com batidas mais rápidas e contemporâneas que as do flinke namen.



são dois caras os que rimam, certo? o primeiro é o jayh e o segundo é adje. o produtor é o reverse. e essa sonzera de batida forte se chama "fock wachten" (também é de 2010). pois é, um outro mundo a se descobrir (e o pessoal produz e disponibiliza mixtapes gratuitamente com bastante rapidez). simbora.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

um aventureiro à serviço de sua majestade

devo confessar que nunca havia assistido um programa inteiro da série-reality à prova de tudo até algumas horas antes de entrevistar o apresentador & aventureiro bear grylls, ao vivo e em londres, a convite do discovery channel. é certamente um dos canais que mais assisto, mas não sou muito desse segmento de aventuras (detestava aquele australiano dos crocodilos que morreu). mas daí que assisti dois episódios da sexta temporada que estreia este mês no brasil e foi divertido. assistirei outros? provavelmente não. só que isso não importa porque a viagem a londres, a coletiva e os rápidos 5 minutos que estive cara a cara com o simpático bear grylls (mais sobre ele na wikipédia) serviram para esta reportagem publicada na revista monet desse mês. e gostei do resultado.


SOBREVIVENDO A SI PRÓPRIO
Fomos ao encontro de Bear Grylls para saber o que passa pela cabeça do sujeito que se mete em tantas roubadas por conta própria em À Prova de Tudo. A resposta? Voltar para casa

Final de junho, início do verão no hemisfério norte, e Londres estava em festa com a presença do sol: famílias estendendo toalhas no Green Park para fazer um lanchinho em plena terça-feira, casais se abraçando nos bancos ao longo do Rio Tâmisa, jovens executivos indo trabalhar de bicicleta e sem camisa, uma alegria só.

Se alguém cruzasse com Bear Grylls nesse dia, e por acaso não conhecesse seu trabalho na série
À Prova de Tudo, jamais imaginaria que seu cotidiano é muito diferente dos seus conterrâneos. A pele bronzeada, o bom humor e o aspecto saudável poderiam sugerir férias tranquilas no Caribe, mas o aventureiro e apresentador de TV tinha acabado de voltar a sua terra natal após sofrer o pão que o diabo amassou em algum lugar desértico no estado americano do Utah.

Bem, essa é a sua vida, os fãs esperam mesmo que ele sofra um bocado e Grylls está acostumado com essa demanda, tanto que seu programa já está na sexta temporada. Mas nenhuma de suas habilidades de sobrevivência o deixa confortável quando é hora de falar sobre si e sobre seu trabalho para um bando de jornalistas de vários lugares do mundo. E esse encontro é apenas o primeiro compromisso de um dia agitado socialmente. Após a coletiva, Grylls almoçará e depois receberá cada um dos profissionais da imprensa em uma suíte de um hotel bacana a poucos quarteirões de Piccadilly Circus, região central de Londres, e então correrá até uma livraria para uma sessão de autógrafos de seu mais recente livro,
Mud, Sweat and Tears [Lama, Suor e Lágrimas]. Para encerrar o dia, Grylls e sua equipe receberão convidados para a pré-estreia dessa nova temporada. Tudo muito diferente de seu cotidiano de aventuras entre as densas florestas de Bornéu ou ao lado do ator Jake Gyllenhaal nas montanhas vulcânicas da Islândia.

grylls durante a coletiva

“A grande dificuldade do programa é achar as locações. Pedimos ajuda dos fãs, mas existe sempre uma batalha entre os produtores, que desejam que eu vá para os piores lugares, e eu, que prefiro mais sossego. Procuramos achar um meio termo”, afirmou entre goles de água durante a coletiva. Além das citadas Islândia, Utah e Bornéu, essa nova temporada o levou a lugares como Nova Zelândia, Noruega, Escócia, Indonésia e Arizona. Mais alguns pontos e aprendizados vindos diretamente do mapa-múndi deste homem casado, 37 anos, pai de três filhos (Marmaduke, Jesse e Huckleberry), em tudo normal.

Bem, quase tudo. Eterno desafiador de si mesmo, Grylls virou celebridade na Inglaterra após narrar em livro a sua escalada ao Everest com meros 23 anos, apenas 1 ano e meio após ter sofrido um acidente de pára-quedas que quase o matou. De lá para cá outras aventuras foram encaradas, bem como livros e convites para entrar no mundo da televisão, no entanto foi só a série
À Prova de Tudo que acabou, meio que instintivamente, se tornando a melhor tradução de seu espírito.

Enquanto isso, cinco horas antes da sessão de autógrafos ter início, uma fila começa a se formar na entrada de uma livraria na Piccadilly Street. Fãs de todas as idades, munidos de cadeirinhas e sombrinhas, disputam espaço com funcionários da prefeitura, tapumes, grades e desvios. É que Londres está vivendo em permanente tumulto devido às obras para as Olimpíadas de 2012. Mas alheio a tudo isso, Grylls fala do prazer que sente ao fazer cada episódio (“É como se eu estivesse fazendo um filme caseiro e a dinâmica se manteve a mesma durante essas seis temporadas”) e de quanto admira sua pequena equipe de amigos, principalmente o cinegrafista Simon Reay (“Ele faz tudo que eu faço só que com uma câmera pesada no ombro”).

Lembra como dava trabalho para sua mãe com sua curiosidade, tanto que a primeira enrascada que lembra de ter se metido foi aos 7 anos quando ficou preso em areia movediça numa praia. E falou da força e tranquilidade de sua mulher (Shara), do quanto adorou quando um de seus filhos disse que queria ser contador, de como é difícil fazer seguro em seu nome, das inúmeras vezes que recusou entrar para TV e do seu lado chorão (“assisti um dia desses no avião aquele filme
Diário de uma Paixão [filme de 2004 dirigido por Nick Cassavetes e estrelado por Ryan Gosling e Rachel MacAdams] e chorei tanto que a aeromoça veio perguntar se eu estava bem”). Então a coletiva chega ao fim. Tempo de comer algo e checar o cronograma das individuais. E lá em frente a livraria, a fila de fãs só aumentando.

fila de fãs na livraria waterstones perto do piccadilly circus

CARA A CARA COM O PERIGO – Um grande sofá de couro em formato de meia lua domina o centro da suíte reservada para as entrevistas e Bear Grylls, o homem mais destemido a serviço de Sua Majestade, levanta-se calmamente para receber o jornalista da vez. Não é a primeira e nem será a última.

“Sinto-me lisonjeado das pessoas assistirem ao
À Prova de Tudo com essa vontade de viver aventuras através dele. Já fiz isso também com outras atrações, mas o meu foco é gravar o programa e voltar para casa”, disse à MONET o inglês que desde que se casou em 2000 vive em um barco holandês com mais de 100 anos próximo a Battersea Bridge. “Acho que fazer um programa técnico de sobrevivência seria muito chato. Porque se você está numa situação dessas é preciso se manter seguro, não correr riscos e esperar o resgate. O que a gente quis simular é uma situação de autoresgate e existe uma espontaneidade nisso que faz com que eu me mantenha interessado em fazer o programa.”

mr. grylls cercado por escoteiros

O tempo ruge, a engrenagem gira e uma equipe de TV mexicana já está a postos. A fila lá fora não para de crescer e ainda tem a pré-estreia, os convidados, o discurso, o coquetel, os escoteiros querendo tirar fotos, os tapinhas nas costas. Então, de repente, estar perdido com um grupo de amigos e um canivete no meio de uma selva tropical não parece uma idéia tão assustadora assim.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

e com vocês, a bjork do brega!

e por falar em mulher brasileira em ação... já nem sei mais se foi no twitter ou no facebook que ouvi essa divertida definição dada a gaby amarantos, mas "bjork do brega" é sensacional. e ainda combina com "xirley", o primeiro clipe da primeira música de seu vindouro (e muy ansiado pela casa) disco de estreia solo. a música, aliás, é uma versão sacudida e ainda mais bem humorada de "xirley" do pernambucano zé cafofinho. a original foi dica de valtinho (@valtersil) no corjacast #8.



e se a gaby é bjork do brega, a priscilla brasil, diretora desse clipaço, é o seu michel gondry curtido no açaí. tudo muito bem feito, roteiro ótimo e direção cheia de sacadas, sem falar na ironia malandra de seu fim. parabéns a todos os envolvidos.

p.s.: não por nada, mas gaby foi uma das protagonistas do show no dia de posse da dilma.

orgulho é pouco

só agora, após fincar bem os dois pés em gotham city, consegui assistir a íntegra do excelente discurso que dilma roussef mandou na abertura da 66ª assembléia-geral da onu, em nova york, no dia 21 de setembro passado. firmeza, clareza, críticas ao atual estado das coisas, importantes tomadas de posição, tem de tudo no discurso.

yahoo #15

não imaginaria que "meu fraco é subcelebridade" fosse ter a repercussão que teve e se tornasse a mais lida dos meus textos até agora no yahoo (e um dos mais do próprio site, categoria colunas, claro). segundo michel blanco foram mais de 350 mil cliques, muitos cliques. pena que um erro de avaliação meu tirasse o foco do texto para muitos leitores. quando coloquei ronaldo fenômeno numa lista imaginária pensei em um nome de alguém que gostasse, mas que na atual circunstância (fora dos gramados de futebol, no caso) poderia ser tratado como uma mulher melão qualquer pelos grandes portais e revistas de fofoca. só que como não expliquei esse meu raciocínio as pessoas ficaram chocadas com esse rótulo de subcelebridade dado a ele ("por mim") e sairam me xingando de subjornalista pra baixo. devia ter colocado minha primeira opção, o eri johnson. ou não.

no mais, o ultrapop agora virou blog no yahoo e desde já contará com os meus textos dividindo espaço com os colegas dudu tsuda e pedro alexandre sanches. já no ar, e no novo endereço, "ajoelhou tem que dançar".


MEU FRACO É SUBCELEBRIDADE


Não consigo me conter. Basta olhar uma chamada com as palavras Nana Gouvêa & praia ou ex-ídolo em reabilitação ou ainda algo relacionado a qualquer ex-BBB que vou lá e me jogo. Já nem sinto mais culpa. Mas é claro que vou arrumando jeitos de explicar esse, digamos assim, desvio. Dou uma maquiada, enfeito com um monte de palavras. No fundo sei que é papo furado.

Mas é que às vezes sinto que subcelebridade é como aquele tio que você achava engraçadão na infância e quando o reencontra enquanto adulto sente um pouco de pena. Lá está ele repetindo a mesma piada há décadas. E ele sabe que a piada não funciona mais. E continua mesmo assim. Só que junto com a pena vem também um carinho, um respeito por aquela figura que te divertiu no passado. Pode substituir o tio por uma tia/prima bonitona ou qualquer outra combinação familiar possível. Subcelebridade pra mim é isso.

Mas Nana Gouvêa e Nicole Bahls não são minhas primas. Ronaldo Fenômeno não é meu tio. Priscila e Fani não estavam na mesma classe que eu no ensino fundamental. Na verdade, esses e inúmeros outros exemplos são meras engrenagens de uma máquina voraz e enigmática que produz notícias sobre nada. E o mais curioso é que subcelebridades não pagam nada para estar, diariamente, em todos os principais portais de notícias da internet brasileira. Elas estão lá por uma conspiração cósmica que une certo jornalismo de resultados (cada pageview, um flash) a um bando de gente com sede eterna para fofocas.


O que algumas dessas pessoas que buscam fama a qualquer custo não percebem – e isso vale também para famosos autodestrutivos como Amy Winehouse – é que grande parte de quem as consome gostaria mesmo de vê-las na pior, cada vez na pior. Até mortas, talvez.

Afinal, tem muito de crueldade em se alimentar esperanças de fama em corações despreparados. Mais cruel ainda é quando essas pessoas alcançam certa popularidade, porque quando ela acaba – e ela sempre acaba rápido – a diversão aumenta exponencialmente. Acompanhar um ex-BBB em sua maratona de humilhações e tiros n’água é um jeito moderno e menos sangrento de jogar escravos aos leões. À salvo do outro lado da telinha do computador, o “fã” vibra e clama por sangue. Eu não faço parte dessa torcida e quando acompanho o mundo de fofocas é na esperança de ver comportamentos surreais, cenas nonsense, bagunça, qualquer coisa que me faça rir ou que gere coisas sensacionais como o blog Ego Estagiário.

A humanidade é uma coisa complexa e fascinante e se existem pessoas que desejam a morte das outras em caixas de comentários também é verdade que nos deparamos com outras que fazem strip-tease ao som de Kátia Cega ou fazem jornalismo denúncia sobre drogas usando batata baroa no lugar de crack (caso do impagável professor Germano Borges, da tranquila e capixaba Guarapari). Ou ainda como Roberto Leal que fingiu tão bem que estava sob efeito de LSD no programa português Último a Sair que muita gente acreditou. Exatamente como um tio que mesmo após ter se curado do alcoolismo continuava fingindo estar bêbado nas festas familiares. Era assim que todos o conheciam e, curiosamente, o amavam.