agradecimentos especiais a bia lins, clara souza, daiana de souza e danilo moura que mostraram - pela primeira vez e em público - questões muito íntimas [as íntegras de suas entrevistas estão aqui]. outros agradecimentos à psicóloga paula bonilha e aos psicanalistas arnaldo dominguez e marilucia melo meireles que me ajudaram a entender isso tudo. e, acima de tudo, ao amore carolina, que tem um umbigo lindo [mesmo que ela não acredite].
umbigo, umbigo meu
Uma das imagens mais icônicas criadas pelo fetichismo cinematográfico de cinquenta tons de nove semanas e meia de amor é a do cubo de gelo dando voltas ao redor do umbigo, um filete de água gelada escorrendo para dentro dele e, por isso, uma mulher mordendo os lábios de prazer. Mas o que é sexy pra uns é motivo de agonia extrema, quase horror de sexta feira treze, para quem sofre de onfalofobia, o medo aflitivo de umbigos [onfalo é umbigo em grego, e fobia é fobia em qualquer lugar].
“A primeira recordação que tenho de mal estar é minha mãe brincando comigo, tinha uns dois anos, e ela fazia cócegas lá e eu chorava porque doía. Reconheci assim a existência do umbigo e que ele dói. Ainda hoje é como se fosse uma ferida em recuperação, mas ainda muito sensível”, explicou Bia Lins, arquiteta de Curitiba.
Outras conexões com a mãe, o nascimento ou a primeira infância também são feitas por Daiana de Souza: “Minha mãe sempre ficou intrigada com essa sensação ruim, de agonia, que tenho. Porque veio já na minha infância. Pensei em fazer regressão, porque nada me tira da cabeça que é lance do começo de tudo, lá do meu nascimento, da hora do parto ou de dias depois [ou até da gravidez da minha mãe]”, disse a jornalista gaúcha de Campo Bom, região metropolitana de Porto Alegre.
Lembranças parecidas tem Carolina Toledo, analista de pesquisa de mercado em São Paulo, que diz que “não sei se minha mãe tentava limpar com cotonete quando eu era pequena. Mas a minha aflição não é uma coisa de olhar, foi sempre de tocar ou ser tocada. Dá uma sensação de enjoo, vontade de vomitar. É como se eu ficasse muito vulnerável, sabe? Parece uma invasão, dá sensação de fragilidade. E tem uma dorzinha física também.”
Mineira de Manhuaçu, Clara Souza também se sente vulnerável. “Tenho há muito tempo, não lembro quando começou. Talvez tenha desde sempre. Sinto uma coisa terrível quando alguém toca no meu umbigo. Não é cócega, não é tesão. É uma sensação de invasão, chega a me dar falta de ar”, recorda a fotógrafa que mora e trabalha em Salvador.
primeira dupla da matéria na trip
Bia, Carolina, Clara e Daiana tem aflição do próprio e, principalmente, de mexerem nele. Com Danilo Moura a questão é mais externa. “Tenho problemas com esses umbigos para fora. É horrível, me dá agonia, uma sensação estranha. É como se algo estivesse fora do lugar, mas de um jeito grotesco. Sinto o meu antebraço repuxando, os pelos ficam eriçados, uma aflição. Não é nada bom”, disse o assistente de importação em Diadema.
Será coincidência que as quatro mulheres onfalofóbicas ouvidas para esta reportagem tenham questões com o próprio umbigo e justamente o único homem tenha com o dos outros? “Mulheres geralmente têm mais fobias físicas que os homens. Primeiro porque, numa sociedade machista, é menos permitido ao homem sentir medo. Mas acima de tudo tem a questão da relação da mulher com seu próprio corpo, do tabu de certas partes, da maior ou menor exposição das mesmas, de pudor”, opina a psicóloga.
Mas quem vive isso íntima e solitariamente durante tantos anos – e a agonia só piorou com o passar do tempo –, tal questão de gênero é a menos importante. Daiana teve uma época de pesadelos recorrentes com alguém afundando o dedo em seu umbigo. Faz tempo que não os tem. Bia só dorme de bruços, pois tem uma sensação boa de proteção. Quando vira de barriga pra cima cobre o umbigo com as mãos e sempre evita dormir de lado. Danilo busca não olhar pessoas na praia ou piscina para não ser surpreendido por “umbigos pra fora”. Clara tem horror aos umbigos estufados das grávidas, mas precisa encará-los na pós-produção dos retratos que tira.
A gravidez, aliás, é uma grande questão para as onfalofóbicas. Clara não quer ter filhos e Bia, que nunca passou por uma gravidez, acredita que teria problemas ao mexer no umbigo de um bêbe. Daiana não conseguia limpar o umbigo de sua recém-nascida e o marido é que dava conta da tarefa. Hoje, um ano depois de dar à luz, ela consegue limpar, mesmo com alguma agonia. “O que pra mim é uma conquista e tanto”, comemora.
Carolina, que está grávida, não quer nem pensar no próprio umbigo nos próximos meses e também passou para o marido a responsabilidade de limpar o da futura filha nas primeiras semanas. E complementa: “Tenho aflição também com cordão umbilical, e já tinha isso antes de ficar grávida. É como se a qualquer momento o bebê pudesse me puxar pelo cordão, dar um tranco e doer meu umbigo”. Mas mesmo com toda essa aflição, Carolina prometeu enfrentar todos os umbigos do mundo por sua Tereza.
Daiana encarou seu medo, anos atrás, de outra forma. “Resolvi colocar piercing pra tentar boicotar esse troço chato. Pensei: vou colocar um pendurico porque aí quero ver ter essas frescuras. Foi horrível. O negócio inflamou e minha própria pele expeliu o adorno. Até hoje tenho uma cicatriz ali que se potencializou, inclusive, quando engravidei. E detalhe: a linea nigra, comum em gestantes, acentuou justamente quem? Ele, o umbigo”, e dá uma risada, sinal que a aflição anda perdendo terreno para o bom humor.
segunda e última dupla da matéria na trip
Se quiserem, onfalofóbicos podem buscar ajuda profissional. “A função da fobia é a de proteger o sujeito da aproximação do desejo [do outro] e seu tratamento se dá, na psicanálise, pela via da transferência. Como a questão da fobia é muito colada no real, para que haja alguma eficácia simbólica exige-se do analista um ato. E a maioria dos analistas sofre de ‘horror’ do ato”, explicou Arnaldo Dominguez de Oliveira, psicanalista e fundador da Associação Etcétera e tal.
Já a terapia comportamental, muito mais pragmática, não possui essa aversão “ao ato” para o tratamento de fobias. “A gente ajuda o indivíduo a enfrentar aquela situação fóbica de uma forma gradativa e sistemática através de pensamentos cognitivos mais positivos. É uma técnica chamada dessensibilização sistemática. Mas, como a psicanálise, também acreditamos que fobia não precisa de medicação, é só terapia mesmo. Medicação só é necessária se a fobia estiver acompanhada de algum quadro depressivo”, afirmou Paula Bonilha.
Sem nunca antes terem falado conscientemente sobre suas fobias, Bia, Carolina, Clara, Daiana e Danilo até acham interessante a ideia de terapia, mas acreditam também que não é pra tanto. Só o fato de terem verbalizado a um completo estranho e saberem que não estão a sós “nessa maluquice” serviu como substituto gratuito para qualquer tratamento; pelo menos, por ora. Também ajuda terem parceiros(as) compreensivos(as). O resto dá-se um jeito.
E, afinal de contas, se pudessem escolher entre ter ou não ter umbigo? O que seria? ‘Ter’ foi a resposta unânime e enfática. “Mas preferia um que não me desse tanto o que falar. Ou melhor: queria descobrir o porquê disso tudo pra poder fazer as pazes com o meu”, resumiu uma Daiana esperançosa de, finalmente, curar essa cicatriz.
Um comentário:
Belo texto. Já eu adora esfregar a minha glande em um umbigo feminino, algumas gostam, outras preferem um anal meio dolorido que uma pincelada no umbigo. Na verdade alguns umbigos nem merecem...
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