A Marcha from Cinema de Rua on Vimeo
terça-feira, 31 de maio de 2011
abre as asas sobre nós
segunda-feira, 30 de maio de 2011
caminhando e pulando e gritando
mas duas coisas muito bacanas da marcha me fizeram pensar bastante: a ótima e atual reocupação do espaço público da cidade (em outras é mais fácil, mas são paulo é dureza para estimular esse tipo de reunião de pessoas) e a enorme quantidade de questões no decorrer da marcha. não era uma marcha monotemática e sim uma lombrigona cheia de muitas coisas a discutir e resolver (raça, sexo, direitos civis, questões de classe, etc.), o que deve se tornar cada vez mais comum em manifestações do tipo. a rua serve pra isso, pra encontros, trocas, diálogos, quer o judiciário paulista (e outros) permita ou não. e foi sobre isso que o bróder @mauriciofiore tratou em seu ótimo texto publicado na tendência/debates na folha de sábado (logo abaixo).
Debater nas ruas não é crime
por Mauricio Fiore
O julgamento da constitucionalidade das proibições impostas às Marchas da Maconha por alguns tribunais estaduais será um marco do amadurecimento democrático brasileiro. As ações, impetradas em 2009 pela então procuradora-geral da República Deborah Duprat, objetivam a extinção definitiva das censuras à manifestação.
A Marcha da Maconha é um movimento pacífico pela legalização da planta Cannabis e ocorre anualmente em mais de 200 cidades em todo o mundo. Sua proibição é uma grave violação aos direitos constitucionais de reunião e de expressão. Em São Paulo, esse ritual autoritário se repete desde 2008: o Ministério Público, por meio de promotores do Grupo de Repressão ao Tráfico de Entorpecentes, pede a proibição da marcha em sua véspera. O Tribunal de Justiça sempre os atendeu e, neste ano, o desembargador Teodomiro Méndez decidiu que a manifestação do último sábado era ilegal a menos de 20 horas do seu início. Os organizadores, como nos outros anos, acataram a decisão judicial e realizaram uma Marcha pela Liberdade de Expressão, na qual as pessoas poderiam se manifestar sem mencionar ou portar qualquer referência à maconha.
A ação da Polícia Militar foi ambígua. Primeiro, negociou os termos da marcha e bloqueou o trânsito da avenida. Mas, logo depois que as cerca de mil pessoas saíram do Masp em direção à rua da Consolação, foram surpreendidas, pelas costas, por bombas de gás, balas de borracha e cacetetes. Houve um PM e muitos manifestantes feridos, seis presos e milhares de transeuntes amedrontados com a violência.
Como pesquisador do consumo de drogas psicoativas, convivo com a dificuldade de debater publicamente o tema. O tabu e a desinformação são produtos de um século de proibicionismo - um paradigma autoritário, ineficiente e danoso. Recentemente, o debate entre especialistas e políticos sobre modelos alternativos à "guerra às drogas" se fortaleceu. É fundamental que esse debate aconteça também nas ruas e envolva não só os milhões de consumidores de maconha e outras drogas ilegais, mas todos os que se inquietam com a violência e a corrupção geradas pela proibição.
Entretanto, na democracia de alguns promotores e juízes, temas como o consumo de maconha só podem ser discutidos em ambientes assépticos e climatizados. Alegam que, quando vão às ruas para manifestar sua discordância, os cidadãos fazem apologia do crime de tráfico, justamente o crime que a marcha busca enfraquecer. Falam também em "indução ao uso de maconha". Seguindo esse raciocínio, os brasileiros que se manifestam pela descriminalização do aborto ou pela instituição da pena de morte deveriam ser proibidos de se reunir, porque estariam incitando a interrupção da gravidez ou o extermínio estatal. Felizmente, não são.
A expectativa, agora, é que o STF garanta o direito constitucional dos cidadãos de se manifestar pacificamente pela mudança ou pela manutenção da lei sobre drogas. Isso já ocorre em Marchas da Maconha como as de Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife, Buenos Aires, Berlim, Paris e muitas outras cidades. Na democracia, o convívio com opiniões divergentes é um pressuposto, mesmo que algumas delas nos desagradem. Outro regime? Só perguntando aos skinheads que, no último sábado, aplaudiram entusiasticamente a violência policial.Mauricio Fiore é antropólogo e pesquisador do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (Neip) e do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).
p.s.: e um videozinho feito pela folha sobre a marcha.
yahoo #06
CHACRINHA CONTINUA BALANÇANDO A PANÇA
Quando a loucura de um programa de auditório é domada? Quando um Chacrinha se transforma em um Faustão? No final de semana passado foi possível ter algumas respostas ao assistir os programas de dois dos maiores apresentadores da TV brasileira, o Cassino do Chacrinha e o Domingão do Faustão (e quando digo "maiores" para Fausto Silva é mais pela importância histórica do que por gosto pessoal). O do Velho Guerreiro, já em sua fase final na TV Globo (1982-88), começou a ser reprisado no Canal Viva e o do Faustão é aquele mesmo de todo santo domingo.
Cerca de 25 anos os separam, mas é muito revelador sobre o conservadorismo da nossa televisão que muito do formato de um permaneça vivo no outro, só que com o importante detalhe que aquele vovó de roupas extravagantes, e beirando os 70 anos, ainda é mais anárquico hoje em dia que o tiozão de camisetas ultraestampadas. E não adianta falar que os dois possuem a mesma rica formação radiofônica e nem que o Faustão já foi, um dia lá atrás no Perdidos na Noite, um honrado sucessor de Chacrinha. A verdade é que algo se perdeu entre as tardes de sábado e as tardes de domingo.
A impressão que tenho é que Chacrinha fazia seu programa mais para o público, qualquer que fosse ele, enquanto o Faustão pensa mais nos anunciantes. E isso, amiguinhos e amiguinhas, faz toda a diferença no calor e na diversão de um programa de auditório. Não é não, Bezerra da Silva?
Por mais que um pessoal na caixa de comentários continue acreditando que o mundo está perdido, que está faltando religião, que tudo é uma pouca vergonha, a realidade é bem outra. Existe um bom mocismo hipócrita e repressivo comendo solto por aí mais uma vez (coisas assim acontecem como ondas em resposta a outras de sentido libertário). Faustão, por exemplo, precisa elogiar seus convidados até eles corarem de vergonha, sem nunca abrir espaço para o humor, ou para a ironia. É que nada pode afastar o pessoal que coloca a grana. Já Chacrinha começou a jogar bacalhaus para a platéia para salvar o produto encalhado na Casas da Banha, um dos patrocinadores de seu programa na época da TV Tupi. Visões de marketing muito diferentes, ora pois.
Faustão jamais colocaria nomes como Soninha Toda Pura, Regina Polivalente, Bia Zé Colméia, Fátima Boa Viagem ou Elza Cobrinha nas moças de seu corpo de baile. E Chacrinha não estava nem aí e dublava marchinhas de duplo sentido rodeado pelas suas moças com maiôs purpurinados. O Velho Guerreiro era, em um certo sentido, bem parecido com as pornochanchadas da década de 1970: um pouco sacana, um pouco ingênuo, quase infantil.
Já a questão musical dos dois programas é um capítulo à parte. Claro que existe uma relação muito próxima (para não usar outro termo) com as grandes gravadoras, mas em qualquer mundo, e sob qualquer circunstância, é mais interessante assistir os Titãs mandando ver “Homem Primata” (ou então Roger, do Ultraje a Rigor, cantando “Por isso eu sempre sou terceirooo!”) do que o NX Zero chorando as pitangas por algum amor que não deu certo ou Claudia Leitte pedindo para tirar o pé do chão. Eu, como Chacrinha e Roberto Carlos, sempre vou preferir ser “o sabonete que te alisa embaixo do chuveiro”.
sexta-feira, 27 de maio de 2011
é porque eu sou negro?
e olha aqui um outro sucesso do cara, "love of the common people", nesse mesmo show de 1973.
letra/música #23
dia a dia, lado a lado
(tulipa ruiz, marcelo jeneci e gustavo ruiz)
eu sonhei que estava exatamente aqui, olhando pra você
olhando pra você exatamente aqui
'cê não sabe, mas eu tava exatamente aqui, olhando pra você
'cê não sabe, mas eu tava exatamente aqui
pronto para despertar
perto mesmo de explodir
parto para não voltar
tanto para acordar
pronto para estancar
tonto de tanto te ver
perto mesmo de explodir
prestes a saber porque
por que um raio cai?
por que o sol se vai?
se a nuvem vem também
por que você não vem?
eu sonhei que estava exatamente aqui, olhando pra você
olhando pra você exatamente aqui
'cê não sabe, mas eu tava exatamente aqui, olhando pra você
olhando pra você exatamente aqui
pronto para despertar
perto mesmo de explodir
parto para não voltar
pronto para estancar
tanto para acordar
tonto de tanto te ver
perto mesmo de explodir
prestes a saber porque
por que um raio cai?
por que o sol se vai?
se a nuvem vem também
por que você não vem?
por que? por que um raio cai?
por que o sol se vai?
se a nuvem vem também
por que você não vem?
nada haver ficar assim sonhando separado
se no fundo a gente quer o dia a dia, lado a lado
eu não vou deixar você com esse medo de se aproximar
pra ter um fim toda história um dia tem que começar
então me diz por que? por que que um raio cai?
por que que o sol se vai?
se não é pra gente perceber que um milagre assim se faz
por que o sol se vai?
é natural que seja assim
você aí e eu aqui
exatamente aqui
quarta-feira, 25 de maio de 2011
a fúria de karina
KARINA BUHR from Bateu Castelo on Vimeo
e como é bom ver/ouvir uma artista como karina acompanhada dessa banda allstar: fernando catatau e edgard scandurra (guitarras), dustan gallas (teclado), guizado (trompete), mau pregnolatto (baixo) e bruno buarque (bateria e mpc).
terça-feira, 24 de maio de 2011
naif é o caralho!
ah, e olha aqui uma animação assinada por bruno . praxedes, um espermatozóide foi seu trabalho de fim de curso na puc-rio em 2006/07 e acabou ganhando alguns prêmios em festivais.
conheci o trabalho de @brunomaron via trabalho sujo.
segunda-feira, 23 de maio de 2011
arrebatamento na paulista
olho pro outro lado da avenida, no vão do masp, e ouço batuques e gritos. atravesso a rua e a primeira manifestação que vejo é de um grupo de 20 skinheads/neonazis malucos (um pleonasmo, eu sei) cantando o hino nacional e segurando cartazes com escritos do tipo "diga não as drogas / drogas destroem famílias". duas fileiras de policiais os protegiam de, naquela hora, cerca de 500 pessoas que nem ligavam, estavam de costas, nem aí, cantando "ei polícia, maconha é uma delícia". ok, estou oficialmente na marcha.
de fora parece uma micareta hippie, de dentro também, mas o pessoal que organiza a marcha, acho que quase todos ligados ao coletivo dar (desentorpecendo a razão), é bastante sério e corajoso. o que não adiantou em nada na hora que constataram que o megafone estava de farol baixo, pilha fraca ou algo assim, e não conseguia dar conta a todos do que seria feito e de que jeito. por volta das 14h30, e já ao lado dos bróders mauricio fiore e giovanni cirino (pouco depois apareceria cristiano bromberg), comecei a ouvir os gritos de "vamos para paulista".
todos rumaram para a avenida e pararam na calçada para saber o que aconteceria em seguida. sem comunicação entre organizadores e batuque, demorou um pouco até todos perceberam que precisavam sentar para ouvir. e o batuque calou (nessa hora os neonazis aproveitaram para novas provocações, devidamente e rapidamente soterrados por gritos, xingamentos e palavras de ordem como “onha, onha, onha, plínio salgado fumava maconha”).
o que se seguiu foi um daqueles momentos mágicos, piegas para alguns. centenas e centenas de pessoas sentadas no vão do masp ouvindo e repassando em voz alta a mensagem da organização da marcha, da primeira fileira até a última, um jogral em forma de onda.
por decisão judicial, a marcha da maconha foi considerada mais uma vez ilegal em são paulo, e mais uma vez a decisão saiu no começo da noite da sexta, sem dar chance para apelação. o honorabilíssimo desembargador teodoro cerilo mendez fernandez, espanhol gente fina condenado por espancamento em campos do jordão na década de 1990, declarou que a marcha era pretexto para fumarem em público fazendo apologia da droga ilegal. claro que não atentou para o fato, coitado, que discutir um assunto não é o mesmo que cometê-lo (ou falar sobre hitler é defender o nazismo?).
e, igualzinho a marcha 2010, o que era para ser uma chamada pública para colocar a questão da maconha no debate (alternativas ao proibicionismo, cultivo caseiro, etc.) teve que se transformar em uma manifestação pela, veja só, liberdade de expressão. quer dizer, uma democracia não é bem uma democracia quando um assunto não pode ser discutido, né não? porque essa história não é uma luta para que os maconheiros possam fumar o seu em paz, é muito mais do que isso, é uma tentativa de pensar em soluções para a violência urbana, o fim do tráfico de drogas, questões de saúde pública e também, obviamente, liberdade de expressão. as leis não são imutáveis, as sociedades também não, portanto viver numa sociedade democrática requer eterno diálogo, é casamento de todos com todos pra vida toda.
enfim, consequência prática dessa ilegalidade judiciária? entre os manifestantes não poderia haver nenhuma menção a maconha, nem nos cartazes nem em camisetas, e só assim a caravana poderia seguir. houve um acordo ali na hora entre o comando da polícia estadual (na figura do capitão benedito del vecchio) e a organização, e alguns jornalistas como ricardo galhardo (ig) foram testemunhas (video aqui). não haveria nenhuma menção visual a “erva maldita”, mas não teria como evitar palavras de ordem e coisa e tal. tudo certo e marcha seguiria por uma faixa pela paulista no sentido da avenida consolação até o centro da cidade. o relógio girava ali pelas 15h. pé na avenida, sol forte e bonito na cara.
achei estranho não ter nenhum policial nas laterais da marcha, mas tudo bem, melhor assim. outros também acharam e começaram a acender baseados. chegamos a convencer um grupo de jovens restarts a apagar o seu porque poderia ser pretexto para a polícia entrar. poucos passos na frente outros foram acesos e já não deu para controlar. foram também uma parca minoria e tenho certeza que isso não foi, e nem poderia ou deveria, ser motivo para o que aconteceu em seguida. certo mesmo é que depois de apenas dois quarteirões o comando da polícia militar do estado de são paulo decidiu que não queriam mais honrar o acordo e que, naquele momento, aquelas mil pessoas deveriam desobstruir a avenida por mal ou por mal.
estava na rabeira da marcha e vi quando começou. não houve provocação de nenhum tipo. houve apenas a decisão unilateral de acabar com aquilo do pior jeito possível. uma “bomba de efeito moral” estourou e a surpresa foi geral. como assim? jura? antes da próxima bomba explodir uma cena insólita e muito reveladora acontece: os neonazis aplaudem a brutalidade da polícia. não corro, fico meio em estado de choque, acreditando que foi só um “efeito moral”. mas novas bombas estouraram no cruzamento com a augusta junto com o bom e velho gás lacrimogêneo. logo depois foi a hora das balas de borracha, sempre na altura do peito ou do rosto, mas principalmente nas costas. e a confusão começou assim, democraticamente, com a polícia atirando pelas costas (nas costas!) de uma manifestação popular e pacífica.
não tô acreditando nisso! não deveria ser surpresa, claro, principalmente em se tratando de uma polícia que anualmente bate em professores, espanca estudantes, etc. só que ali, perplexo e no meio da ação, eu não conseguia acreditar que aquilo estava acontecendo. era tudo muito gratuito. então, no cruzamento com a rua haddock lobo, próximo a igreja são luis, uma nova leva de bombas e gás fez com que eu me perdesse do mauricio, do giovanni e do cris (e o estilhaço de uma delas me acertou no peito, perto do pescoço, e soube depois que o giovanni também foi atingido). o choque estava apertando o passo, quase correndo, e chegando mais perto da marcha que, a essa altura, já tinha virado na consolação.
pouco antes dessas bombas estourarem vi um casal de adolescentes, estudantes do colégio são luis, na esquina da haddock lobo com a paulista. ela olhava meio fascinada para a tropa que avançava. não era admiração, era algo como “nossa, que real”. passei correndo por eles e segundos depois... estouros, ondas de choque se espalhando pelo ar, bem entre a gente. não vi mais nada depois. não sei se a realidade atingiu aquela moça como um meteoro, mas fiquei sabendo que muita gente que não tinha relação com nenhum dos lados da história recebeu sua dose de gás, susto e grosseria (motoristas parados, pedestres, famílias, crianças, fotojornalistas sempre no fogo cruzado, etc.)
nessas também perdi a marcha. a polícia me ultrapassou no pique e rumou para o centro, pela consolação, atirando sempre, de tempos em tempos, aboiando a multidão para dispersá-la. pedro alexandre sanches cruzou o caminho com a marcha, agora marcha atlética, no começo da consolação e escreveu seu relato no texto “augusta, angélica e consolação”. e eu reencontrei mauricio ali pelo falecido cinema belas artes. continuamos descendo, junto com muitas outras pessoas que também ficaram para trás, para ver se alcançávamos o que sobrou daquela tarde.
tudo parecia mais rápido e ao longe a tropa seguia atirando, todos correndo. meio sem fôlego, boca seca, olhos ardendo, ficamos tentando entender o que podia ter dado errado, mas na maioria das vezes só falamos mesmo do quão canalha pode ser uma polícia como a de são paulo e o estado que permite que esse tipo de coisa aconteça. bruno torturra, da revista trip, que esteve na marcha de cabo a rabo e escreveu seu relato em “não somos conduzidos, conduzimos”, deu uma dica para esse clima repressivo na cidade: 25 das 31 subprefeituras são comandadas por coronéis da reserva (texto aqui do deputado estadual adriano diogo). ah, mas a polícia militar é do estado! pois é, mas a guarda civil metropolitana entrou na bagunça, como veremos adiante.
na altura do cemitério da consolação uma correria do nada fez com que eu me perdesse novamente do mauricio. alguns policiais estavam de moto empurrando, com a própria máquina e singelos chutões, os manifestantes para a calçada. dei uma corrida para ver se alcançava alguma coisa, mas acabei atravessando a avenida para comprar uma água no posto de gasolina. desanimado, perdido, com o peito ardendo e um pouco de sangue sujando a gola da camiseta, pensei se talvez não fosse hora de voltar para a casa. derrotado. como em 2010, só que pior.
não. vamos lá. desço agora pelo canteiro central da consolação e testemunho um outro motoqueiro policial chutando as pessoas para a calçada. pouco depois reencontro mauricio pela segunda vez. nada de giovanni e nem cris. chegamos a praça roosevelt toda cercada de tapumes e nem um sinal da manifestação, mas dezenas de motos, carros e soldados da polícia (alguns felizes, eufóricos mesmo), inclusive o tal motoqueiro chutador que acertou uns jornalistas e, para eles, deu a desculpa que estava sem freio.
para onde todos foram? a dispersão deu tão certo assim? passamos pela biblioteca mário de andrade e chegamos na praça ramos, no teatro municipal. nada. nem sinal. não dava mais, cansado e frustrado decidi ir embora. mauricio também, ia resgatar o carro que tinha ficado no metrô vila madalena e do futuro imediato não sabia (um colega seu pesquisador, henrique carneiro, foi machucado na cabeça e ele conhecia vários dos organizadores da marcha, sendo que alguns tinham sido presos por distribuir o anti-proibicionista). o ônibus subiu a consolação e não era possível ver nenhum vestígio do que tinha acontecido por ali uma hora antes. a higienização repressiva comandada pela prefeitura e o estado de são paulo funciona como uma máquina bem azeitada. a rua pode estar um lixo, os pontos de ônibus em frangalhos, o asfalto cheio de buracos, o metrô insuficiente, não importa, o que interessa mesmo é que manifestações não existam ou não atrapalhem o trânsito do contribuinte (não somos todos?).
pra mim, por volta das 17h, tudo parecia perdido. “eles” conseguiram, mais uma vez. quando cheguei em casa descobri que o núcleo principal da marcha não tinha se dispersado, deu a volta no centro e subiu pela rua augusta rumo a delegacia de polícia nos jardins para onde tinham sido levados alguns detidos. aí a coisa ficou mais feia porque todos estavam mais próximos e a polícia militar decidiu usar cassetetes, chutes e spray de pimenta (e, o melhor, dando ordens para a guarda civil metropolitana ajudar na selvageria). o vídeo abaixo, feito pelo pessoal da folha, é o que melhor mostra o grau de selvageria gratuita da polícia do psdb. aliás, um parênteses para você que acha que é falta de maturidade política (ou coisa de petista) falar de psdb/dem/psd/tucanos numa hora dessas: você está redondamente enganado! só partidos isolacionistas e sabidamente arrogantes como o psdb - na mesma hora da bagunça na paulista, josé serra, em seu mundo parelo e bonito, puxava pra si a sardinha da beatificação da irmã dulce, veja só -, e que sofrem daquelas eternas dificuldades de diálogo com a sociedade civil e movimentos sociais, poderiam estimular e acobertar violências assim.
o pessoal que tomou porrada na rua augusta conseguiu chegar na delegacia de polícia dos jardins e, consequentemente, fechar a rua estados unidos. lá foram recebidos por policiais sem identificação, tática comum na ditadura, pois não? e por lá todos ficaram até que os detidos fossem liberados (foram recebidos por um coro de “maladragem dá um tempo”, e é importante que o bom humor sobreviva). pois é, anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar. não foi bem um apocalipse o que aconteceu em são paulo no sábado, 21 de maio. ninguém foi arrebatado. pelo menos não rumo ao juízo final.
acredito que quem esteve lá e não pode se manifestar ficou com um travo amargo na boca, uma vontade de ir à forra – tanto que foi marcado para o próximo sábado (dia 28, no mesmo masp, 14h) uma manifestação contra a violência policial. e quem não foi viu, ou deveria perceber logo, que seu cômodo baseadinho ilegal fumado em casa é assunto muito mais importante que as voltas do universo umbigo. é preciso discutir, é preciso tomar a rua (as marchas aconteceram muito bem em porto alegre, recife e rio de janeiro), porque fim do mundo mesmo é essa violenta falta de maturidade de nossas instituições – os cidadãos podem ser imaturos, como muitos de fato são, mas o estado e o judiciário não podem continuar cegos a demandas democráticas e legítimas da sociedade civil.
p.s.: fora os textos linkados no decorrer do relato, vale destacar ainda os ótimos trabalhos de camilo rocha, fausto salvadori e leonardo sakamoto, bem como análises sobre a proibição da marcha escrita por walter hupsel e sobre a violência policial assinada por paula miraglia.
domingo, 22 de maio de 2011
domingueira
filmado em londres, no bairro de shoreditch, o video foi dirigido pela inglesa sam taylor-wood e é estrelado com galhardia por aaron johnson (kick-ass). os dois se conheceram nas filmagens de o garoto de liverpool (2009, estreia dela na direção de longas), casaram e tiveram uma filha em julho do ano passado.
quarta-feira, 18 de maio de 2011
joão do morro, ano 2011
João do Morro - Tu me Fudeu by dafnesampaio4
essa música te lembrou alguma coisa? é isso mesmo. "tu me fudeu" é uma versão livre de "beautiful girls", de sean kingston, umas das músicas mais tocadas no mundo em 2007.
João do Morro - Tapa na Bundinha by dafnesampaio4
"tapa na bundinha" é aquela esculhambação típica do joão. e, por favor, não levem tão a sério o sexismo do rapaz, ele é apenas um brincalhão (e declara no meio da música que "vocês sabem que eu sou escroto ao extremo"). destaque para o impagável momento da "linguada marroquina".
João do Morro - Qualquer Lugar Rola Pei Pei by dafnesampaio4
sem sombra de dúvida a melhor faixa desse ao vivo. épica, urbana e profundamente latina, "qualquer lugar rola pei pei" traz ainda apresentação dos músicos com solos e tudo o mais (seria legal ter uma versão dela editada sem essa parte). como se não bastassem todas essas novidades, joão do morro é o personagem principal de do morro?, um curta documental que passou em alguns festivais no ano passado e deve chegar na rede a qualquer momento. olha só o cartaz.
e aqui o trailer.
ah, esse ao vivo também gerou o clipe da música "ninguém merece" (uma música menor, levando em conta a concorrência no disco). o video é divertido e é interessante ver que é uma parceria com uma loja de calçados (não deixa de ser, portanto, um jingle, um neo-jingle).
terça-feira, 17 de maio de 2011
segunda-feira, 16 de maio de 2011
mercedes sosa, século XXI
Mercedes Sosa - Guitarra Dimelo Tu (El Remolon Remix) by zzkrecords
e para quem não conhece o poder interpretativo/vocal de "la negra", segue um video com a versão original da música.
e como o video acima acaba com mercedes anunciando "duerme negrito" resolvi colocá-la. taí uma música que tocava muito na casa dos meus pais, anos 1980, aquela coisa hippie-sulamericana-engajada. trabajando si, trabajando duramente...
a realidade é uma só
Marcas da Realidade from Obede Jr. on Vimeo
via @glaubermacario.
domingo, 15 de maio de 2011
domingueira analógica
esse besta que te adora
os videos foram postados no decorrer da segunda quinzena de agosto daquele ano e até criaram um blog veloso poeta - belém do pará, mais ou menos na mesma época, mas a empreitada não vingou. é isso que sei até o momento. mas basta dar um play aí em qualquer um desses cinco videos/músicas, clicar na opção 'legendas' que fica na barra inferior de cada video, pra ver que diversão assim não tem preço mesmo e que música também serve pra isso. ah, as músicas se chamam, na ordem que aparecem, "o amélio de verdade" (ou "amô bem dizido"), "a tacacazeira", "rainha do bengui", "ervira" e "degradação moral". atenção: existem muitos detalhes impagáveis, tanto nas imagens quanto nos áudios, portanto fique atento.
e a melhor de todas.
degradação moral
(veloso dias)
eu era apenas um pobre biriteiro
não tinha conhecido a tonha
agora além de biriteiro eu passei a fumar
maconha
conheci um macumbeiro que me ensinou um trabalho
e eu fiz esse trabalho para a vida melhorar
agora além de biriteiro, maconheiro e macumbeiro
eu dei para roubar
conheci uma bicha chamada my baby
e por causa dos meus vícios só vive em minha cola
agora a galera da pedreira
tá pensando que eu também sou boiola
pra completar essa situação tão crítica
eu vou falar com o duciomar
eu vou entrar para a política
atualização em maio de 2012: e não é que veloso dias chegou ao grande público via gaby amarantos? é de sua autoria "ex my love", que é a música da abertura da novela cheias de charme e está no disco treme da cantora paraense.
sábado, 14 de maio de 2011
yahoo #05
A PELEJA DO FORRÓ JUNINO
Forró é para todo mundo, certo? É música de todo dia para alguns, diversão para muitos e ganha pão de outros tantos. E não é exclusividade do Nordeste, afinal tem nordestino em tudo que é canto do mundo (é de Nova York, por exemplo, o excelente grupo Forró in the Dark). Mas durante o agitado período das festas juninas, o forró vira assunto sério na região, coisa de riscar a faca no chão mesmo. Tanto é verdade que nesse ano o gênero se viu em meio a uma polêmica que começou na Paraíba e se alastrou, por meio das redes sociais, Brasil afora. É que o secretário de cultura do Estado, o músico Chico César, declarou que o governo não pagará por grupos e artistas que “nada têm a ver com a herança da tradição musical nordestina”. Não foram citados nomes – o artista Chico César não cometeria essa indelicadeza com a classe -, mas bastou defini-los como “bandas de forró de plástico e grupos sertanejos” para o arraial pegar fogo.
Ficou uma coisa assim: forró pé-de-serra X forró eletrônico ou então arrasta pé X forró universitário, folclórico X comercial e assim por diante, com direito a presença do sertanejo-estranho-no-ninho bagunçando tudo. Teve gente incomodada com o Estado – esse bicho mau, sufocante e intrometido – escolhendo o que toca e o que não toca no “Maior São João do Mundo” em Campina Grande. Em entrevista ao jornal cearense O Povo, o músico Dorgival Dantas (do hit “Você Não Vale Nada”) declarou que a atitude do colega paraibano era “safadeza, falta de atitude, covardia e besteira”. Mas teve mais gente que soltou rojão a louvar essa defesa da música de raiz, incluindo o próprio governador da Paraíba e Waldonys, o sanfoneiro herdeiro da tradição de Luiz Gonzaga e Dominguinhos.
Acho interessante e corajosa a postura de Chico César de enfrentar pressões comerciais para ter uma festa “autenticamente nordestina”. Em nota oficial, o músico-secretário – cujo último disco lançado, Francisco, Forró y Frevo (2008), foi justamente uma visão nada ortodoxa de suas raízes – defendeu-se das críticas que distorciam sua declaração. Segundo ele, não existe nenhuma proibição por parte do governo de tocar artista X ou música Y, só que o erário público não pagará por isso. Quem quiser que pague. Afinal, as tais “bandas de plástico” e os sertanejos já tocam o ano todo, sem parar, nas rádios (que são concessão pública, sempre é bom lembrar). É muita vitrine! E ainda querem tomar a festa que se tornou o último refúgio de artistas populares/folclóricos como Baixinho do Pandeiro, Cátia de França, Zabé da Loca, Escurinho, Livardo Alves e Pinto do Acordeon.
Mas não seria possível fazer uma ponte entre a tradição e a contemporaneidade, entre o popular e o pop? E misturar tudo nessa grande festa? Porque por melhor que a cultuada e tradicionalíssima Zabé da Loca seja (e é), sua música e sua poesia não dialogam tão facilmente com gerações mais novas. Outro tempo, outra velocidade, outro pique. Então não seria o caso de ter um Aviões do Forró ali no meio do furdunço chamando um público que de outra forma não conheceria Zabé, Pinto do Acordeon, etc.? A cultura popular é dinâmica e o que é “autenticamente nordestino” hoje não é o mesmo de 30 anos atrás, e a política do junto & misturado talvez seja a melhor saída para todos os forrós que existem.
sexta-feira, 13 de maio de 2011
tom zé por vincent moon
collection petites planètes • volume 1 • TOM ZÉ from Vincent Moon / Petites Planètes on Vimeo
collection petites planètes • outtake • TOM ZÉ from Vincent Moon / Petites Planètes on Vimeo
e esses videos também dão início a petites planètes, uma nova série assim definida: "a subjective collection of recordings from the worlds. sonic, visual, cultural. a nomadic label, made on the road by vincent moon and friends".
terça-feira, 10 de maio de 2011
capitão nascimento reloaded
ELITE DO CINEMA
Um dos participantes da última edição do Big Brother Brasil mal colocou os pés na casa e já saiu batendo no peito e gritando que era “faca na caveira”. No bar um amigo fala para o outro: “você é um fanfarrão!”, repetidas vezes. De repente, passando por um ponto de táxi, é possível ouvir um “pede pra sair” ou então “se quer me foder, me beija”. Coisas assim tem acontecido, em qualquer lugar do Brasil, desde 2007, ano da estréia nos cinemas de Tropa de Elite, de José Padilha. Agora, com a chegada de Tropa de Elite 2 – O Inimigo Agora é Outro à TV pó assinatura, um ciclo se fecha. Mas o Brasil nunca mais será o mesmo após conhecer a face atormentada de Roberto Nascimento, o Capitão Nascimento. Muito menos as pessoas envolvidas na produção de ambos os filmes.
PADILHA, por exemplo. Em menos de dez anos transformou-se no diretor mais quente do cinema brasileiro, ultrapassando os colegas Walter Salles e Fernando Meirelles. Ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berlim pelo primeiro Tropa, com Tropa 2 quebrou um tabu de mais de três décadas o transformando no filme brasileiro mais visto de todos os tempos, e agora se prepara para dirigir um episódio da produção internacional Rio, Eu Te Amo, enquanto não assina o contrato para a refilmagem de RoboCop. Mas o que fez um cineasta e produtor de documentários de prestígio e de público restrito conseguir tocar tão fundo no imaginário popular brasileiro?
“Acho que em Tropa de Elite 1 e 2 aconteceu um fenômeno de sobreposição, uma soma de dois efeitos: a emoção da dramaturgia dos filmes se somou as emoções que o público já sentia a respeito dos traficantes, do policiais e dos políticos nele representados. Na minha opinião, foi isso que fez com que os filmes se tornassem populares”, explicou Padilha por e-mail. Se o primeiro Tropa pegou a todos de surpresa com um relato cru do cotidiano de guerra urbana no Rio de Janeiro, e sob inédito ponto de vista do policial, o Tropa 2 deixou claro que o conflito nas favelas e o narcotráfico são apenas pálidos reflexos de uma guerra muito maior por poder e dinheiro envolvendo o crime organizado, políticos e policiais corruptos (reunidos em milícias). E isso acontece conforme o espectador acompanha Nascimento saindo das ruas para ganhar os gabinetes na função de Subsecretário de Inteligência da Secretaria Estadual de Segurança Pública do Rio de Janeiro.
Essa percepção mais aguçada sobre a realidade brasileira também pegou o ator André Ramiro, outro membro da equipe que teve sua vida mudada em muito pouco tempo. Rapper e ex-porteiro de cinema, Ramiro teve sua primeira experiência como ator ao interpretar Matias, que volta em Tropa 2, cada vez mais parecido com o Capitão Nascimento do primeiro Tropa, mas sem a mesma experiência. “Minha vida mudou no sentido de que agora realmente tiro o meu sustento daquilo que eu sempre quis viver: da arte. Poder respirar, fazer, estudar arte e ter a oportunidade de conhecer coisas que eu não conhecia”, diz Ramiro, e aproveita para anunciar que seu disco de estréia, Crônicas de um Rimador, sai este ano e traz participações de Gabriel o Pensador e Dudu Nobre.
Mas houveram outras reviravoltas em sua vida. “O que mudou na verdade foi a minha visão do ser humano por debaixo da farda. Não exatamente a instituição. Tem uma frase em inglês que acho muito bacana, acho pertinente para esse momento, que é ‘Don’t hate the players. Hate the game’. Eu não odeio os jogadores, só não concordo com o jogo.” E ainda refletindo a experiência dos dois filmes completa que “na maneira que me envolvi com esse projeto fica difícil não perceber que na verdade irmão está matando irmão. É o policial que não é bem remunerado e o traficante que nem sempre está na vida que escolheu. Ou seja, quem é a vítima? O policial é tão vítima quanto o traficante e vice-versa.”
PAULO STORANI é outro personagem importante nessa saga e representando o lado fardado da história. Ex-integrante do BOPE, o carioca foi responsável pelos treinamentos dos atores e chegou a ter o nariz quebrado por Wagner Moura durante os ensaios do primeiro Tropa. Também vieram dele algumas das gírias mais conhecidas dos filmes. “Daqui a dez anos, pesquisadores irão mostrar o que o filme representou para o esclarecimento e mobilização das pessoas em torno da segurança pública. A cortina caiu. Nenhum carioca poderá dizer que não sabia do que ocorreu e que ocorre no Rio, e que não é diferente de qualquer lugar do Brasil.”
Orgulhoso de sua participação e do resultado cinematográfico, Storani fez questão de frisar durante a entrevista os princípios que nortearam o treinamento de seus pupilos: mudança constante de cenário, adaptação e superação. “Sabia que Tropa suscitaria discussões profundas, principalmente por concorrerem contra um histórico de filmes nacionais que quando tratam de temas relacionados com a segurança pública, contam a história de bandidos que passam a heróis, despossuídos que não tem outra opção senão roubar, traficar e matar. Os dois Tropa de Elite foram fiéis à realidade e imparciais, mostrando de uma forma inédita os dramas que envolvem as pessoas que trabalham na segurança pública, pessoas honradas e desonradas, mas acima de tudo o BOPE saiu fortalecido. Os heróis saíram do anonimato e passaram a ter seu trabalho reconhecido, além do batalhão ter sido humanizado.”
Só que existe uma armadilha aí nessa atual relação de boa vizinhança entre policiais e civis, e quem aponta é Luiz Eduardo Soares, escritor, cientista social e ex-Secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro. “Se o BOPE persistir por uma unidade violenta, tentando surfar na onda do primeiro filme, vai pagar um preço altíssimo também pela sua própria imagem, porque ficou muito claro no segundo filme que a violência policial não é uma solução, e sim parte de um problema.” Co-autor de Elite da Tropa (Objetiva) e Elite da Tropa 2 (Nova Fronteira), os livros que serviram de pontapé inicial para os roteiros, Soares aproveita para costurar uma descrição muito afiada do Capitão Nascimento, personagem ficcional próximo de tantas pessoas de carne e osso. “A intenção era apresentar ali um anti-herói, uma pessoa atormentada, capaz de tortura, assassinato, desesperada e sem rumo, que acabava contribuindo para a reprodução do ciclo da violência, mesmo sendo uma pessoa com muitos valores positivos, muitas virtudes também, a simplicidade, a vontade de acertar, o compromisso de cumprir um papel positivo na sua área de atuação.” Portanto, quem o viu como herói, como uma resposta armada para as mazelas sociais brasileiras, precisa urgentemente rever seu conceito de heroísmo.
Em meio a esse fogo cruzado, Padilha também foi muitas vezes vítima, mas as acusações de glorificar um personagem violento e controverso já foram superadas. “Não fiz o filme para responder a crítica, fiz o filme para completar a exposição que iniciei em Onibus 174 e Tropa de Elite, e para mostrar a relação direta que existe entre a corrupção na política e os problemas da segurança pública que abordei nos filmes anteriores”, afirmou Padilha que, entre um Tropa e outro, dirigiu dois documentários, Garapa (sobre a fome no Nordeste) e Segredos da Tribo (que trata da relação conflituosa entre antropólogos e os índios ianomâmi).
MAS SERÁ QUE todo esse fuzuê ao redor dos filmes foi além das piadinhas de bar? Será que o Capitão Nascimento inspirou uma nova geração de guardiões da lei? Rodrigo, 29 anos, soldado da Polícia Militar do Estado de São Paulo a cinco anos, acha que não: “A maioria das pessoas ainda entra na polícia pela dificuldade de encontrar emprego”, o que não foi seu caso, pois sempre desejou ser policial. Já Thiago Marques Guilherme, 23 anos, está estudando para o concurso da polícia civil e disse que assistir os filmes lhe “deu mais vontade de entrar para tentar fazer alguma coisa, mas não que eu vá ser um capitão Nascimento, né?”
E os filmes retrataram a corporação fielmente? Ambos acreditam que sim. “Tenho um amigo policial que me contou que na polícia tem muita coisa mostrada no filme que realmente acontece. É uma questão de se mostrar e não omitir”, disse Thiago, enquanto Rodrigo vai um pouco mais fundo ao afirmar que os filmes são “um tapa na cara de muito oficial, de muito político e muito governante aqui do Brasil. Sei que o filme se passa no Rio de Janeiro, mas serve para a realidade de qualquer polícia do Brasil. Infelizmente não teve a repercussão que deveria ter tido para poder acontecer alguma mudança. Tem muita coisa envolvida nisso, até dinheiro. Acho que, por exemplo, partes da polícia de São Paulo vivem ainda muito à sombra da ditadura, assim como muitos governantes e políticos.”
OUTRO PERSONAGEM REAL e importantíssimo para Tropa de Elite 2 é justamente um político. Em seu segundo mandato, o deputado estadual Marcelo Freixo serviu como base para o roteirista Bráulio Mantovani criar Diogo Fraga (Irandhir Santos), um professor de História que se torna político após trabalhar em uma ONG cujo tema principal é a defesa dos direitos humanos. Na vida real, Freixo foi presidente da crucial CPI das Milícias que, em 2008, jogou no colo dos cariocas/brasileiros o envolvimento de alguns de seus colegas de Assembléia Legislativa em assassinatos, extorsões e outras tantas infrações do Código Penal. Até hoje é ameaçado de morte por isso.
Fã dos filmes, e sem nenhum envolvimento com as produções, Freixo viu sua luta (e a de muitos outros e outras) ganhar altas injeções de adrenalina na segunda parte da jornada de Roberto Nascimento. E gostou, confessa. “O Tropa 2 dá mais complexidade ao assunto de segurança, ele mostra com mais clareza esse problema que o crime organizado não está nos lugares pobres, nem no Rio e nem em nenhum lugar do mundo. Ele consegue demonstrar que essa criminalidade é movida através de interesses políticos, ou seja, existe uma polícia corrupta porque a gente tem uma política corrupta, uma elite política corrupta que se alimenta dessa relação violenta com a periferia dos lugares pobres porque tem uma relação direta com esses criminosos.”
Claro que não seria um filme (ou dois) que mudaria esse amontoado de desigualdades, impunidades e desmandos. E nem adianta pensar em um terceiro com Nascimento partindo para Brasília de Caveirão. Luiz Eduardo Soares pode explicar melhor: “Assunto [para um terceiro filme] não falta. Mas até onde sei, como amigo e colega de trabalho, o José Padilha não considera essa hipótese. É o mesmo que ouço do Wagner [Moura] que diz que o trabalho que tinha que ser feito já foi feito. Da minha parte já estou completamente convencido que não faz sentido produzir uma terceira unidade dessa série pois há um risco muito grande da repetição e, tanto na literatura quanto no cinema, temos muito medo do clichê.”
Sobre Wagner Moura assinamos embaixo. Na tentativa de entrevistá-lo recebemos a seguinte resposta de seu assessor: “O Wagner está num outro momento agora!” Quem é caveira, sabe.
ó meu encanto
via @bferrari.
sábado, 7 de maio de 2011
metrópolis, reino (quase) perdido
CLÁSSICO EM OBRAS
Pense em um filme clássico! Pronto. Certeza que a história de sua produção é quase tão interessante e rica quanto seu resultado. Pode ser o caos e a loucura que assombraram Apocalypse Now (1979); ou a brincadeira exibicionista de um homem muito seguro de si em Cidadão Kane (1941); ou ainda a megalomania romântica durante E o Vento Levou (1939). Mas nada chega aos pés do que aconteceu antes, durante e depois de Metrópolis, a ficção científica dirigida por Fritz Lang que influenciou todo o século 20, de Hitler a Madonna, mas que poucas vezes foi vista, no esplendor de seus 153 minutos e com orquestra ao vivo, como nos primeiros meses do ano de 1927, em Berlim.
Cortadas, retalhadas, com velocidade de exibição alterada, as cópias do filme foram saindo da Alemanha para nunca mais serem as mesmas. Até que em 2008, uma versão com cerca de 20 minutos nunca antes vistos, desde aquela estréia, foi encontrada em Buenos Aires, Argentina. Toda essa história e a descoberta histórica é contada, em mínimos detalhes, no documentário Metrópolis Refundada. Mas esse é o final feliz de uma história que poderia ter acabado muito mal, como tantas outras dentro desse território, às vezes tão negligenciado, que é a preservação da memória. olha o trailer.
No caso específico de Metrópolis o descaso vem desde a época de seu lançamento. Extremamente caro, visualmente ousado, o filme naufragou nas bilheterias alemãs e quase levou os estúdios UFA à bancarrota. Para arrecadar algum dinheiro extra, a produção foi vendida a Paramount, para distribuição nos Estados Unidos e resto do mundo, e aí o massacre começou. Quase uma hora do filme foi parar no chão da sala de edição, truncando totalmente a história original escrita por Fritz Lang e sua mulher Thea von Harbou (e em uma daquelas ironias do destino, os Estados Unidos mutilaram um filme que começou a ser pensado por Lang justamente após uma visita a Nova York em 1924).
O que era sombrio na trama futurista sobre uma sociedade industrial, no qual ricos frívolos oprimiam pobres automatizados, com direito a um cientista maluco e sua grande obra, uma a robô mulher criada para tomar o lugar de uma “líder revolucionária”, acabou se tornando ingênuo ao focar no amor de um casal (ele, da alta; ela, proletária) servindo como pacificador dessa luta de classes. Posteriormente, Hitler anunciou aos quatro ventos que Lang era o cineasta alemão/ariano por excelência e Metrópolis um de seus trabalhos preferidos, o que apenas contribuiu para o diretor renegar ainda mais o filme e fugir da Alemanha em 1933 (sua mulher acabou ficando e se filiando aos nazistas). Lang filmou outros quatro longas no país nesse meio tempo, incluindo o igualmente clássico M – O Vampiro de Dusseldorf (1931) e O Testamento de Dr. Mabuse (1933), uma alegoria crítica ao nazifacismo, para então se exilar em Hollywood até sua morte em 1976.
“Não se pode fazer um filme com preocupações sociais em que se diga que o intermediário entre a mão e o cérebro é o coração. Isso é um conto de fadas. (...) Deveria dizer que gosto de Metrópolis só porque algo que vi na minha imaginação se tornou realidade, mesmo tendo detestado o filme quando o terminei?”, disse um rígido Lang em 1971 numa conversa com Peter Bogdanovich (entrevista essa que presente no livro Afinal, Quem Faz os Filmes?).
E o filme ficou assim, capenga de sentido, mas sempre exuberante visualmente, até que cópias encontradas em cineclubes ao redor do mundo foram reunidas, restauradas, e deram em uma edição com pouco mais de 2 horas que foi exibida com grande pompa em 2001. Todos estavam felizes e ninguém imaginava que outros 20 minutos estavam vendo o tempo passar nas prateleiras do Cineclube de Buenos Aires. O frisson dessa descoberta, com direito a exibições a cinéfilos que não sabiam da existência desses trechos, está em Metrópolis Refundada (estas novas cópias, acompanhadas da trilha original de Gottfried Huppertz, foram exibidas no mundo todo em 2010, incluindo Rio de Janeiro e São Paulo). Segundo especialistas, atualmente apenas 5 minutos do filme são considerados perdidos, o que não é nada perto do fato de que Metrópolis está muito mais vivo.
p.s.: tão vivo está que é fácil achar imagens do filme misturadas com músicas das mais diversas. separei aqui dois "mashups". o primeiro com a música "time lapse", que o grande michael nyman fez para zoo - um z e dois zeros (1985, peter greenaway) e foi reutilizada no documentário o equilibrista (2008, james marsh). ficou dramático.
a outra é com os igualmente alemães do kraftwerk e ficou mais pop.
quinta-feira, 5 de maio de 2011
segunda-feira, 2 de maio de 2011
a saga de leona, a assassina vingativa
voltando a leona vingativa. na parte 1 somos apresentados aos dois protagonistas, leona e aleijada hipócrita, e ao principal cenário, um quarto. dá para entender também que leona (interpretada por leandro olin, que na época tinha 11 anos) quer subir na vida doa a quem doer. destaque para a fita que não queima, a presença estranha ali no canto da cama, os risos presos, o diálogo tenso e o chute que a aleijada dá em leona, com direito a um pedacinho da bunda, depois de tomar vários tabefes ("eu já disse que tenho o movimento da perna!"). sem falar no final-marca-registrada: "pode cortar!"
já a parte 2 é um épico tipo o poderoso chefão 2. entram novos personagens, tais como o comparsa geraldo (por isso, o alckmin na abertura acima), a empregada nordestina da aleijada hipócrita, a escrivã e, acima de tudo, a corrupta delegada dafne (ou dafiny, enfim, eu mereço). e tome pancadaria, enquadramentos malucos e frases memoráveis de leona ("prepare o táxi que eu tô indo pra paris agora!"), da delegada ("olha o rímel heim?! se tu manchar meu olho, eu te prendo sua vagabunda") e da aleijada ("você vai me matar de novo?"). destaque para um momento mágico aos 5m50 com leona surgindo na delegacia ao som do tema da saga (que música é essa?).
finalmente, a parte 3, um desfecho violento em meio a um terreiro de macumba. gosto principalmente quando soltam o "tema de leona" ao vivo durante a filmagem da sequência, a arma-secador, e a frase "diz que ela é negra e é preta" (que é como a mãe de santo descreve a pessoa que cagueta leona). e no fim, leona e a delegada fogem para paris. pois é, o crime (talvez) compense.
e então, leona partiu para sua amada paris. mas voltou ao brasil, e ao bairro de jurunas, agora no início do ano, dois anos depois do início de suas maquiavélicas aventuras. no video abaixo ela dá seu nome completo após o casamento com um figurão europeu e vai mais além: "poderosíssima como a espada de uma samurai. eu sou apertada como uma bacia. eu sou enxuta como uma melancia. tenho dois filhosinho, um zolhudinho, outro barrigudinho. casei com o dono da parmalat. virei mamífera. só mamo. pertenço a família imperial brasileira orleans bragança. penetração difícil."
o mais interessante desses videos, fora o humor trash, é a alegria dessa brincadeira de amigos e a tranquilidade libertária da sexualidade de todos os envolvidos (por isso acho que podem ser considerados como netos ou bisnetos dos dzi croquettes).
p.s. 1: e como faixa bônus, cenas deletadas da parte 2.
p.s. 2: égua! tem essa entrevista divertidíssima com leona, cheia de detalhes sobre os bastidores da saga.