quinta-feira, 25 de abril de 2013

mexidão #06

fiquei na dúvida se colocava ou não a imagem que deu origem a prisão do "nazista de BH", no qual antônio donato baudson peret enforca um sem teto no centro de belo horizonte. não o fiz no yahoo porque tem uns malucos bem malucos por lá, mas aqui serve como lembrança que a intolerância segue firme, forte e em plena luz do dia (olha lá no fundo da foto, canto direito, um tiozão fotografando ou filmando sem tirar a bunda da cadeira).



O PRECONCEITO IMPUNE DE CADA DIA

Desde que comecei a escrever aqui no Yahoo! – pouco mais de dois anos atrás – sempre tentei acompanhar o máximo possível o que acontece na caixa de comentários. É uma loucura, uma babel de opiniões, alguns elogios e muitos xingamentos. Boa parte das pessoas que comentam nem se dá ao trabalhar de ler o texto e já disparam a lançar pedras contra o colunista. Mas esse é o jogo e, no fundo, gosto também de procurar entender como se manifestam certos ódios. Por exemplo, em um dos textos recentes aqui do Mexidão (“Joelma calada é uma poeta”), o que mais li foi gente reclamando que agora não se podia falar mais nada sobre homossexuais que se corria o risco de ser preso. Nada mais longe da verdade.

Antes de tudo, não é que agora não se pode falar mais de homossexuais (e “falar” aqui é xingar). Nunca pode. Quem falava de “boiolas” e “sapatas” (ou de negros e nordestinos) em tom violentamente pejorativo sempre esteve errado. Não é assim que se trata pessoas, independente de quem sejam, do que façam e de ontem tenham nascido. O que agora está acontecendo é uma maior consciência de todas as partes envolvidas (menos dos preconceituosos, claro) e uma luta por direitos para todos.

Mas voltando ao assunto de ser preso por preconceito. Ontem, 14 de abril, Antônio Donato Baudson Peret, 24 anos, foi preso na rodoviária de Americana (SP). Ele é o tal skinhead mineiro que poucas semanas atrás postou no Facebook uma foto no qual aparecia enforcando um morador de rua negro. A Delegacia Especializada de Investigações de Crimes Cibernéticos (DEICC) de Belo Horizonte em ação conjunta com a Guarda Municipal de Americana (GAMA) monitorou os passou de Antônio Donato até encontrá-lo visitando uma namorada que conheceu na internet e o prendeu ainda dentro do ônibus. Estavam cumprindo um mandato de prisão por apologia ao crime, racismo, nazismo e formação de quadrilha. Com ele foi encontrado um soco inglês, uma faca e um facão.


O sujeito cumprirá 30 dias de prisão preventiva enquanto as investigações prosseguem, mas o que chama atenção é o histórico de crimes impunes de Antônio Donato. Em janeiro de 2009 ele espancou um jovem homossexual de 19 anos. Em setembro de 2011 foi a vez de um casal gay. Nenhum dos dois casos chegou à Justiça. Em abril de 2011, um morador de rua menor de idade foi vítima de sua brutalidade e o caso chegou a ter duas audiências, mas Antônio Donato não apareceu. Na verdade, seu “grande erro” foi ter postado a foto no Facebook, o que lhe garantiu visibilidade na rede e, finalmente, um rosto a ser procurado. Se não fosse por isso ele ainda estaria por aí agredindo com a certeza da impunidade como todos os inúmeros casos Brasil afora (afinal, em 2012, o Disque 100 registrou uma média de 8 casos de violência por dia contra a população LGBT; número que deve ser muito maior)

Em um comentário que postou junto com a foto (ele tentou apagar depois, mas a imagem jpa tinha se espalhado) criticou governo e sociedade na seguinte forma: “Falsos democratas, sociedade libertina, policiais corruptos, direitos humanos e por aí vai... O velho pão e circo para o povo humanista”. É a mesma balela que se espalha como fogo de palha pelos comentários de anônimos e nos discursos de oportunistas como Marco Feliciano, Jair Bolsonaro e Silas Malafaia. Gente que se acha melhor que os outros, donos da verdade, gente que não respeita a diferença, gente autoritária da pior qualidade. Enquanto a homofobia não for considerada crime essa gente selvagem estará solta por aí agredindo inocentes que só querem viver tranquilos. Deu pra entender?

quarta-feira, 24 de abril de 2013

#vocêpraça no peito

é com muito prazer que venho aqui anunciar a chegada das camisetas do #vocêpraça. tinha imaginado isso no início, mas de uma forma amadora, caseira. daí surgiram os camaradas da greentee com a proposta de fazer uma série e achei bacana e surpreendente porque não conhecia ninguém lá. foi uma coisa totalmente espontânea de interesse e identificação. pra fechar o projeto eles fizeram um vídeo de divulgação, como sempre fazem quando rola um lançamento de uma nova série de camisetas, e cá estou eu falando uma coisa ou outra, coçando a barba, e fazendo uns grafites na rua natingui (que foram apagados no dia seguinte). ah, a camiseta custa singelos 58 reais e pode ser comprada aqui.

Greentee + Esforçado from greentee on Vimeo

terça-feira, 23 de abril de 2013

viagem de momo

só de voz e violão esse quarto disco de marcelo frota, o momo, e a melancolia segue firme, forte e envolvente (tem quem ache demais, eu mergulho fundo). sinceridade dolorida e beleza também estão nas nove faixas de cadafalso, disco sucinto e direto em seus 25 minutos (e que está para download gratuito no site oficial de marcelo). acho seu trabalho anterior (serenade of a sailor, 2011) um dos grandes desse início dos anos 2010, mas cadafalso tem uma falsa simplicidade arrebatadora, uma regravação de humberto teixeira ("eu vou pro ceará", lançada originalmente em 1953 por marlene) e três parcerias com wado ("sozinho", "cadafalso" e "copacabana"). wado, aliás, escreveu o release do disco - "a coragem para mirar o abismo", e lembrei de lhasa de sela e seu verso "con el abismo yo me enamoré", mas isso é outra história -, e nele traçou uma rota por cadafalso: "a terra natal é minas, o pai é cearense, a vida é vivida no rio de janeiro. e é sobre este chão flutuante que meu talentoso amigo, o compositor marcelo frota, nos apresenta mais um punhado de pérolas em seu disco solo mais brasileiro". as minhas preferidas são "uu" e "recomeço".

mexidão #05

acelerei o passo lá no mexidão, peguei o ritmo, mas como são três postagens semanais não posso colocar aqui na mesma velocidade. o esforçado viraria um simples espelho do mexidão e aí seria mals. preciso colocar pelo menos uma postagem exclusiva entre uma coluna e outra. vamos ver como vai funcionar. bem, depois que escrevi o texto, rafael castro entrou em contato comigo pelo facebook e muito educadamente se colocou a disposição para falar mais do assunto, explicar seu lado, seu ponto de vista sobre a música e os eventos que se seguiram. a longa entrevista que ele me deu foi publicada com aqui no esforçado com o título "rafael castro, advogado do diabo de si mesmo". ah, as fotos abaixo são todas da marcha das vadias/2012.


MÚSICA POPULAR DE ESTUPRO

O que Henrique Costa, cantor sertanejo de Nobres (MT), tem em comum com Rafael Castro, natural de Lençóis Paulistas (SP) e uma das revelações da nova música independente paulistana? Músicas, digamos assim, polêmicas. Uma de cada, na verdade (o assunto aqui, portanto, não são os artistas e sim essas músicas e o que elas representam). Vamos às provas...

PROVA 1 - “A noite tudo pode acontecer / Traz a tequila pra ela enlouquecer / Um black, um red, um blue e fica no grau / Se bebe tudo elas liberam geral” (“Então se Joga”, Henrique Costa). Adaptação livre de “Psycho Killer” do Talking Heads, a música “Então se Joga” ficou mais conhecida em fevereiro deste ano após o lançamento de seu clipe. Mas, curiosamente, boa parte das críticas negativas acusou o jovem de 18 anos de estragar o clássico do Talking Heads (Como se uma música tomasse lugar da outra, baita bobagem).

PROVA 2 - “Se você bobear eu vou te encher / de birinight / até você me achar jóia e a gente sair daqui / (...) Depois eu tiro sua roupa, / te amo sem você ver. / Você é tão quente quietinha, / me faz derreter...” (“Vou te Encher de Birinight”, Rafael Castro). Essa música de Rafael não é de agora, mas acabou voltando aos holofotes após um show que fez para a Calourada da USP deste ano, o que motivou uma estranha nota do Diretório Central dos Estudantes (a tal “Moção de repúdio às músicas opressoras de Rafael Castro” foi divulgada mais de um mês após o show).


Nos dois casos, a ideia central é bastante clara: embebedar garotas para conseguir sexo. Em entrevista ao site do jornal O Globo, Henrique Costa pediu “desculpas se alguém entendeu errado, mas eu quis mostrar alegria e festa, só isso”. Já Rafael Castro publicou em sua página no Facebook a sua própria (e longa) interpretação da letra, no qual enumera “repressão sexual, julgamento de valores, depressão, baixa auto-estima e alcoolismo se degladiando numa aproximação entre um casal que deveria ser muito mais simples que isso. Nesse caso há uma crítica social implícita e é ela quem vai conduzir nossa tragédia”.

E é disso mesmo que estamos falando, da tragédia que é a violência (física, sexual, psicológica, etc) contra a mulher no Brasil. Não adianta falar que “a música estimula apenas a diversão” ou que é uma “crítica social” quando isso não está claro na letra. A jornalista Kátia Abreu foi justamente nesse nó interpretativo em seu texto “Amigos, amigos; cretinices à parte”: “O argumento mais comum é o de uma suposta ironia na canção [de Rafael Castro]. Ora, se a intenção de uma obra não é compreendida pelo público há de se pensar que o problema está no emissor e não nos receptores da mensagem. Alegar ‘não entenderam a piada’ é se igualar ao discurso de caras como Rafinha Bastos e Danilo Gentili, quase unanimemente criticados por aí”.


Meus caros, se vocês deixaram brecha para interpretarem suas músicas como “apologia ao estupro” é porque algo vocês fizeram errado na composição (em tempo, “Então se Joga” é do mineiro Gui Bittencourt, Henrique Costa é apenas o intérprete). E não é possível deixar brechas quando o assunto é estupro (aqui ou em qualquer outro lugar). Segundo o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2010), foram registrados – repito, registrados, o que significa que o número é maior –15704 casos de estupro em 2008. O número saltou, em 2009, para 22477. Isso sem contar tentativa de estupro e atentado violento ao pudor. É coisa séria, nada pop. Então, fica a dica de Alex Castro no indispensável “Feminismo para homens, um curso rápido”: “Para um homem, simplesmente ouvir as mulheres, sem interpelar grosseiramente nem minimizar as agressões sofridas, já é grande parte do processo”.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

alma do brasil, instantâneos

décio galina me chama, eu vou. nessa segunda colaboração para a audi magazine a pauta era pedir para cinco renomados fotógrafos brasileiros escolherem uma foto que julgavam sintetizar o brasil. cinco fotografias, cinco regiões, um só país. e aí rolar uma conversa sobre a tal região e a foto, brasilidades e coisa e tal. todas as entrevistas rolaram por telefone e só tenho agradecer a disponibilidade e a simpatia dos envolvidos (sei bem que 'dar entrevista' não é o forte da profissão), mas a conversa com o mestre bóris kossoy foi particularmente deliciosa. ah, não custa repetir que a versão aqui no esforçado é sempre ligeiramente diferente da impressa.


EM BUSCA DA ESSÊNCIA

À pedido da Audi Magazine, cinco renomados fotógrafos brasileiros escolheram registros que resumem a grande experiência que é o Brasil



“Olha a tempestade caindo sobre o Rio Tapajós... tirei essa foto em 2008 durante uma expedição de pouco mais de um mês cruzando a Transamazônica. O Tapajós é um rio belíssimo com praias de areia branquinha na época da seca (julho a novembro). Nessa região existe a deliciosa tradição do Piracaia, que é comer peixe feito na areia da praia. Imagine a cena: o sol se pondo, o rio banhado por uma luz vermelha, a areia menos quente, umas estaquinhas de madeira seca com peixe frito. É uma coisa linda de se ver (e comer). Já andei tanto na Amazônia quanto os irmãos Villas-Boas, fiz quatro livros, conheci lugares maravilhosos como o Pico da Neblina, os lagos de Mamirauá, o Cabo Orange e o Parque Nacional de Anavilhanas, então, definitivamente, a região é a minha matriz criativa. Conheço o caboclo, o caráter dele, sua educação, beleza, simplicidade e força. Ele é o guardião de uma floresta que precisa cada vez mais buscar a sustentabilidade.”



“Essa foto foi tirada em 1972 em um dos períodos mais sombrios da história brasileira. Estava em Brasília pela segunda vez dentro de um projeto no qual fui a todas as capitais do país. Fotografava o que tinha de ser fotografado, mas também fazia imagens pra mim, como esta onde olho para o poder central, para uma justiça cega que só vê o que quer, tudo sob um contexto de deformação. É uma metáfora ao pé da letra daqueles anos de chumbo, o outro lado de uma balança desequilibrada no plano social e econômico. Como sou formado em Arquitetura também existe meu interesse estético pelas formas e espaços da cidade, mas lembro que na época parecia que estava andando em uma maquete, uma assepsia total. Não se via gente, tudo parecia mais ameaçador e isolado. Hoje a cidade está mais humanizada, mais plena de histórias e dúvidas. Sou formado em Arquitetura e a questão das formas, dos espaços, sempre esteve em minha cabeça. Brasília é tudo isso, mas quando você anda pela Esplanada hoje em dia vê que essa utopia moderna feita no coração do Brasil por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa finalmente é um lugar que quer ser cidade.”


“As Serras Gaúchas não são uma coisa só como muitos pensam com aquela coisa de italianos e alemães. A cultura do pampa, por exemplo, tomou conta dessa região de cânions, que vai de Cambará do Sul até Santa Catarina por uns 250 km. Tirei essa foto do Cânion Montenegro, no município de São José dos Ausentes, em 2011 para o meu livro Brasil Invisível, que foi uma tentativa minha de mostrar a população afastada dos grandes centros. Foi em um das minhas 30 viagens para a região e nessa vez fiquei em uma ex-estância de gado que virou pousada. Tive o prazer de compartilhar o dia-a-dia com o gaúcho tomando chimarrão, comendo churrasco no fogo de chão e fazendo passeios a cavalo que saem da praia e sobem esses paredões vencendo um desnível de 1000 metros. Esses cânions profundos possuem algumas das paisagens mais lindas que já fotografei, mas faço questão de não só registrar a natureza. A cultura do local tem que estar junto.”




“Nasci no Rio de Janeiro, mas fui bem cedo para São Paulo, onde fui criado. Depois morei por 20 anos em Nova York e quando retornei fiquei me questionando quem eu era, o que era ser brasileiro, porque mesmo sem querer perdemos as referências quando moramos longe. Então, no primeiro grande trabalho autoral após a minha volta decidi ir ao Rio de Janeiro para tentar me encontrar. Usei uma câmera grande, de médio formato, porque ela muda a relação com o que você fotografa (é junto com ela e não através dela). Ela é difícil, complexa, mas também te ensina a enxergar além do retângulo. E era isso que eu queria no Rio de Janeiro, ir além. Usando filme preto & branco, mexendo com foco e desfoque, paradoxos. Afinal, o Rio é um dos lugares mais contraditórios e extraordinários do Brasil, com praia e montanha, morro e asfalto, tudo muito próximo, muito junto. Essa foto é da praia do Leblom com o Morro Dois Irmãos ao fundo, e eu fiquei esperando o sujeito passar dentro do retângulo do gol.”


“Acho que a Bahia é o único estado brasileiro onde é possível ver a cultura tradicional nas ruas. Tem as baianas com trajes típicos vendendo acarajé e vatapá, o pessoal jogando capoeira, o candomblé, gente olhando o mar como se fosse numa foto dos anos 1930, os pescadores. E é uma cultura muito forte, basta olhar o tanto de excelentes músicos, pintores e escritores baianos. Existe esse clichê de falar que baiano é preguiçoso, mas discordo. Acho que eles tem um outro ritmo, que é muito mais ditado pelas forças da natureza, principalmente as marés. Eles sabem que não adianta perder tempo, muito menos se estressar, quando é a natureza que rege todas as coisas. Falando em natureza, essa foto eu tirei na Praia do Espelho, um lugar maravilhoso perto de Trancoso. Típica praia onde se pode desfrutar o que é essencial na Bahia: céu, sol e mar, tudo sem pressa.”

sexta-feira, 19 de abril de 2013

mexidão #04

e o mexidão segue firme e forte. aqui vai "tudo é droga, nada é droga" sobre uma divertida manifestação que aconteceu no viaduto do chá contra o projeto de lei que pretende aumentar a pena para o tráfico de drogas, além de outras barbaridades (felizmente, parece que o projeto está sendo esvaziado). foi um dos textos mais compartilhados dessa nova fase no yahoo (mais de 3300 'likes' no facebook). por lá tem outros três: "música popular de estupro", "o preconceito impune de cada dia" e "o cultuado anonimato de rodriguez".


TUDO É DROGA, NADA É DROGA

Por essa o Viaduto do Chá não esperava. Ontem, 2 de abril, em plena luz do dia, o grupo que promove a Marcha da Maconha distribuiu drogas para os passantes sob a vigília educada de alguns policiais militares. O mundo ficou louco ou já estamos em um futuro mais civilizado? Nem uma coisa, nem outra, muito pelo contrário. O que aconteceu foi um protesto bem humorado contra o Projeto de Lei 7663/2010 que prevê uma maior rigidez na lei antidrogas, na contramão de todas as discussões sobre o tema mundo afora, e que pode ser votado ainda este mês na Câmara.

Peraí, mas quais drogas foram distribuídas? Cigarros, cachaça Camelinho, conhaque Dreher, aspirinas, pirulitos em forma de coração, Fandangos, Flying Horse, trouxinhas de açúcar, revistas Veja e assim por diante. O objetivo era mostrar a hipocrisia da “guerra às drogas”, afinal o que faz uma droga ser considerada legal ou ilegal não são critérios de saúde e sim questões políticas e econômicas. Todo mundo está careca de saber que álcool e tabaco, drogas absolutamente legais, matam muito mais que todas as drogas ilegais juntas, mas esse pessoal legalizado tem um lobby poderoso e muita grana.


Lutando contra gigantes, o pessoal da Marcha da Maconha (que acontecerá em São Paulo no dia 6 de junho) conseguiu chamar atenção da imprensa com essa história de distribuição de drogas. Nenhum jornalista se deu ao trabalho de ler na página do evento no Facebook uma observação importante: “serão distribuídas apenas drogas legais, favor não portar substâncias ilícitas”. A preguiça dos profissionais de imprensa, a vontade burra de ter manchetes “polêmicas”, ajudou e muito o evento, que teve uma ampla cobertura na internet e na TV (cito aqui matérias no Terra, no Estadão e na Carta Capital).

E o que propõe a PL 7663? Um aumento violento e desproporcional das penas por tráfico (um traficante de crack, por exemplo, pode ter uma pena maior que um assassino confesso pego em flagrante, e o resultado disso é uma lotação cada vez maior dos já lotados presídios), um cadastro das escolas para estudantes que usem drogas, terceirização da internação compulsória (instituições privadas ganharam uma baita grana para internar a seu bel prazer) e por aí vai o absurdo proposto pelo deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS). E mais absurdo ainda o fato de que o deputado é médico, um profissional que deveria cuidar de pessoas e não encarcerá-las.

Certamente o honorável (só que não) deputado não ouviu seu colegas médicos. Em reportagem da Agência Brasil, integrantes do Conselho Deliberativo da renomada Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) afirmam que “o projeto fortalece a estigmatização e o preconceito em relação aos usuários de drogas ao manter a criminalização do consumo e as políticas de internação compulsória e involuntária” e aprovaram por unanimidade uma recomendação para a retirada do Projeto de Lei da pauta.


Já o Conselho Federal de Psicologia (CFP) afirmou em nota que “o projeto poderá ainda aumentar as condenações, criando uma indústria de internações compulsórias, aumentando de forma exponencial a despesa pública e violando os direitos elementares de pessoas em situação de fragilidade social.” A PL 7633 só servirá para fazer o Brasil andar para trás na questão das drogas como bem diz o antropólogo Maurício Fiore (Cebrap/Neip) no texto “Drogas: o Congresso Nacional pode aprovar um enorme retrocesso” e o jornalista Denis Russo Burgierman, diretor de redação da revista Superinteressante, em “De volta a 1980”.

Então, você aí que gosta de gritar que “drogado tem tudo que morrer” precisa entender de uma vez por todas que dependência é caso de saúde pública e não de polícia. E que o problema verdadeiro, como bem diz o presidente uruguaio Pepe Mujica, não são as drogas e sim o tráfico de drogas, e isso vale tanto para as ilegais quanto para as legais (a famigerada Lei Seca norte-americana só serviu para aumentar a criminalidade e transformar, do dia para a noite, cidadãos comuns em bandidos). A descriminalização, e uma consequente legalização, são a chave de um futuro sem essa guerra estúpida onde nada se resolve e muito se perde.

p.s.: os malucos do centro de São Paulo foram pegando, uma a uma, as drogas (legais) distribuídas ontem no Viaduto do Chá. Só as edições da Veja sobraram.

domingo, 14 de abril de 2013

rafael castro, advogado do diabo de si mesmo

no texto mais recente que fiz para o mexidão, “música popular de estupro” (inspirado pelo texto “amigos, amigos, cretinices à parte”, da jornalista kátia abreu), falei de duas músicas que causaram discussões acaloradas nas redes sociais nas últimas semanas. em suas linhas e entrelinhas, “então se joga” (henrique costa) e “vou te encher de birinight” (rafael castro) falam de embebedar garotas na balada para elas “liberarem geral” (no caso de “então se joga”) ou para serem abusadas (no caso de “vou te encher de birinight”). no texto do yahoo critiquei as músicas (e não os artistas) por tratarem de forma leviana e sem cuidado de um assunto muito delicado. poucos dias depois, rafael castro entrou em contato comigo pelo facebook procurando uma via de falar mais sobre o assunto e tentar explicar o lado dele da história pr’além do espírito linchador que circula pela internet. em nenhum momento achei que nenhum dos dois artistas estava fazendo apologia ao estupro, mas sim que essa mentalidade está muito arraigada no inconsciente masculino, e gostei da abertura de rafael para discutir o assunto. então mandei-lhe uma série de perguntas. suas respostas seguem abaixo e não editei nada para deixar que ele fale por si só.


qual a origem de "vou te encher de birinight"? quando foi escrita?
a música nasceu como a maioria das minhas canções, inventando histórias no computador com o violão em punho. não foi inspirada em nenhum fato ou acontecimento específico. foi composta, gravada e lançada em 2007.

você já tinha tido algum problema com a música antes da calourada da usp? alguém tinha te falado algo sobre ela?
nunca tinha tido problema algum. na verdade quando viemos pra são paulo em 2008 e começamos a fazer shows por aqui, essa era uma das músicas mais pedidas, uma das favoritas da galera que acompanhava os shows. favorita até de gente que tá falando mal hoje, mas é compreensível e nas perguntas seguintes eu falo mais sobre isso.

como foi no show [realizado em 27.02.13]? na hora houve algum protesto?
no show foi tranquilo. não houve nenhum protesto além de uma garota muito alcoolizada pedindo pra tocarmos chico buarque do começo ao fim do nosso show, mas nós não atendemos.

o pessoal do dce entrou em contato com você depois?
o dce não entrou em contato comigo. um dos membros mandou um e-mail para meu produtor comentando que algumas pessoas acharam o conteúdo dessa música estranho e que se conhecessem o artista não chamariam, mas nada foi falado além disso conosco. fica a curiosidade: como alguém contrata um show que desconhece?

como você ficou sabendo da moção de repúdio às "músicas opressoras" de rafael castro? o que achou dela?
ficamos sabendo por compartilhamentos alheios no próprio facebook; não nos avisaram em nenhum momento sobre essa moção. eu achei despropositada e precipitada, porque eu estaria disposto a dar entrevista ou participar de debates se convidado pelo pessoal do dce, para esclarecer qualquer mal entendido ou me desculpar com quem houvesse se ofendido.
na moção (onde ninguém assina, permanecendo até agora um texto anônimo) há várias acusações levianas das quais não pude me defender, mesmo tendo mandado um texto pedindo “direito de resposta” que não foi nem respondido nem publicado. além disso, o sistema de moderação de comentários não permite nenhuma resposta no site onde a moção foi publicada, vetando completamente qualquer opinião de quem a leia.

participação de tulipa ruiz no show de rafael castro durante 
a calourada da usp-sp, agora em fevereiro de 2013

como você acompanhou os desdobramentos pró e contra sua música na internet?
achei interessante, pelo bem ou pelo mal, a música chegar onde chegou. como eu disse em um comentário, a música promoveu um grande debate sobre arte, política, sociedade, machismo, violência, liberdade de expressão, etc. mesmo sofrendo algumas condenações, achei que esses desdobramentos não poderiam ser melhores porque os temas levantados são de suma importância, ainda mais nos tempos que vivemos agora no brasil.

quando a gente conversou no facebook você disse que estava preocupado com a gritaria [palavra minha] dos dois lados (pró e contra). que isso estava fazendo com que um não entendesse o outro, que um enfraquecesse o outro. pode explicar melhor?
o que acontece é o seguinte. tanto as pessoas que condenam a canção quanto quem me defende, no frigir dos ovos, acaba generalizando muito as coisas. as pessoas que leram a moção acabam ficando com uma impressão de que deve existir o julgamento artístico entre certo e errado, entre permissível e reprimível, um pensamento com um viés maniqueísta onde o artista não deveria retratar uma violência sem uma crítica fácil de entender ou uma “lição de moral”. isso enfraquece a arte. por outro lado as pessoas que defendem essa liberdade de criação, acabam atacando ferozmente os movimentos e as lutas, ridicularizando-as, diminuindo o trabalho dessas pessoas e dificultando um diálogo que é muito importante – neste caso a violência contra a mulher. acaba virando um bate boca desgastante sem qualquer objetivo além da própria polêmica e isso só faz enfraquecer os dois lados. eu sou a favor dos dois e, para que conste, sou contra qualquer violência, seja à mulher, ao trabalhador ou à liberdade, sou a favor da existência urgente de movimentos e lutas sobre essas e outras questões que ano após ano são reprimidas pelo nosso governo. é ridículo que isso seja posto em questão por causa de uma obra de ficção.

em um nota que escreveu no facebook você deu sua interpretação da música falando em crítica social. essa interpretação mudou conforme o tempo? quando começaram a aparecer leituras diferentes da música que a sua você se preocupou? o que achou? pensou em reescrevê-la?
na interpretação que eu escrevi ,eu ainda estava tentando manter o bom humor e explicar a canção pros amigos da rede social de um ponto de vista onde poderiam haver variáveis na própria história, tipo “advogado do diabo”. eu disse que a crítica social estava no comportamento, pessoas que precisam beber pra se comunicar e pra aceitar outras pessoas, e que a tragédia seria uma consequência desse comportamento típico dos oprimidos social e sexualmente. de uma forma mais ampla, eu acho que quando você expõe um problema do cotidiano em uma obra de arte, este simples fato já é uma crítica social, porque ela pode agredir, pode gerar reflexões, pode trazer assuntos importantes pra serem debatidos. eu não me preocupo com leituras diferentes porque a arte é mutável e suas interpretações também. se compuséssemos a canção da “cabeleira do zezé” hoje, em tempos onde felicianos e afins querem implodir e exterminar toda a causa homoafetiva, este compositor talvez fosse hostilizado por alguns movimentos. em outros tempos, em outros contextos, a canção pode servir como uma celebração bem humorada da diversidade. eu acho que o ódio e a repressão artística de tempos em tempos recaem no reflexo do contemporâneo, do medo que as pessoas sentem, com razão.

olhando em retrospecto você acha que errou em algo ou que faria diferente? ou está de consciência tranquila?
talvez alguns desgastes pudessem ser evitados se eu não tivesse dado importância para a tal moção que circulava num circuito muito restrito antes de ser publicada por mim, mas estou de consciência tranquila porque é conversando que a gente se entende e o assunto era pertinente. espero que as pessoas tenham percebido que debater é bom e crucificar é inútil.

o que fazer com essa música agora? como você a vê hoje?
há tempos eu não toco essa música ao vivo, porque eu e o pessoal da banda já tínhamos enjoado dela, de tanto que pediam. na usp a gente ressuscitou a canção porque uma das nossas participações especiais, o pélico, gosta. não pretendo mais tocá-la ao vivo por enquanto porque o tom da música não está conversando com esses tempos de repressão e medo, além de ter se desgastado com a polêmica. eu continuo achando que os artistas devem expressar aquilo que eles querem do jeito que eles querem, mesmo correndo o risco de serem mal interpretados ou acusados disso ou daquilo. talvez seja justamente esse tipo de coisa que está faltando. e pra quem pensa que ficar perseguindo artistas ajuda em alguma coisa, eu sinceramente recomendo que olhem o brasil pelo buraco mais embaixo.

terça-feira, 9 de abril de 2013

o que é que a bárbara tem?

agora na edição de abril da revista da gol saiu uma reportagem ligeira que fiz sobre o disco novo da cantora e compositora bárbara eugênia (é o que temos). pena que não rolou mais espaço porque a entrevista que aconteceu em uma padaria na vila madalena rendeu mais que as risadas e os sucos tomados. mas aqui no esforçado, meu-amiguinho-minha-amiguinha, sempre tem mais, e logo após o texto e o streaming do disco dá pra conferir o resto da conversa e algumas fotos roubadas entre perguntas e respostas. e o disco? é o que temos, produzido por edgard scandurra e clayton martin, é interessante, variado, romântico, bem humorado e atual. traz uma cantora-compositora mais segura e um punhado de músicas ótimas. destaque absoluto para "ugabuga feelings" (que a princípio me chamou atenção por causa de uma referência a "você passa eu acho graça"), "you wish, you get it" e a arrebatadora "roupa suja", dueto-hit com pélico. a estreia de bárbara em journal de bad, produzido por dustan gallas e junior boca, já era bastante promissora ("drop the bombs", "agradecimento", "o oposto do osso", etc.), mas ela realmente tem muito mais a mostrar. basta ouví-la.



LIVRE, LEVE E SOLTA

Uma das vozes mais interessantes da atual música popular brasileira está com trabalho novo na praça. É o que Temos é o segundo disco de Bárbara Eugênia, cantora e compositora nascida em Niterói, criada no Rio de Janeiro e radicada em São Paulo. “Comecei a pensar nesse disco uns dois anos atrás, mais ou menos na época que escutei Amador do Adanowsky, que foi um disco que mudou minha vida. Ele fala de buscar uma coisa maior, amor, coisas boas. É um disco totalmente hippie e vi que estava muito descolada desse meu lado meu, e de uma coisa mais espiritualizada. Foi super transformador pra mim. Aí fiquei pensando que queria um disco que fosse mais pra esse lado, cheio de canções, e com mensagens positivas”, explicou. E assim nasceram as 11 faixas do disco com sonoridades que variam da psicodelia ao iê iê iê, do bolero ao folk, com destaque para os duetos-parcerias com Pélico (“Roupa suja”) e Tatá Aeroplano (“Não tenho medo da chuva e não fico só”), a regravação de um clássico de Diana (“Porque brigamos?”) e as divertidas “Ugabuga feelings” e “You wish, you get it”. “Acho que no meu primeiro disco [Journal de Bad, 2010] tinha uma coisa mais carregada nos rompimentos, no amor, em tudo, e nesse disco, mesmo quando trata disso, tem mais piada, não se leva tão a sério”, confessa e ri, tímida, provavelmente lembrando de coisas que só ela sabe (e agora canta).



"A mudança não foi pelas pessoas e sim pelas circunstâncias da vida, porque quando fiz meu primeiro disco [Journal de Bad] tinha acabado de começar a cantar. Estava fazendo shows pouco mais de um ano antes. Então não sabia nada de nada e estava muito feliz de gravar um disco."

"Esse disco novo já estava meio pronto na minha cabeça. Quando a gente começou a ensaiar e a tirar os arranjos eu já sabia o que queria. Então coordenei.. meio que de certo produzi junto porque escolhi tudo o que queria. Essa música eu quero assim, essa outra eu quero assim... nessa eu quero o Guizado, nessa outra quero o Chankas, e foi assim... foi um disco que dominei totalmente. É um disco muito mais meu, apesar de ter sido feito em conjunto com a banda e deles serem muito meus amigos. Quer dizer, eles me ajudaram a chegar aonde eu queria. Eu tenho ideias, mas não sei executar. Mal toco violão. Então preciso muito deles pra chegar onde quero, pra fazer acontecer. O primeiro eu não sabia o que queria, mas sei que gostei, que ficou lindo, que amei. Mas tem essa diferença que é bem grande."

"Comecei a pensar nesse disco uns dois anos atrás. Mais ou menos na época que escutei o segundo disco do Adanowsky [Amador, 2011], que foi um disco que mudou minha vida num grau muito forte [ela acabou gravando “Sozinha”, uma versão dela mesmo de “Me siento solo]. Ele fala de buscar uma coisa maior, de amor, da vida, de coisas boas, é um disco totalmente hippie e eu vi que tava muito descolada desse lado meu, e da canção, e de uma coisa mais espiritualizada. Foi super transformador pra mim. Aí fiquei pensando que queria um disco que fosse mais pra esse lado, um disco de canções, com mensagens positivas."



"“Coração” é uma música super otimista. A gente escolheu ela pra começar porque sintetiza bem o disco. Não é mais lenta, nem a mais animada, nem a mais alegre, nem a mais triste. É uma música que engloba tudo isso e tem uma ‘buena onda’ ali. A Diana [“Porque brigamos?”] é aquela coisa... sou muito fã da Diana e nos show costumava cantar “Meu lamento”, mas aí fiz “Porque brigamos?” no [programa] Som Brasil e o Odair José estava lá, ele era um dos homenageados, e ele disse que eu tinha que gravar essa música. Eu me identifico muito com essa música, óbvio, porque já passei por situações assim e sinto as coisas assim. Eu faria uma música nesse estilo. Acho que no meu primeiro disco tinha uma coisa mais carregada nos rompimentos, no amor, em tudo, e nesse disco, mesmo quando trata disso, tem mais piada, não se leva tão a sério."

"E tem o bolero, “O peso dos erros”, que é uma música muito pessoal, mas não é sobre uma relação, nem sobre questões românticas, é uma outra coisa. Essa é a música mais densa do disco, gosto muito da letra dela, acho que é a minha favorita. E mesmo nela tem uma mensagem positiva. Quero que a pessoa melhore. Acho que mesmo que fale de rompimentos no disco dessa vez é com uma visão menos fatalista, menos pessimista das coisas."

"Fiz “You wish, you get it” nos 45 minutos do segundo tempo… duas músicas não tinham dado certo, não queria fazer mais uma versão, e até tinha umas músicas mais antigas, mas não queria... aí sentei em casa, comecei a ouvir Devendra Banhart, fiz uma vodka com suco de laranja [risos], fiquei lá e teve uma música que me inspirou... é isso! Comecei a escrever e fiz a música em 15 minutos. Cheguei com ela no último dia de gravação na Casa do Mancha. Fiquei muito feliz de encerrar o disco com ela, que é um rock pra cima e com uma mensagem otimista."

"Escrevi “Ugabuga feelings” em 2010 ou 2009 e ficou guardada, não sabia muito o que fazer. Aí cheguei pro pessoal e falei que tinha um axé [risos], vamos ver o que a gente faz com esse axé, porque ela é um axé, né? Total. Se a Ivete Sangalo quiser gravar ficarei feliz. Seria lindo. Aí a gente transformou em um rock, o Clayton usou Bo Diddley como referência pruma pegada mais primitiva."



"Minha voz melhorou bastante. A prática, a tal da cancha, mais soltura, segurança... tô experimentando mais. Antigamente não conseguia abrir voz comigo mesmo. No primeiro disco não tem isso. Não é porque não quisesse e sim porque não conseguia. Agora já consigo e fiz várias vezes no disco. Tenho certeza que melhorei muito e que ainda vou melhorar muito mais. Como compositora também [melhorei]... Journal de Bad foram dez anos de histórias, tem música que escrevi com 18, 19 anos, então é muita história... agora tá tudo mais fácil e ando muito inspirada. Desde o ano passado que tenho escrito bastante. Já tô fazendo um disco novo, em parceria com o Chankas, e está ficando foda. Enfim, tenho escrito muito e com a facilidade de pegar uma letra que não tava terminada e terminar, pegar um pedaço de uma e juntar com outra... estou brincando mais, experimentando..."

"Estou muito afim de fazer mais isso esse ano, trabalhar com outras pessoas... o Tatá Aeroplano, por exemplo... a gente tem uma ligação muito forte, a gente sempre fica muito feliz cantando juntos, e somos muito parceiros, temos ideias parecidas, somos amigos há muito tempo." 



p.s.: ano passado, bárbara registrou uma versão acústica "i wonder" em sua participação no projeto in.casa. no disco é o que temos, a música ganhou uma pegada country com o acompanhamento de mustache & os apaches.

mexidão #03

publiquei o terceiro mexidão sobre as declarações homofóbicas de joelma na terça passada e na quarta de manhã surgiu a "bomba" da saída de armário da daniela mercury. não inviabilizou o texto, claro, mas ele teria ficado melhor com a história da daniela. seria um interessante molho a mais. o pedro alexandre sanches acabou aproveitando a deixa e fez o belo "o canto trovejante de daniela mercury". 



JOELMA CALADA É UMA POETA

Para quem conhece Joelma, a voz da Banda Calypso, não foi uma surpresa a entrevista que deu ao jornalista Bruno Astuto da revista Época. Entre um assunto e outro, a cantora afirmou que se tivesse um filho gay “lutaria até a morte para fazer sua conversão”. Não contente em falar na tal “cura” ainda fez uma comparação tão absurda que até Deus deve ter ruborizado. “Já vi muitos se regenerarem. Conheço muitas mães que sofrem por terem filhos gays. É como um drogado tentando se recuperar”.

Mas é isso, não foi uma surpresa porque Joelma é reincidente no assunto preconceito. Em agosto do ano passado, um vídeo amador flagrou a cantora conversando com um fã gay e soltando pérolas como “[Você] vai se converter, vai virar homem, vai casar, ter filhos, vai dar muita alegria para o seu pai e sua mãe”. O fã ainda dá um belo troco – “Eu já dou, do jeito que sou” -, mas Joelma não quer nem saber.

Agora, diante da explosiva (e, felizmente, negativa) repercussão de suas palavras no final de semana , Joelma soltou um comunicado oficial com a velha desculpa que foi mal interpretada, que suas palavras foram distorcidas, aquela coisa toda. Até poderia ser verdade, pois existem jornalistas que são tão canalhas quanto ela é preconceituosa, mas esse vídeo do ano passado e suas declarações posteriores (“Conviver com o erro da pessoa é uma coisa, mas incentivar o erro é errado” ou “Falei em cura porque diversos fãs já me disseram que se livraram do homossexualismo”) confirmam que é isso mesmo que ela pensa. No domingo, em meio ao fogo cruzado, ela até retuitou um fã que disse o seguinte: “Tô contigo na sua opinião sobre os gays. Também acho que ser gay é fogo no cu. Homem nasce pra ser homem e mulher pra ser mulher.” Para bom entendedor...

menos, muito menos joelma

E a liberdade de expressão (gritam seus fãs)? Bem, ela tem todo o direito de falar o que quer, mas também precisa arcar com as consequências de seus atos e falas. Isso é uma democracia. Ninguém é obrigado a aceitar ou gostar de homossexuais ou pitboys ou comediantes de stand up, mas é preciso respeitá-los. Os evangélicos e católicos não são obrigados a aceitar o casamento igualitário (civil), mas nosso Estado é laico e nenhuma religião tem o direito de se meter nesse assunto. É isso que pessoas nocivas como os deputados Marco Feliciano e Jair Bolsonaro não conseguem colocar em suas cabecinhas.

Pode ser que agora esteja acontecendo uma nova onda conservadora (eu acho que é a mesma de sempre, só mais organizada e com microfone na mão, graças a uma imprensa que vive de “polêmicas”), mas também existe uma reação progressista. O médico da família brasileira, Dr. Dráuzio Varella, disse em artigo que “mais antiga do que a roda, a homossexualidade é tão legítima e inevitável quanto a heterossexualidade. Reprimi-la é ato de violência que deve ser punido de forma exemplar, como alguns países fazem com o racismo”. Entendeu Joelma ou quer que Camilla Uckers explique?

subir mais, subir além

agora em abril saiu minha primeira colaboração pra tam nas nuvens (escrevi um tanto bom para a antiga tam magazine). a pauta veio deles, mais precisamente de augusto olivani, e foi bacana saber que fui chamado porque eles queriam alguém que contasse bem uma história (no caso, a desse jovem piloto paulista e seu recorde de volta ao mundo). a entrevista com walter toledo aconteceu em um restaurante de rodízio perto do campo de marte, pouco depois das fotos que claus lehmann tirou para a revista, o que ajudou a criar um ambiente divertido pra história se desenrolar (e, como sempre, a versão aqui está maior que na revista, sem revisão e coisa e tal). mas então, depois que entreguei o texto, uma ótima surpresa: chamaram o bróder daniel almeida, autor do header do blog, para fazer uma ilustração para a matéria. 



NA VOLTA QUE O MUNDO DÁ

A história da jornada de Walter Toledo, o piloto paulista que entrou para o Guiness como o mais jovem a dar a volta ao mundo em um monomotor; e em menos tempo também


A pista do Campo de Marte, em São Paulo, está pegando fogo. É um sábado de verão e faz aquele tipo de calor que nem chuva ameniza. No meio desse cenário, e com uniforme de piloto, Walter Toledo ouve com atenção as indicações do fotógrafo para os retratos que ilustram essa matéria. Vai um pouco mais para a direita, um pouco para a esquerda, levanta o rosto e depois abaixa, coloca um chapéu de boiadeiro, alterna com um capacete, sobe no avião, e desce, e sobe, e fica ao lado, sempre acompanhado de óculos escuros. “É mais difícil ser fotografado que voar”, confessa entre um clique e outro. E olha que esse garoto de apenas 21 anos já foi protagonista de uma aventura aérea e tanto.

Entre julho e agosto do ano passado, Toledo deu a volta ao mundo e entrou para o Livro Guiness dos Recordes como o piloto mais jovem a fazer tal feito em menos tempo e com um monomotor. O recorde anterior, de 2007, era do jamaicano Barrington Irving, que tinha 23 anos na ocasião e fez a viagem em pouco mais de 90 dias. Toledo estava com 20 anos e completou o trajeto em 49 dias. “Se não tivessem acontecido dois problemas, a volta ao mundo poderia ter sido feita em 30 dias, mas de qualquer forma abaixou bem, né?”, explica sem falsa modéstia e com um forte sotaque do interior de São Paulo, mais precisamente de Lins, cidade a 429 km da capital.

Bastante seguro para tão pouca idade, Toledo sempre soube que iria voar. Nasceu sabendo, diz. “Meu avó foi piloto no passado, então sempre teve essa coisa de voar em casa. Só fiquei esperando ter a idade obrigatória para começar o curso teórico. Entrei com 16 anos, até um pouquinho adiantado. Em um ano, um ano e meio, a pessoa já está formada”. Durante e após a parte teórica, o jovem piloto se submeteu a horas e horas em simuladores e muitas outras de voo até conseguir sua habilitação pela Faculdade de Aviação Civil.


“Sempre convivi no meio, então desde cedo já perguntava e queria saber como as coisas funcionam. Tinha mais ou menos noção de tudo, não teve muita novidade”, mas não esconde certa frustração por seu plano inicial não ter dado certo. Também desde cedo quis voar em caças militares, só que ficou sabendo tarde demais que existia uma idade limite para entrar na Academia Preparatória de Cadetes do Ar, a porta de entrada para a Força Aérea Brasileira. Quando viu, já era. “Ficou uma sensação de vazio, mas tem que tocar a vida. Não tem caça pra voar? Vai voar em outra coisa então. Voar ainda é o mais importante”.

A essa altura, as fotos já tinham sido feitas e o jovem piloto estava com uma fome de anteontem. A decisão mais rápida era ir a um rodízio perto do Campo de Marte e lá fomos todos, incluindo os avós do piloto, Walter e Elba. Entre picanhas no alho e maminhas na manteiga, Toledo contou do momento de virada quando leu uma matéria sobre a volta ao mundo do jamaicano. Viu que era um recorde possível de ser batido, que a família era sócia de uma empresa que possuía um monomotor, e embarcou com tudo nessa aventura. “Do surgimento da ideia até o dia em que parti foram cinco meses”.

Mas antes do avião decolar, então batizado como Piper Malibu Matrix, as outras cinco pessoas envolvidas no projeto “Brasil Voando Alto” ainda precisaram ralar bastante para enfrentar alguns obstáculos: o patrocínio, o seguro e a compra de combustível na Rússia (afinal, o país tem uma legislação que não permite comercialização para aviões particulares). Todos foram resolvidos a tempo, porém no dia da partida a empresa russa responsável pelo combustível desistiu do negócio. Só que era impossível recuar com o sonho do recorde tão próximo e Toledo partiu, deixando o pessoal “de terra” cuidando dos enroscos russos.


A rota inicial foi a seguinte: saída de Goiânia rumo a Miami, local do início da contagem, com passagens pelas ilhas de Granada e Porto Rico, no Caribe; depois rumo ao Canadá pela costa leste norte-americana, Groenlândia, Escócia, Inglaterra e Alemanha. “Esse avião não tem radar meteorológico, então era só no visual e com cartas de navegação, bússola e cronômetro. Por mais que planejasse você só ia ver o tempo ruim em cima da hora. Esse foi sempre um problema, principalmente sobre o mar”. Uma das partes mais complicadas da viagem foi justamente a travessia pelo Atlântico Norte, mas nada se aproximaria do tormento que aconteceria na longa passagem pela Rússia.

Quando chegaram à Alemanha tudo estava certo com o combustível para o resto da viagem. Porém o governo russo só permitiu quatro aterrisagens e pelo planejamento, a partir do desempenho da aeronave, seriam necessárias sete. A saída foi instalar um novo tanque de combustível e isso precisou ser feito na Escócia. Este foi o primeiro atraso, só incômodo pela burocracia. O segundo foi mais sério, porque potencialmente fatal, pois um grande vazamento de óleo do avião em pleno voo obrigou uma aterrisagem forçada em Yakutsk, considerada a cidade mais fria do mundo, na Sibéria Oriental.

Enquanto o avião era consertado, Toledo foi surpreendido com o convite para falar do projeto “Brasil Voando Alto” e das relações entre países no Fórum dos Jovens do Leste da Rússia. “Como sabia que tinha muitas paradas no país fiz um curso intensivo de russo. O que não entendiam em inglês eu complementava no russo e vice-versa. Mas taí outra coisa que foi mais difícil que voar. Comecei a falar da viagem, mas eles queriam saber de outras coisas porque são muito ligados em política”, e o raciocínio do ainda faminto piloto foi interrompido pela oferta de um camarão com catupiry.


“Aí falei coisas como o Brasil e Rússia são países emergentes e que se a gente se unir acaba ganhando muito mais. Falei que eu mesmo comprava fertilizante russo pra jogar no pasto pras minhas vacas comerem e depois vender a carne de volta pra Rússia... compro nada, tava inventando [risos]. Mas falei que era esse tipo de parceria que a gente deveria fazer em muitas áreas”, e novamente ri ao lembrar-se da nova surpresa com uma fila de mais de 100 pessoas querendo seu autógrafo. “Ah, falei que não era jogador de futebol, nem dançarino, nem cantor, e que eles podiam ir embora”.

Após sair da Rússia, o monomotor atravessou o gelado Mar de Behring e entrou no Alaska, passando depois pelo Canadá e chegando aos Estados Unidos em Salt Lake City. A última surpresa da viagem aconteceu nos últimos 100 km quando Toledo foi informado que o devastador Furacão Isaac estava se aproximando de Miami. A única saída foi um voo baixo e arriscado pelo gigantesco Parque Nacional Everglades. O resto foi festa, muita festa.

“Vi muita coisa lá de cima. O Caribe é muito, muito bonito. Água clarinha, dá pra ver o chão do mar. O Alaska, a Groenlândia, o sol da meia noite na Islândia, é uma coisa de louco o tanto de coisa bonita que tem no mundo”. Ao total, o projeto “Brasil Voando Alto” percorreu 11 países, aterrissou em 36 aeroportos e consumiu 8540 litros de combustível, cruzando todos os meridianos da Terra. Sobre novos desafios ainda não sabe, mas tem certeza que serão no ar.



sexta-feira, 5 de abril de 2013

mexidão #02

quase pegando o ritmo do mexidão. depois de pepe mujica e deste papa francisco, já rolaram joelma e distribuição de drogas no centro de são paulo. todos muito "polêmicos" e com recordes pessoais de curtidas no facebook e comentário malucos. vamoquevamo.

"o novo papa é tão humilde que faz a brincadeira do 'puxa meu dedo?' com os brothers e solta pum"

FRANCISCO I, SEU HUMILDÃO

Jorge Mario Bergoglio caiu dos céus para a Igreja Católica. Claro que por aqui alguns ficaram chateados com a escolha de um papa argentino, com destaque para o pessoal do Jornal Nacional e da Globo News, que parece que já tinham até gravado uma vinheta com o Galvão Bueno gritando “É Papaaa! É Papaaa!”. Paciência. A verdade é que Bergoglio, ou melhor Francisco I, atendeu as preces de uma igreja enfraquecida por décadas de afastamento de seus fieis. Qual o segredo? Seu estilo.

“O principal a se entender sobre Francisco I é que ele é um conservador populista, ao mesmo estilo de João Paulo II. É um homem de posições conservadoras fortes em questões de doutrina, mas com um toque popular. Prega em estações de trem, nas ruas. Vai até os bairros pobres para rezar. Não espera as pessoas irem até a igreja, vai até elas. Mas a mensagem é absolutamente conservadora. Ele opôs-se ao aborto, à lei do casamento homoafetivo”, explicou o jornalista argentino Horácio Verbitsky em entrevista ao Democracy Now.

Diretamente do Vaticano, Ilze Scamparini adora muito tudo isso e tem arrepios de prazer ao falar que o crucifixo de Francisco I é de aço e não de ouro, que usa transporte público, que recebeu uma camisa do seu time de futebol do coração (San Lorenzo) e que decidiu ficar nos aposentos simples da Casa Santa Marta e não no luxuoso apartamento papal. E dá voltas e volta sobre acusações que o atual papa denunciou colegas jesuítas que acabaram sendo sequestrados e torturados pela ditadura argentina.

"o novo papa é tão humilde que fez uma sessão de flexões depois de comer sozinho um ovo de 500g da cacau show"

Em sua primeira Missa do Crisma, Francisco I afirmou que a Igreja Católica e seus fieis precisam de “pastores com cheiro de ovelha”. Impossível prever se todo esse esforço trará novos frutos católicos nessa batalha de fés, mas certamente é melhor (ou menos pior) um papa que sorri que o outro que quando sorria parecia prestes a ordenar “Fogo!” a um pelotão de fuzilamento.

De qualquer forma, seu conservadorismo era esperado e foi um recado claro para a Argentina que aprovou leis descriminalizando o aborto e legalizando o casamento igualitário (sem falar que nossos vizinhos punem exemplarmente, diferente de nós, os cabeças de sua sangrenta ditadura). Tarde demais, Vaticano! O Estado é laico e por mais que prendam respiração e obstruam votações, a carroça da nossa civilização anda pra frente.

Humilde ou não, a figura do Papa se tornou peça de museu ou um Rei Momo que faz muito barulho por nada. E o Brasil, o país da internet moleque, criou o tumblr Papa Humildão para brincar com essa humildade que é mais fachada que qualquer outra coisa.

terça-feira, 2 de abril de 2013

o charminho da gang

a primeira vez que falei da gang do eletro aqui no esforçado foi em outubro de 2010. já tinha virado fã de cara e o grupo virou presença constante aqui. ainda em 2010, rolou uma coletânea digital organizada pelo timpin pinto e em março de 2011 fiz um perfil da dupla maderito e waldo squash, os fundadores da gang, para o site da vice brasil (a entrevista por skype rendeu tanto que publiquei material bônus de maderito e waldo). pouco depois entraram keila gentil e william nos vocais e o quarteto começou a fazer mais e mais shows, produzindo muito e preparando a estreia em disco. como 2012 acabou sendo o ano da conterrânea e amiga gaby amarantos – waldo e a gang participaram do disco dela, treme –, acho que eles, estrategicamente, deixaram o disco para este ano. gang do eletro (deckdisc, 2013) reúne em 10 faixas toda a versatilidade do quarteto. e dá-lhe brega, cumbia, tecnobrega, música eletrônica pra sorrir e o diabo a quatro. é o som que a galera dá valor.


claro que sou suspeito, mas taí um disco cheio de diversão e muitas informações musicais. Já os vi ao vivo umas quatro ou cinco vezes – ano passado no festival sónar e no sesc pompéia, shows memoráveis – e o disco conseguiu captar a energia do quarteto. os meus destaques pessoais vão para “dançando no salão”, “só no charminho”, “una cosa”, “eletro do robô”, “esquenta” e “velocidade do eletro”, que ganhou um clipe rodado no centro de belém.


e pra finalizar, umas fotos que tirei desses shows da gang do eletro no sónar (as duas primeiras) e no sesc pompéia (as restantes). neste último rolou participações da banda uó e de felipe cordeiro.