domingo, 31 de julho de 2011

domingueira

e pouco mais de um ano depois, a nipo-sueca yukimi nagano do little dragon volta ao esforçado. mas dessa vez como convidada em uma das faixas do disco de estreia do sbtrkt (ou substract), projeto do dj e produtor aaron jerome (inglês, acho). o disco é interessante, numas de dubstep e eletrônicos, mas essa "wildfire" está muito acima do resto.



conheci via só pedrada. detalhe: o selo young turks que lançou o disco é o mesmo de el guincho e the xx.

me identifiquei. pode?

"(...) homem esforçado que escolhera uma das poucas profissões abertas a mascaradores mentais, tornando-se jornalista e assim obtendo licença para driblar sua timidez, entregar-se a sua curiosidade insaciável e explorar a vida de indivíduos que considerava mais interessantes que ele próprio".

gay talese numas de autorretrato no espetacular a mulher do próximo (1981, retirado da página 458 da edição brasileira lançada pela cia. das letras em 2002).

sábado, 30 de julho de 2011

iara, elsie e carmen

uma coisa puxa a outra. se na vida já é assim, imagina na internet. ontem assisti a um video sensacional postado e protagonizado por iara rennó. filmado no domingo passado em los angeles, "from elsie houston to carmen miranda by iara rennó" acompanha a paulistana batucando em si e cantando "cadê minha pomba rola?" em meio a bagunça de turistas na calçada estrelada de hollywood. essa música foi gravada por elsie em 1930 e no fim do video iara e elsie encontram carmen. olha/escuta só.

From Elsie Houston to Carmen Miranda by Iara Rennó from MOCHILLA

elsie houston? nunca tinha ouvido falar dessa errática contemporânea de carmen nascida em 1902 (sete anos mais velha que a pequena notável). filha de um dentista americano com uma carioca descendente de portugueses da ilha da madeira, elsie se especializou em canto lírico e isso pode explicar meu desconhecimento. descobri então que durante os anos 1920 a morena ficou amiga dos modernistas (mário de andrade, tarsila do amaral, oswald de andrade, etc.) e fez alguma fama na europa. em 1927, na cidade de paris, conheceu e se casou com o poeta surrealista benjamin péret e dois anos depois o casal fixou residência no brasil. daí que os dois anos seguintes foram de profunda imersão, principalmente em viagens, de elsie e benjamin em nossa cultura regional, mas sempre com enfâse na afro-brasileira. em 1930, elsie houston gravou uma série de 78 rotações. "cadê minha pomba rola?" estava entre esses registros (achei aqui).

Elsie Houston - Cadê minha pomba rola by dafnesampaio4

em 1931 tudo muda para elsie e benjamin com o fortalecimento da histeria anti-comunista comandada pelo recém-todo-poderoso getúlio vargas. os dois se mandam para frança e o casamento vai se esfacelando até o fim em 1936. um ano depois ela se muda para nova york e a vida segue aos trancos e barrancos até seu suicídio em 20 de fevereiro de 1943. em 1942, elsie esteve nesse curta parte da boa e velha "política da boa vizinhança". uma soprano perdida em uma macumba para turista ver, emulando uma tal de carmen miranda que havia chegado com muito sucesso nos estados unidos em 1939.



impressionante os paralelos biográficos de elsie com a portuguesa-carioca que ganhou o mundo através de hollywood e se tornou a primeira imagem brasileira pop global. e iara costura todo esse tropicalismo em um video de pouco mais de dois minutos.

p.s.: ah, iara tem feito uns vídeos-poesia olhando direto pra câmera em um blog próprio, o iara diária. vale bem a visita.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

chico, apenas chico

não tenho nada o que falar sobre chico (biscoito fino, 2011) além de que achei um disco chato, arrastado, sem brilho. adoraria ter gostado, mas não aconteceu. acredito, sinceramente, que os arranjos do violonista luiz cláudio ramos, o jaques morelenbaum de chico buarque, ajudam e muito nessa sensação que tive de mesmice. pode ser chatice minha também. o lado bom é que mais uma vez o bruno natal acompanhou as gravações com sua câmera (já tinha acontecido na época do carioca) e o resultado é o ótimo dia voa, documentário disponível na íntegra junto com outros quitutes no chico buarque: bastidores. chico é figuraça.

Chico - "Dia Voa" from Chico Buarque: Bastidores

pra não dizer que não gostei de nada, achei bonita a última faixa, "sinhá", um afrosamba dolorido. e só. a música é parceria de chico com joão bosco, que toca violão e faz uns vocais.


Chico: Bastidores - Clipe "Sinhá" from Chico Buarque: Bastidores

p.s. 1: no mais, engraçado comparar o chico do disco chico com sua participação em "embebedado", uma das faixas de indivisível de zé miguel wisnik (assunto de um recente letra/música). o arranjo da música tem poucos instrumentos, mas seus poucos minutos são mais modernos que o disco inteiro do chico. mais engraçado ainda é acompanhar as piruetas intelectuais do violonista arthur nestrovski, músico presente em quase todas as faixas do disco duplo de wisnik, ao defender chico no estadão.

p.s. 2: quase ia esquecendo de colocar um dos trechos mais divertidos desses bastidores filmados (e que não está no dia voa). é quando chico comenta e racha o bico com a descoberta dessa tal internet (e desse pessoal que povoa as caixas de comentários).

Video do dia: Comentários na Internet from Chico Buarque: Bastidores on Vimeo

terça-feira, 26 de julho de 2011

bjork por michel gondry

está programado para sair em setembro o novo disco da bjork, biophilia, mas uma música já ganhou clipe e novamente a cantora islandesa chamou michel gondry, amigo-parceiro de longa data, para dirigí-lo. com vocês, "crystalline".



mas aqui no esforçado o lance é entregar mais, um pouco mais. então resolvi aproveitar para deixar aqui o registro de uma das colaborações mais interessantes na história do pop entre uma artista e um diretor de clipes. seguem abaixo todos os outros videos de bjork dirigidos, com maior ou menor maestria, por michel gondry.

>> "declare independence" é do disco volta (2007)



>> uma das mais belas músicas de bjork e um dos clipes mais bacanas da história mundial dos clipes, "bachelorette" é do disco homogenic (1997). "jóga", logo abaixo, é do mesmo disco.





>> do ótimo disco post (1995), o segundo disco solo de bjork, saíram três excelentes clipes de gondry. destaque evidente para "army of me", outro vídeo clássico.







>> "human behaviour" é a primeira faixa de debut (1993), a estreia solo de bjork e também marcou a primeira colaboração com o diretor francês.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

rindo pra subir

massacre na noruega comandado por cavaleiro-viking-templário-solitário-loiro-ultra-direitista. morte precoce da doce-raivosa-judia-classe-média-londrina-com-voz-de-negra. dias malucos esses últimos. pra seguir vivendo, só rindo mesmo dessa "sociedade bolchevo-burguesa-social​isto-proto-cristóica", segundo as palavras de marcelo adnet disfarçado de arnaldo jabor.



via @torturra.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

yahoo #10

o tempo ruge, a lusitana roda e a "quinzenalidade" da ultra pop segue firme e forte. já está lá no yahoo o novo texto, "faça você mesmo", e aqui a segue o anterior, o décimo, que fala sobre a comédia nos dias de hoje e a relação tensa entre palco e público.

cartum de bruno maron, do dinâmica de bruto,
publicado na folha de são paulo

CÊ TÁ RINDO DO QUÊ?

Isso mesmo. Que tipo de humor você gosta? Pergunto isso porque parece que estamos vivendo um momento no qual comediantes e uma parcela do público entraram em declarado pé de guerra - ao mesmo tempo que uma nova geração de humoristas foi alçada ao posto de celebridade, são “influentes” no twitter e o diabo a quatro. Piadas viram motivo de polêmica, processo, perda de emprego/patrocínio, debate e, mais recentemente, agressão física.

Na verdade gostaria de entender o que passou pela cabeça do sujeito que na semana passada foi a um show de “comédia em pé” em São Paulo, não gostou de uma piada sobre gordos, levantou-se da sua poltrona, foi até o palco onde estava o humorista e o esbofeteou. Duas informações irrelevantes para o caso: o agressor era gordo e o agredido se chamava Ben Ludmer.

Mas, veja bem, o sujeito pagou 30 ou 40 reais (sem contar estacionamento, refrigerante e quetais), sentou na primeira fileira de um show de humor (que significa que será chamado a participar em algum momento) e, de uma hora para outra, decidiu que estava indignado ou insultado e que o autor daquelas piadas merecia um soco ao invés de uma vaia ou o silêncio. Não dá para entender. Afinal, ninguém vai a um show de humor sem saber o que vai acontecer. É como ir no Teatro Oficina e ficar chocado por ver gente pelada, né não João do Morro?



Não acredito em assuntos tabu para comédias (ou dramas). Tudo pode virar piada. Tudo mesmo. Se boa ou ruim é outra história. E se alguém se sente insultado que faça algo a respeito: processe, boicote produtos relacionados, promova manifestações, xingue muito no twitter, sei lá.

Apesar do nobre trabalho de fazer rir, os humoristas não possuem um salvo-conduto divino para falar o que bem entenderem. Piadas são ações que, como tudo na vida, geram reações e não adianta chorar e clamar pela Santa Liberdade de Expressão (essa liberdade é para todos, lembrem-se).

Por exemplo, não deu para passar batido pela tal piada do Rafinha Bastos que dizia que as mulheres feias deveriam agradecer seus estupradores, registrada em reportagem da Rolling Stone Brasil. Além de ser fraca, a piada foi irresponsável em um tempo com tantos casos impunes de violência contra mulheres. Taí uma que daria muito bem para ser perdida em nome do respeito a próxima.

Não foi o que aconteceu e o “humor transgressor” mostrou sua cara mais atrasada, rindo com o preconceito e não do preconceito, do absurdo. Foram totalmente justificáveis as manifestações contrárias a tal piada, nada de censura ou de patrulha do politicamente correto. Muito diferente da reação do maluco do teatro na semana passada.

Acho até que ele não se insultou com a piada sobre gordos, mas é que seu vazio é tão imperativo que só lhe resta acreditar que sua opinião é a verdade absoluta e que sua forma mais bem acabada é a agressão. É uma dureza saber rir de si próprio.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

letra/música #24

sou muito fã de zé miguel wisnik, de sua voz pequena, de suas melodias rebuscadas, de sua poesia lírica e próxima. nem lembro direito como o conheci, mas provavelmente foi via o pessoal do rumo (ná ozzetti, luiz tatit, etc) no final dos anos 1990. sei que quando ouvi seu primeiro disco, josé miguel wisnik (camerati, 1992), fiquei encantado por várias músicas: "se meu mundo cair", "laser", "mundo cruel" e "a primeira vez, mamãe, que eu fui ao cinema", por exemplo. depois conheci seu lado ensaísta e vieram outros discos, os igualmente belos são paulo rio (maianga discos, 2000) e pérolas aos poucos (maianga discos, 2003), e a direção musical de do cóccix até o pescoço (maianga disco, 2003) da elza soares. só depois de tudo isso conheci suas trilhas para os espetáculos de dança do grupo corpo (nazareth, parabelo e onqotô). e é deste último, uma parceria de wisnik com caetano veloso lançada em 2005, que saiu a "mortal loucura", música feita em cima de um soneto de gregório de matos (1636-1695). detalhe: a versão que segue logo abaixo está no recém lançado indivisível (circus produções, 2011), lindo disco duplo que reúne inéditas, regravações, composições não registradas por ele, em arranjos enganosamente simples com pouca instrumentação. ao lado de wisnik em quase todas as músicas, os instrumentistas-amigos arthur nestrovski (violão), marcelo jeneci (piano e acordeon), márcio arantes (baixo) e sergio reze (bateria).

dividindo o indivisível

mortal loucura
(zé miguel wisnik sobre o poema de gregório de matos também conhecido como "no sermão que pregou na madre de deus dom joão franco de oliveira, pondera o poeta a fragilidade humana")

na oração que desaterra... a terra,
quer deus que a quem está o cuidado... dado,
pregue que a vida é emprestado... estado,
mstérios mil que desenterra... enterra.

quem não cuida de si que é terra... erra,
que o alto Rei por afamado... amado,
e quem lhe assiste ao desvelado... lado,
da morte ao ar não desaferra... aferra.

quem do mundo a mortal loucura... cura,
à vontade de deus sagrada... agrada,
firmar-lhe a vida em atadura... dura.

ó voz zelosa que dobrada... brada,
já sei que a flor da formosura... usura,
será no fim desta jornada... nada.




p.s.: e olha aqui o lindo trecho do espetáculo
onqotô (2005) no qual aparece a versão original de "mortal loucura" com wisnik e caetano alternando vocais entre efeitos, ecos e silêncios.

terça-feira, 19 de julho de 2011

da vida das marionetes

a costumeira genialidade de spike jonze no segundo clipe de hot sauce committee part two (emi, 2011) dos beastie boys. imagino o quanto deve ter sido divertido fazer esse filme.



"don't play no game that i can't win" é uma das melhores músicas do disco e dá uma vontade danada de ouvir coisas novas da vocalista convidada, a santigold, que estreou em 2008 com um discaço ("l.e.s. artistes", "my superman", "creator", "you'll find a way", "shove it", tanta música boa em santogold) e deu uma desaparecida até retornar nesta onda dos beastie boys.

é verdade, podiscrê

via fuck yeah dementia. só podia.

p.s.: e acabei colocando essa imagem no blog só de birra, afinal o censurador bunda mole do facebook não permitiu (disse que era conteúdo previamente sinalizado como abusivo ou algo assim).

segunda-feira, 18 de julho de 2011

cruzando músicas

pois então, um produtor de nova york, max tannone, tem feito mashups cabulosos misturando dub com rap, afrobeat com rap, rap com rock, rap com rap, enfim, o diabo! de seus ouvidos e aparelhos sairam trabalhos como jaydiohead (jay-z + radiohead), doublecheck your head (beastie boys + beastie boys), selene (falas do filme lunar + músicas do compositor clint mansell) e a excelente dobradinha mos dub (mos def + dub) e dub kweli (talib kweli + dub). seu mais recente projeto de mashups, ghostfunk, é uma mistura de raps do veterano ghostface killah (wu-tang clam) com sons africanos da pesada de ebo taylor, victor uwaifo, lijadu sisters, rob kanda, honey & the bees band e gyedu blay-ambolley, entre outros. o resultado é bem massa. escute aí logo abaixo e baixe se quiser, pois tannone libera geral.

Ghostfunk by Max Tannone

dizem que roque santeiro...

nessa edição de julho da revista monet, a nº 100, estreamos uma seção que trará reportagens sobre bastidores de clássicos da tv e do cinema. começamos com roque santeiro, que volta a ser exibida a partir de hoje às 0h15 no canal viva, e também escrevi a segunda, sobre a minissérie agosto, que está na edição de agosto que acabamos de mandar pra gráfica. agradecimentos a itaici brunetti perez que entrevistou lima duarte e josé wilker.

tô certa ou tô errada?

CLÁSSICOS - ROQUE SANTEIRO

Poucas cidades fictícias são tão profundamente brasileiras como Asa Branca, e não coincidentemente ela foi o principal cenário de uma das novelas de maior sucesso no país. A vegetação e os sotaques de várias regiões foram misturados em vários metros quadrados de ilusão em Guaratiba, extrema Zona Oeste do Rio de Janeiro, e personagens memoráveis como Viúva Porcina, Sinhozinho Malta e Zé das Medalhas encarnaram tipos muito reconhecíveis tanto naquele ano de 1985 quanto agora. Mas a história de Roque Santeiro, que agora ocupa o lugar da reprise de Vale Tudo no Canal Viva, não foi um mar de rosas e teve um início bastante conturbado anos antes de sua consagração.

Tudo começou com Dias Gomes (1922-1999), seu autor, que em 1963 escreveu O Berço do Herói. Dois anos depois, e já com o país mergulhado na ditadura militar, a peça teatral foi censurada e proibida (tratava de um falso herói que foi integrante da Força Expedicionária Brasileira), e de nada adiantou Gomes ter feito tanto sucesso com O Pagador de Promessas e O Bem Amado. Para os militares, o autor baiano era um comunista e isso bastava para qualquer proibição.

Dez anos depois, e com a repressão militar ainda mais forte, a TV Globo decidiu produzir sua primeira novela a cores e chamou Dias Gomes para escrevê-la. Daí surgiu Roque Santeiro, uma adaptação de O Berço do Herói ambientada na fictícia Asa Branca e com o trio de protagonistas interpretados por Betty Faria (Viúva Porcina), Lima Duarte (Sinhozinho Malta) e Francisco Cuoco (Roque Santeiro). Tudo corria às mil maravilhas quando uma ligação telefônica de Gomes foi interceptada pelos militares e sua esperteza foi descoberta.

Com dez capítulos editados e quase trinta gravados, Roque Santeiro foi proibida pela Censura Federal na noite de sua estreia. A justificativa era curta, grossa e, claro, sem direito de resposta: “A novela contém ofensa à moral, à ordem pública e aos bons costumes, bem como achincalhe à Igreja.” Apressadamente, a Globo colocou no ar uma reprise de Selva de Pedra, enquanto outra era escrita (Pecado Capital). Ironicamente as duas eram assinadas por Janete Clair, então mulher de Dias Gomes.

Foram preciso mais dez anos para que o público brasileiro conseguisse assistir as estripulias dos moradores de Asa Branca. Só que a essa altura do campeonato, Gomes não queria mais saber de escrever novelas e indicou o iniciante Aguinaldo Silva para o seu lugar. “Dias tinha 40 capítulos da primeira fase de Roque Santeiro já escritos. Eram capítulos mais curtos para as 22h. Fiz uma readaptação para o horário das 20h, mexi em todos os capítulos já prontos e, a partir dali, continuei a novela. Fui até o capítulo 163 e Roque Santeiro se tornou uma obsessão nacional. Mas o Dias decidiu que ele é que teria que acabar a novela. Tivemos um grande arranca-rabo por causa disso. A desavença durou anos, mas, a certa altura, acabou. (...) Sempre digo que Roque Santeiro é uma novela de Dias Gomes escrita por mim”, declarou Silva no livro Autores - Histórias da Teledramaturgia.



Como sinal de respeito, os atores e atrizes da primeira versão foram chamados para reprisar seus papéis, mas poucos concordaram e do trio principal apenas Lima Duarte seguiu como Sinhozinho Malta. “Pouca coisa mudou de uma versão para outra. O que mudou mais foi a relação com os outros personagens, o que altera muito na composição. Por exemplo, o bordão ‘tô certo ou tô errado?’ já existia e era do Dias Gomes, mas o barulho de cascavel, na hora de balançar o relógio, foi idéia minha”, relembrou Lima Duarte em entrevista para MONET. E ao seu lado, nessa versão definitiva de 1985, vieram Regina Duarte (Porcina) e José Wilker (Roque).

O humor escrachado disfarçando críticas sociais, os bordões inesquecíveis para inúmeras gerações, tudo isso e muito mais estão nos 209 capítulos de Roque Santeiro, e boa parte é de responsabilidade de Aguinaldo Silva. “Nunca havia feito uma comédia e, quando comecei a escrever Roque, descobri que essa era a minha praia, o tipo de trabalho que queria fazer. Percebi que, através da comédia exacerbada e da farsa, conseguia dizer coisas que, provavelmente, se fizesse a sério, não teriam a mesma força.”

E assim, sem perceber, o espectador era levado a entrar gargalhando nessa história sobre um herói/santo de mentira (Roque Santeiro) que todos achavam que estava morto e que volta a sua cidade natal, atrapalhando a vida dos poderosos do lugar (Sinhozinho Malta, o prefeito Florindo Abelha e o empresário Zé das Medalhas) e das mulheres do seu passado (Viúva Porcina e Mocinha Abelha). Para bagunçar ainda mais o coreto, uma equipe de filmagem chega a Asa Branca para reencenar as aventuras desse “santo homem” e o ator que faz Roque Santeiro (Fábio Jr.) dá em cima de boa parte do elenco feminino. Realmente não dava para acompanhar o cotidiano de Asa Branca de forma séria.

O sucesso da novela foi tão grande que a audiência girava em torno de 60 milhões de espectadores, o que na época representava de 67% a 80% das TVs ligadas, segundo dados do IBOPE. E ainda ganhou livro, álbum de figurinhas, duas trilhas sonoras e exibições de sucesso em Cuba e Angola (o mercado popular da capital Luanda é até hoje chamado de Roque Santeiro), além de ter marcado a estreia em novelas de Patrícia Pillar, Maurício Mattar e Cláudia Raia. Sem falar que Raia e Yoná Magalhães ainda posaram nuas para a Playboy.

“Só fui perceber que Roque Santeiro foi importante depois que acabou, o que e me levou a olhar para a televisão de um modo diferente, como um veículo realmente capaz de conversar com um país. Eu tinha a sensação que antes do Roque Santeiro, o Brasil era um país que se dividia pelo menos em quatro, porque o Acre não conversava com o Rio Grande do Sul, Roraima não conversava com Goiás, e por aí vai. A gente era muito estranho um pro outro, e depois da novela, viajando pelo país, de repente eu percebi o quanto a televisão tinha sido capaz a ajudar este país a ser um só”, afirmou José Wilker a MONET durante uma brecha nas filmagens de seu primeiro longa como diretor, Giovanni Improta (personagem criado por Aguinaldo Silva, vejam só).

Se Wilker demonstrou alegria ao falar sobre a volta da novela, Lima Duarte pareceu um pouco temeroso. “Estou apavorado. Tem uma expectativa tão grande em torno da reprise que tenho receio de que as pessoas se decepcionem. Peço ao expectador que se lembre de que ainda não tínhamos internet. Por outro lado, peito e bunda não tinham tanta importância e os galãs ainda não eram um iogurte e, o mais importante, ainda não existia o BBB.” Sim, a realidade era outra, mas Asa Branca continua afiada como sempre.


p.s.: os dois volumes da trilha sonora de roque santeiro fizeram muito, muito, muito sucesso. pense em "isso aqui tá bom demais" (dominguinhos e chico buarque), "sem pecado e sem juízo" (baby consuelo), "mistérios da meia noite" (zé ramalho), "de volta pro aconhego" (elba ramalho), "vitoriosa" (ivan lins) ou então "chora coração" (wando), aqui numa versão voz & violão caseiro do usuário Apoc4liptico, conterrâneo meu de fortaleza.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

transversão #40

muito engraçadinho esse caetano veloso que fez uma letra em inglês para sua irmã maria bethânia (logo ela que não canta em inglês) e lançou no primeiro disco que fez no exílio londrino, o ótimo caetano veloso (philips/universal, 1971). talvez pela própria língua escolhida "maria bethânia" foi poucas vezes regravada por aqui. a mana gal costa registrou em seu histórico ao vivo fa-tal, também de 1971. tem também uma versão instrumental comandada pelo violonista leandro carvalho e que saiu no disco london poem (independente, 2004) e até a própria bethânia usou-a para abrir o show-disco nossos momentos (philips/universal, 1982) de um jeito mezzo instrumental mezzo cantado pelas backing vocals de forma resumida (ela mesmo só entra depois, claro). mas escolhi aqui a recente "maria bethânia" que caetano colocou no repertório da turnê do disco zii e zie (universal, 2009) e que saiu no potente mtv ao vivo - zii e zie (universal, 2011). como a banda cê detona, heim?



a outra participação nesse transversão é uma ótima regravação que apareceu em 2009 pelas mãos e gogós da dupla peixoto & maxado. maxado é felipe machado, vocalista da firebug, e o clima é de um ska pouco mais lento e extremamente original. a música acabou sendo registrada no disco i wanna shoyu (independente, 2010). saca só.




p.s.: depois de fechar essas duas versões encontrei uma dos franceses do les beaux bizarres que fizeram a sua "maria bethânia" de um jeito assim meio iggy pop e um ótimo remix da original caetanística feito pelo dj e produtor pedro zopelar.

terça-feira, 12 de julho de 2011

grandes diálogos da humanidade

elena neves (a espanhola elsa pataky) é policial rodoviária recém viúva. seu marido era policial e foi assassinado, por isso ela entrou na corporação. foi convocada pelo agente hobbs (dwayne 'the rock' johnson) por estar motivada e por ser a única incorruptível na polícia carioca na caça a dominic torello (vin diesel) e brian o'conner (paul walker). em uma sequência anterior de velozes & furiosos 5 - operação rio ela cruza caminho com dominic em meio a um tiroteio/correria na favela e acaba fica com seu crucifixo. nessa sequência interna e noturna de pouco mais de 2 minutos ela chega em casa e ele a está esperando nas sombras. ele a desarma, tampa sua boca, depois tira a mão e puxa o crucifixo. está saindo, calado, quando... ah, pense numa tensão sexual.

elena - não entendo. porque vir aqui? porque arriscar tudo por um pedaço de prata de 20 dólares?
dominic - porque isso vale a pena.
elena - você deveria fugir. hobbs te encontrará. você tem todos os motivos para fugir. porque ficar?
dominic [olha para retratos na parede; em um deles está o marido morto dela] - e porque você fica?
elena - meu marido era um bom policial. um homem honesto. nós crescemos juntos nesse bairro. dois anos atrás ele foi morto na rua, bem na porta da nossa casa. reyes [o grande bandido traficante empresário que é dono do rio, interpretado pelo ator português joaquim de almeida] é o dono dessa favela agora. ele dá coisas às pessoas. mas tudo tem um preço. as pessoas daqui precisam de um novo começo. elas precisam ser livres.
[dominic bufa e deixa a arma dela numa mesa]
elena - vocês não mataram aqueles homens [agentes das narcóticos] no trem, não é?
dominic - e porque você acreditaria em alguma coisa que eu falasse? [e sai, mas enquanto abre a porta...]
elena - ei! porque ela [a imagem/crucifixo] é tão especial pra você?
dominic - nunca pensei que alguém entenderia. mas você consegue [e sai, vai embora].


carinho só depois do corre, tá ligado?

algumas boas cenas de ação quase compensam as duas horas de constrangimento geográfico-comportamental-cultural-cinematográfico de velozes & furiosos 5. também é possível rir de tudo isso, facilmente. só depende do seu humor.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

yahoo #09

te falar que o corpus christi me fodeu. fiz um texto todo pensado nesse momento em que certas instituições religiosas querem impor uma verdade absoluta, mas o feriado acabou esvaziando o potencial polêmico do meu nono texto para a coluna ultra pop. poucos comentários, quase nenhum xingamento. confesso que senti uma frustração, escrevi querendo sangue... mas bola pra frente e o ultra pop #10 já está no ar ("cê tá rindo do quê?").

JESUS NÃO TEM DENTES NO PAÍS DOS BANGUELAS

Na coluna que escrevi sobre A Banda Mais Bonita da Cidade coloquei um vídeo-paródia que misturava as imagens do clipe da “Oração” com a música “Bonde da Orgia de Travecos”, dos mineiros da UDR, provavelmente um dos trabalhos musicais mais dementes e escrachados da história mundial. Em seus poucos anos de vida durante os anos 2000 – a dupla encerrou atividades em 2008 -, a UDR queria mesmo era incomodar. Muito. Tanto que em “Bonde de Jesus” misturava o Redentor com orgias, drogas, satanismo, violência e o que mais viesse pela frente ou por trás.

Mas ao contrário dos Rafinhas Bastos e Danilos Gentilis da vida, que usam o politicamente incorreto como desculpa para serem preconceituosos, a UDR incomodava até os preconceituosos com seu underground exageradão, hiperbólico até a medula.

Nos dias de hoje, quando grupos religiosos (evangélicos e católicos) se multiplicam no Congresso Nacional com a intenção de ditar o que os outros devem pensar ou fazer, artistas como a UDR são cada vez mais necessários. Respeito muito todas as religiões. Algumas das mais belas obras do mundo foram criadas por causa de Deus. Mas também é verdade que coisas terríveis, mortes e guerras, foram feitas em Seu nome. Por essas e outras não é mais possível aceitar que em pleno século 21, em um Estado laico como o Brasil, grupos religiosos se comportem dessa maneira.

Imaginem vocês ateus organizados e com muita raiva no coração exigindo a demolição de igrejas e a obrigatoriedade das pessoas exercitarem sua fé apenas dentro de casa. Tão violento e sem sentido quanto isso são figuras como o Pastor Silas Malafaia e os deputados Marcos Feliciano (PSC-SP) e João Campos (PSDB-GO), além de uma instituição como a CNBB, virem a público contra direitos civis básicos como a união homoafetiva (entre outros muitos assuntos que não lhes dizem respeito como aborto e drogas porque, repetindo, o Brasil é laico). Se por seus dogmas uma igreja não quer aceitar casais homossexuais, tudo bem, estão no seu direito, mas não venham querer obrigar que toda uma sociedade faça o mesmo (afinal, existem pessoas que acreditam em outras coisas).



Porém, vamos ilustrar essa monstruosidade com uma comparação bastante simples, bem pragmática. Por um lado, os impostos retirados de cidadãos e cidadãs homossexuais ajudam a pagar o salário de congressistas, entre outras coisas. Por outro, igrejas que pregam o preconceito e a intolerância contra eles não pagam impostos. Como pode uma coisa dessas? Isso é um mundo justo?

Então, amiguinhos e amiguinhas, é chegada a hora de dar o troco. Se pessoas religiosas como os citados – e não estou colocando todo mundo no mesmo balaio, até porque Jesus é um ótimo exemplo de compreensão e humanismo – não aceitam a democracia por bem terá que ser, ironia das ironias, por mal! Em um texto sobre a violenta repressão a marcha da maconha em São Paulo escrevi que “viver numa sociedade democrática requer eterno diálogo, é casamento de todos com todos pra vida toda”. E agora acrescento um “aceitando as diferenças”.

Não estou falando aqui de queimar igrejas, censurar pastores, nada disso. Não se paga intolerância com intolerância. Mas o humor, a crítica debochada, podem nos salvar desse absurdo (sem esquecer o ativismo político, claro). Um exemplo recente foi a criação do tumblr Fiscais do Fiofó que disponibiliza e comenta projetos de lei assustadores propostos pela Frente Parlamentar Evangélica. Outro exemplo na internet é o já clássico e divertidíssimo Jesus Manero. Porque, diferentemente desses fiscais da felicidade alheia, Jesus tem mais com o que se preocupar.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

#eusougay

desde abril compilando imagens dos quatro cantos do mundo, o projeto #eusougay (capitaneado por carol almeida, ou @caroltypes) chegou a esse belo video com a colaboração de muitos e muitas. emocionante a diversidade de caras, jeitos e idades.



e essa música, feita especialmente para o projeto, chama-se "itarumã" (gustavo galo e tatá aeroplano) e é cantada por hélio flanders, márcia castro, tatá aeroplano e gustavo galo (trupe chá de boldo). até onde sei, itarumã é uma cidade em goiás. e mais não sei...

segunda-feira, 4 de julho de 2011

laerte da semana #28

identidade em dose dupla, tripla, etc.

é laerte, na mosca. e para quem não sabe, muriel, a personagem dessas tirinhas, antes se chamava hugo e, tal qual laerte, passou por um processo de "crossdressização". tudo contado no blog muriel total.

sábado, 2 de julho de 2011

transversão #39

fazia tempo que não rolava um transversão nos conformes, então retorno com uma edição particularmente recheada e não poderia ser por menos. é que o caso agora é "ain't no sunshine", canção que o mestre bill withers lançou no disco just as i am (sussex, 1971) e virou sucesso mundial instantâneo. sempre tive a impressão que "ain't no sunshine" existe desde que o mundo é mundo. é daquelas músicas completas, totais, na sua mistura de lamento e balanço. é profundamente soul e ao mesmo tempo aberta para possibilidades em outros gêneros como reggae, funk, samba, eletrônica e rock. mas comecemos pela original na voz suada de seu autor (que começou a escrevê-la inspirada no filme vício maldito, drama etílico de blake edwards lançado em 1962).



sucesso! e vocês sabem como sucessos são... todo mundo quer tirar uma lasquinha. só que não falaremos aqui dos oportunistas e sim de gente da pesada como o saxofonista/flautista/etc rahsaan roland kirk (1935-1977) que, em blacknuss (atlantic, 1971), fez essa linda versão instrumental cheia de novas camadas.



e a jamaica, sempre atenta ao soul americano, não podia ficar de fora. ken boothe, por exemplo, gravou sua versão, mas ficaremos aqui com a de boris gardiner lançada no disco a soulful experience is happening (vampisoul, 1971). bela e sentida que só.



provavelmente no mesmo ano, no panamá, o pessoal do the soul fantastics escapou da influência do vizinho caribe e fez de "ain't no sunshine" um funk pesadão (no bom sentido). tá na excelente coletânea panama! vol.2 - latin, funk and calypso on the isthmus 1967-77 (soundway, 2008), que o original pinheiros style disponibilizou para a turma.



outra banda pouco falada. outra data desconhecida. outra coletânea. os moleques da kashmere stage band, regidos pelo prof. conrad o. johnson (1915-2008), quebraram tudo nessa interpretação moderna, e igualmente funk e instrumental, que foi registrada no disco texas thunder soul 1968-1974 (stones throw, 2006).



e então veio o sempre muito inspirado guitarrista josé feliciano (cego como rahsaan roland kirk) que em 1972 mostrou a sua ótima gravação e a registraram em video.



no mesmo 1972, um garoto de 13/14 anos lançou seu disco de estreia solo, got to be there (motown, 1972), e lá estava "ain't no sunshine". o nome dele era michael jackson (1958-2009) e mesmo que já fosse o menino prodígio conhecido e admirado no jackson 5 ninguém estava preparado para tamanho poder interpretativo sobre uma música tão adulta.



brasil não podia faltar. foi o grande sivuca (1930-2006) que, no auge de sua carreira internacional (quando morou em nova york de 1964 a 1976, tocava com miriam makeba), colocou a música de bill withers para abrir o disco sivuca (vanguard, 1972). acompanhado por muitos músicos americanos, o paraibano torceu o soul e acelerou sambisticamente.



agora, se em bill withers o drama é próximo, real, sussurrado, em tom jones a coisa muda um pouco de figura e seu drama é de fera ferida, afetado e poderoso. e os arranjos dessa versão, que saiu no disco the body and soul of tom jones (decca/parrot, 1973), são matadores.



e para encerrar, mais uma instrumental. dessa vez assinada pelo gigante vibrafonista roy ayers na sua fase ubiquity. e a canção pop(ular) transforma-se numa suite épica e suingante. é do disco red, black and green (polydor, 1976).

sexta-feira, 1 de julho de 2011

jornalismo investigação, jornalismo denúncia

no litoral do espírito santo, na pacata e turística guarapari, o prof. germano borges vai às ruas com seu microfone, um câmera amigo e uma enorme vontade de denunciar o que anda errado em sua amada cidade. ele é o dono do quadro "repórter nos bairros", exibido pela tv guarapari, uma emissora que retransmite tv cultura e tv brasil, mas é tão de pequeno porte que seu sinal não alcança toda a cidade de pouco mais de 100 mil habitantes. germano não liga, afinal agora ele tem a amiga internet e sua voz pode ser ouvida por todos (além do rostinho bonito). foi assim que o conhecemos... no encontro com uma moradora de rua...



a situação dos moradores de rua o deixa muito constrangido, incomodado mesmo, e ele voltou a tocar no assunto em outro video. sua delicada abordagem é tocante.



germano não se abala e em outra reportagem denuncia o estado deplorável e alagado da entrada de um quartel da polícia militar. é lá onde encontra uma dupla de pescadores mineiros.



mas nada supera o mergulho sem snorkel no mundo sombrio das drogas que invadem "a cidade mais importante do turismo do espírito santo". é dele que saem pérolas como "a maconha não esconde rosto, é uma droga lícida (...) e tem um efeito alucinógico" ou então "eu sei que o cara que fuma cocaína acaba quebrando tudo, né?".



em um mundo onde o crack é batata baroa, tudo pode acontecer.