blank on blank é uma série de documentários curtos, quase todos em animação, a partir de entrevistas perdidas. simplesmente uma puta ideia genial que conheci através do tumblr da npr music. o video mais recente é uma conversa com james brown, em 1984, na qual "o poderoso chefão do soul" fala de raça, de como o pai pagou para ser ignorante, de estilo e religião, e ainda elogia ronald reagan. saca só.
e a série, que tem cerca de um ano de vida, trouxe ainda muhammad ali, beastie boys, dave brubeck, david foster wallace, jim morrison, bono, kelly slater, larry king e wilt chamberlain.
terça-feira, 28 de maio de 2013
mexidão #10 e #12
AH, QUE É ISSO? A FIFA ESTÁ DESCONTROLADA
Tem algo de muito errado no mundo quando um sujeito solta,
tranquilão, a seguinte frase: “Vou dizer algo que é maluco, mas menos
democracia às vezes é melhor para se organizar uma Copa do Mundo. Quando você
tem um chefe de estado forte, que pode decidir, assim como Putin poderá ser em
2018, é mais fácil para nós organizadores do que um país como a Alemanha, onde
você precisa negociar em diferentes níveis”. O tal sujeito é Jérôme Valcke,
secretário-geral da Fifa, e essa asneira foi dita durante
um simpósio ontem, 24 de abril, em Zurique, sede da organização que
organiza a Copa do Mundo.
Lida sobre outro prisma, a asneira de Valcke é um elogio ao
Brasil. Durante o mesmo evento ele falou sobre o país nos seguintes termos: “A
principal dificuldade que temos é quando entramos em um país onde a estrutura
política é dividida, como no Brasil, em três níveis: federal, estadual e
municipal. São pessoas diferentes, movimentos diferentes, interesses diferentes
e é difícil organizar uma Copa nessas condições”. Pois é, meu caro francês
maluco, democracias são assim, um acordo entre diferentes, e é bom que assim
sejam.
Mas pelo jeito, o pessoal da Fifa não está se contentando
apenas com elogios a países ou líderes autoritários, eles querem mesmo se
tornar um. É que hoje apareceu uma notícia tão absurda no site do jornal Tribuna
da Bahia que por algum tempo achei que fosse uma piada do satírico Piauí Herald. A
manchete grita que a “Fifa proíbe São João em Salvador”. Acuma? Isso mesmo,
segundo a reportagem a prefeitura da cidade recebeu ordens da Fifa para não
liberar alvarás para festas de rua durante o mês de junho deste ano, época que
Salvador será uma das sedes da Copa das Confederações. E antes tinham tentado
impedir (sem sucesso, felizmente) a venda de acarajé no entorno do estádio para
não ferir os sentimentos do McDonald’s.
Nunca fui do time anti-Copa. Claro que o Brasil está pronto
(ou está ficando) e um evento como a Copa injeta muito dinheiro na economia do
país, mesmo que, como sempre, seja mal distribuído ou desviado. Porém, desde a
violência que aconteceu na Aldeia
Maracanã, no Rio de Janeiro, comecei a ter certeza que a coisa está fora do
controle. Na certeira definição de @viniciusduarte,
“sediar Copa do Mundo é um cavalo de Tróia”, é colocar o inimigo para dentro.
A Fifa é como a enigmática e fechada Coreia do Norte, só que
transglobal, cheia de grana e muito influente. Com a promessa de carradas de
dinheiro e visibilidade, a organização entra nos países e vai corroendo durante
um tempo suas soberanias, violando direitos sociais, pintando o sete geral a
seu bel prazer (com o conluio do governo federal, Estados e municípios, todos
embevecidos pelo canto da sereia da bola redonda). Mas a Copa vai acontecer, de
um jeito ou de outro, e o que dá para fazer agora é ficar atento a tudo porque
já deu essa história do dinheiro passar por cima das pessoas. Perdemos Aldeia
Maracanã, vencemos a Batalha do Acarajé, e isso é só o começo.
MAIS CAXIXI, MENOS CAXIROLA
Não pensei que iria voltar a tratar da Copa tão cedo.
Sinceramente. Só que poucos dias após ter publicado “Ah,
que é isso? A FIFA está descontrolada” aconteceu a Revolta das Caxirolas e
uma coisa assim não pode passar em brancas nuvens pelo Mexidão. Bem, a essa altura do campeonato quase todo mundo já está
nervoso de saber o que é a caxirola, mas não custa fazer um flashback rápido...
Do nada, a FIFA e o Ministério dos Esportes vieram a público
apresentar o instrumento musical símbolo da Copa das Confederações e da Copa do
Mundo no Brasil. Criação do multi-instrumentista Carlinhos Brown, a caxirola é um chocalho de
plástico feito a base de cana-de-açúcar produzida pela Brasken. O músico baiano
registrou sua nova obra – contratada não sabe-se como e em quais termos pelo
governo – e vendeu os direitos de fabricação e distribuição para a
multinacional The Marketing Store. Os valores dessa gigantesca transação não
são revelados (o valor de R$ 1,5 bilhão foi estimado aqui e ali), mas o preço
sugerido ao torcedor é R$ 29,90.
Daí que logo na estreia oficial do instrumento, domingo
passado, 28 de abril, o reformulado Estádio da Fonte Nova viu uma revoada de
caxirolas rumo ao gramado. Eram torcedores revoltados do Bahia protestando
contra seus dirigentes, enquanto o time perdia para o rival Vitória por 2 a 1.
Foi o bastante para o pessoal da grana ficar de orelhas
em pé prevendo novas manifestações não-musicais já agora na Copa das
Confederações. Bateu um medinho e estão pensando em colocar
uma bula para ensinar ao brasileiro como usar o instrumento com
responsabilidade.
É isso que dá pensar só em dinheiro e não nas pessoas que
fazem e sustentam o espetáculo. Porque, será mesmo que eles acham que ninguém
perceberia que a caxirola não passa de um caxixi de plástico? E que é um
completo absurdo privatizar um bem cultural tradicional? Ou então que a caxirola
não tem relação alguma com o futebol brasileiro? Só mesmo Galvão Bueno e Tadeu
Schmidt, os porta-vozes futebolísticos da Globo, para defenderem tal disparate.
Direto ao ponto, o jornalista José Trajano afirmou durante o
programa Linha de Passe (ESPN) que o torcedor tem o direito de jogar a
caxirola onde bem entender. Na Copa da África do Sul as vuvuzelas podiam ser (e
eram) um inferno para os ouvidos estrangeiros, mas eram genuínas integrantes da
cultura do futebol no país. E a caxirola? Até quinze dias atrás ela nem
existia! Porque diabos deveríamos aceitar algo imposto por essa dobradinha
poder público/iniciativa privada e que provavelmente foi gestado em algum reunião
de brainstorm com publicitários de sapatênis?
Mas nada disso me surpreende, na verdade. Agora, o papel de
Carlinhos Brown nessa tragicomédia... como é que pode um sujeito assumidamente
ligado à cultura popular pegar um instrumento tradicional (alô pessoal da
capoeira!), dar um tapinha e registrar como criação sua?! Sou fã de Brown e o defendi
em março do ano passado no texto “Quem tem
medo de Carlinhos Brown?”, mas prevejo que a chuva de garrafas que tomou na
cabeça durante o Rock in Rio em 2001 vai ser pinto perto do tsunami de
caxirolas que se avizinha por aí. Olha, a Revolta da Caxirola virou até cordel.
Essa apropriação privada de um instrumento popular é o mais
grave desse caso, mais até do que a imposição de um símbolo (o pessoal da grana
que se vire com o encalhe das caxirolas). Em texto
contundente, o antropólogo Henrique Parra tem uma sugestão para minimizar o
absurdo dessa situação: “Se o governo está interessado em criar um símbolo, bem
poderia indicá-lo e deixá-lo livre, como são os símbolos, ao invés de transformá-lo
em propriedade privada. (...) Diversas fabricantes nacionais poderiam
produzi-lo, diversos comerciantes locais poderiam distribuí-lo e aquelas
corporações interessadas em fazer o produto circular em “outras esferas”
(produtos especializados para consumidores endinheirados) poderiam recolher uma
taxa específica cujos recursos poderiam ser destinados ao apoio de milhares de
escolas de capoeira e grupos culturais espalhados pelo País”. Isso sim é um
Brasil de todos.
quinta-feira, 23 de maio de 2013
letra/música #27 e transversão #42
foi no blog do blundetto que fiquei sabendo do tributo brassens - echos d'aujourd'hui (fanon records), uma homenagem transglobal ao poeta, cantor e compositor anarquista francês georges brassens. nunca tinha ouvido falar dele, confesso, mas semana passada finalmente achei link para download do disco (aqui ou aqui) e é uma coisa linda. e também surpreendente porque foram reunidos artistas de várias partes do planeta cantando brassens em suas línguas nativas, o que acaba abrindo inúmeras portas para se procurar as versões originais e compará-las, colidí-las, etc. nas 16 faixas aparecem figuras como shawn lee (estados unidos), lianne la havas (inglaterra), grupo canalon de timbiqui (colômbia), las hermanas caronni (argentina), enkhjargal (mongólia), anthony joseph (trinidad), yael naim (israel) e, claro, blundetto (frança). mas então aparece rodrigo amarante cantando "o não-pedido de casamento" e... puxa... que versão, que música espantosamente linda e rebuscada. escuta só.
o não-pedido de casamento
(georges brassens, tradução e adaptação de rodrigo amarante e stephane san juan)
meu bem, por deus, tenho um pedido
não apontemos pro cupido
sua própria flecha
tantos amantes se arriscaram
com seu gozo eles pagaram
tal sacrilégio
uma aliança em cada mão
a jurar ordem de prisão
em domicílio
pro inferno, amélias secas amas
que deixam frias suas camas
pra pilar milho
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
vênus presa perde o viço
e com o choriço frita o juízo
cai na comida
por nada neste mundo eu vou
despetalar sobre o escargot
a margarida
cai o véu, com ele o encanto
o segredo da sereia, o canto
de Melusine
o batom nas cartas perde a cor
entre uma e outra página do
Nouvelle Cuisine
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
é muito fácil a gente pensa
largar no fundo da despensa
numa conserva
o belo fruto proibido
perdeu o gosto, foi cozido
não se preserva
de uma empregada eu não preciso
tratado a pão de ló, aviso
não quero nunca ser
como uma noiva eterna intento
a dona dos meus pensamentos
eu sempre ver
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
amarante, que está para lançar seu primeiro disco solo (cavalo), canta e toca violão acompanhado de berna ceppas (sintetizador), moreno veloso (cello), alberto continentino (baixo) e stephane san juan (percussão). agora veja e escute brassens direto de algum lugar dos anos 1960...
nas buscas por saber e ouvir mais dessa música encontrei ainda uma versão instrumental comandada por eddie "lockjaw" davis (sax tenor) e harry "sweets" edison (trompete) e lançada em 1979.
p.s.: agradecimentos a bebel prates que conseguiu essas informações (banda, tradução e revisão da letra que transcrevi) com o próprio amarante.
o não-pedido de casamento
(georges brassens, tradução e adaptação de rodrigo amarante e stephane san juan)
meu bem, por deus, tenho um pedido
não apontemos pro cupido
sua própria flecha
tantos amantes se arriscaram
com seu gozo eles pagaram
tal sacrilégio
uma aliança em cada mão
a jurar ordem de prisão
em domicílio
pro inferno, amélias secas amas
que deixam frias suas camas
pra pilar milho
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
vênus presa perde o viço
e com o choriço frita o juízo
cai na comida
por nada neste mundo eu vou
despetalar sobre o escargot
a margarida
cai o véu, com ele o encanto
o segredo da sereia, o canto
de Melusine
o batom nas cartas perde a cor
entre uma e outra página do
Nouvelle Cuisine
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
é muito fácil a gente pensa
largar no fundo da despensa
numa conserva
o belo fruto proibido
perdeu o gosto, foi cozido
não se preserva
de uma empregada eu não preciso
tratado a pão de ló, aviso
não quero nunca ser
como uma noiva eterna intento
a dona dos meus pensamentos
eu sempre ver
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
eu tenho a honra de não te pedir a mão
pra quê firmar no pergaminho essa união?
amarante, que está para lançar seu primeiro disco solo (cavalo), canta e toca violão acompanhado de berna ceppas (sintetizador), moreno veloso (cello), alberto continentino (baixo) e stephane san juan (percussão). agora veja e escute brassens direto de algum lugar dos anos 1960...
nas buscas por saber e ouvir mais dessa música encontrei ainda uma versão instrumental comandada por eddie "lockjaw" davis (sax tenor) e harry "sweets" edison (trompete) e lançada em 1979.
p.s.: agradecimentos a bebel prates que conseguiu essas informações (banda, tradução e revisão da letra que transcrevi) com o próprio amarante.
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quarta-feira, 22 de maio de 2013
mexidão #11
pouco depois que escrevi esse texto no mexidão, a garota de programa (e escritora) lola benvenutti se mudou de são carlos para são paulo e já está aprontando mil e umas. acho que esse foi um dos textos que mais gostei de escrever nessa primeira fase do novo blog no yahoo - e quem me sugeriu a lola foi o infalível michel blanco - e ainda contou com a participação especial da colega carol patrocínio. pedi algumas palavras dela sobre lola e recebi um belo texto. no yahoo tive que editar, mas aqui ele vai na íntegra.
SEXO É ISSO, AQUILO E VICE-VERSA
Dia desses imaginei o seguinte cenário: se pelo menos um
terço (número totalmente hipotético) dos fiscais do gozo alheio curtissem os
próprios prazeres, que maravilha seria viver. Lola Benvenutti concorda
comigo. Ou eu concordo com ela, tanto faz. Só que Lola vai além, pois faz de
seu próprio corpo um campo de batalha, no qual sexo é orgulho e dinheiro não é
vergonha.
Nascida Gabriela Natália da Silva há 21 anos em Pirassununga,
Lola começou a fazer programas quando se mudou para São Carlos. Até o último
ano do curso de Letras na UFSCar manteve Gabriela e Lola em mundos distintos,
pois temia represálias e inquisições, mas em março do ano passado abriu seu blog para contar suas
experiências e os programas que faz pelo interior de São Paulo (o que faz
lembrar imediatamente de Bruna Surfistinha, só que Lola é mais bem humorada e escreve
melhor).
Sua história apareceu numa entrevista para o site São
Carlos em Rede, depois numa longa
matéria no G1 e mais recentemente no site da Folha
de S. Paulo. Felizmente todas as reportagens conseguiram dar conta da
postura orgulhosa e tranquila de Lola. O moralismo galopante só apareceu nos
comentários.
Fugindo de todos os clichês da profissão, Lola nasceu em uma
família feliz de classe média (pai militar da reserva, mãe enfermeira), não tem
histórico de abuso, não começou a fazer programas para pagar a faculdade, nada
disso. Lola faz programas porque gosta de sexo e dinheiro, simples assim. Ela
mesma falou assim para o São Carlos em Rede: “Acho curioso o fato de as pessoas
tentarem imaginar qual acontecimento familiar macabro me levou a este caminho.
Lamento desapontá-los, mas a verdade é que tive ótima educação. Fui criada no
sítio, com os melhores valores que alguém pode aprender. A questão é que eu amo
sexo! (...) Tornar-me acompanhante foi apenas uma maneira de unir dois gostos:
sexo e dinheiro”.
"Sou a Lola. Uma garota simpática, bela e que adora sexo! Intenso, forte, com desejo. É assim que tem que ser", diz na bio em seu blog
O raciocínio de Lola é tão cristalino que dá até um pouco de
vergonha dessa questão ainda ser considerado “polêmica” nos dias de hoje. Mas
ela, como já disse, vai além. “Meu modo de escrever é reflexo não apenas desse
desejo de conferir glamour a este magnífico universo, mas também uma forma de
valorizar meu intelecto. Sou garota de programa e sou inteligente, estudada,
culta. Reconheço meu poder e quero que os outros também reconheçam”, disse a
jovem que ostenta, igualmente orgulhosa, tatuagens com frases de Manuel
Bandeira e Guimarães Rosa e faz strip-tease ao som de Etta James.
Já no G1 ela colocou o dedo diretamente na ferida ao afirmar
que “as pessoas são hipócritas, vivem de sexo, veem vídeo pornográfico, mas não
falam porque têm vergonha. Um monte de mulher entra no blog e fala que adoraria
fazer o que eu faço, mas não tem coragem; e dos homens escuto as confissões
mais loucas e cada vez mais esse tabu do sexo é uma coisa besta”.
Poderia falar por horas que falar e fazer sexo sem tabu faz
um bem danado para a cabeça, mas preferi perguntar para Carol Patrocínio,
jornalista, colega de Yahoo! e
autora do blog Preliminares,
o que ela acha dessa história. Com vocês, Carol...
“Acho inspirador ver mulheres como a Lola assumindo seu
desejo sexual e sua busca por independência financeira da maneira que acreditam
ser a melhor para si. O corpo da mulher é da mulher, assim como suas decisões.
É importante que a mulher tenha essa liberdade, que possa dizer
com todas as letras que gosta de sexo e que o faz com quem quer, cobrando ou
não. Não dá mais pra gente ficar tentando regrar a vida alheia, muito menos em
uma questão tão íntima quanto o prazer. Ela tem prazer em vender sexo, qual o
problema nisso? O que isso muda na sua vida? Se a cada julgamento que fizermos
nos fizermos esse último questionamento veremos que dá para viver de maneira
muito mais leve.
O feminismo, pelo que eu entendo, luta por igualdade,
liberdade e respeito. Nada mais certo do que respeitar escolhas sem que a
“moral e os bons costumes” ganhem espaço no mundo libertário que tentamos criar
diariamente com nossos trabalhos de conscientização e informação. Ainda há um
ranço religioso e cultural muito forte entre as pessoas, o que contamina as
opiniões e faz com que o uso do corpo soe como algo imoral. O corpo é lindo, o
sexo é parte da vida e a maneira que cada um se relaciona com o seu prazer é
única. Não existe certo ou errado quando tudo que é feito é consensual. Lola
teve coragem de assumir o que muitas mulheres adorariam e não têm coragem.
Prostituição é, sim, uma escolha. E não há nada de vitimizador, vergonhoso ou
errado nisso”.
Lola e eu assinamos embaixo. E vice-versa.
domingo, 19 de maio de 2013
virada cultural 2013, breve saldo pessoal
como sempre acontece em termos de virada cultural, a
teoria é uma coisa e a prática é outra. fiz um roteiro com nove shows e vi,
inteiros, quatro. a história desse ano foi mais ou menos a seguinte: finalzinho
do lucas santtana (delícia), metá metá (absolutamente poderoso, e com muita
gente cantando todas as letras - só lamentei não ter rolado “cobra rasteira”),
black star (muito e muito bom), um pedacinho bem divertido de rappin hood, racionais (show
foda, histórico, catártico, pra cima - mas vou depois escrever mais sobre esse
comparando com o da virada de 2007) e baiana system (outra delícia total).
acompanhei e fiquei sabendo de algumas brigas/arrastões, mas
não acho que a segurança (ou falta de) seja um problema maior que a limpeza,
por exemplo. a sujeira na madrugada e início da manhã sempre foi e continua
sendo pra mim o grande problema estrutural da virada, tanto por culpa da(s)
prefeitura(s) quanto pelo público. mas voltando ao tema ‘violência’, também não
acho que foi maior esse ano que nos outros e olha que já tenho uns seis ou sete
de virada (e dois anos atrás fui assaltado). na madrugada desse domingo, por
exemplo, atravessei em dois momentos a parte clássica da crackolândia (rua do
triunfo, rua dos gusmões) e os nóias tavam lá no seu próprio mundo sem mexer
com ninguém. a violência ali era só da tristeza e do abandono.
mas é claro que a combinação de muita gente com álcool
durante muitas horas é potencialmente explosiva em qualquer lugar
(principalmente na madrugada) e realmente não sei o que pode ser feito pra
resolver esse dilema do evento. acho que tá mais que na hora de se pensar – e
isso é apenas um exemplo – em mini viradas espalhadas pela cidade e trimestrais
ou semestrais. talvez uma pulverização do público pela cidade resolvesse alguns
desses problemas (do mesmo jeito que proibir bebida certamente não é uma das
soluções).
vi muitos policiais na rua, mas achei que eles pareciam
estar numa onda liberal, saca? num laissez
fair/laissez passer de corpo presente e braços cruzados. impossível não
cogitar a hipótese conspiratória que a pm, do governador alckmin (psdb), tenha
recebido alguma ordem para ficar numa relax, numa tranquila, numa boa, afinal
foi a primeira virada da administração haddad (pt). enquanto isso, no twitter,
o cada vez mais infantil serra (psdb) se mostrou preocupado que o evento esteja
sendo usado para “aparelhamento político-partidário” (zzzzzz).
de resto, uma programação bem boa e variada (como sempre tem que ser), e muita gente se divertindo numa cidade que precisa justamente disso (e cada vez mais).
p.s.: tava tão afim de curtir o que conseguisse na virada (e as pessoas que porventura encontrasse, premeditadamente ou não) que mal entrei na internet & redes sociais e só tirei uma foto (e ruim) do show do racionais. essa aqui ó...
segunda-feira, 13 de maio de 2013
transversão #41
não lembro quando ouvi “marcianita” pela primeira vez. acho
que ela tá naquele rol de músicas que sempre existiram, sempre tocaram, e não
se sabe direito como surgiram (nem no mundo, muito menos pra si). mas sei muito
bem quando ela definitivamente entrou na minha lista de preferidas: durante os
shows que o mauricio pereira
fez no início dos anos 2000 e que resultaram no disco as canções que você já assobiou (2003). foi então que descobri a
gravação do sérgio murilo (1960), a do caetano com os mutantes (1968),
uma do raul seixas (1973), outra da gal costa (2002) e recuperei a memória
de uma do grupo rumo (1992).
p.s.: e ainda tem os trapalhões (sim, isso mesmo, os trapalhões numa versão absolutamente fuleira), bobby di carlo, alípio martins, léo jaime, o “marcianito” de sueli, e uma recentíssima do felipe cordeiro, etc.
recentemente, e com certo atraso, ouvi a que jussara silveira
gravou no disco ame ou se mande
(2011) e chapei novamente. que versão linda e divertida! fui então pesquisar a
origem da música e me surpreendi com as poucas informações. consegui descobrir
que “marcianita” é uma composição de josé imperatore marcone e galvarino
villota alderete, chilenos até onde sei, e foi lançada em 1959 (até poucos dias
atrás nunca tinha ouvido nenhuma interpretação em espanhol). de bate pronto fez
muito sucesso na argentina na voz de billy cafaro e no ano seguinte ganhou uma
versão em português assinada por fernando césar que
estourou com sérgio murilo. a partir daí ganhou inúmeras versões por aqui (e
também em portugal com daniel bacelar,
por exemplo).
nessa volta a seção transversão após tantos meses de
silêncio (a última foi em julho do ano passado com “maria
bethânia” de caetano) separei algumas das minhas versões preferidas dessa lindeza que é
“marcianita”. começando com o argentino billy cafaro e os chilenos do grupo los
flamingos, ambos em 1959.
então chegamos ao brasil e logo de cara sérgio murilo quebra
tudo numa versão cool, sofisticadíssima, pré-jovem guarda.
queria colocar a do caetano com os mutantes, mas não achei
nenhuma opção para incorporar. tristeza, viu? então agora é
a vez das totalmente excelentes (e paulistanas) gravações do grupo rumo e de maurício pereira.
e, finalmente, jussara silveira em sua interpretação
cristalina e deliciosa, acompanhada por sacha amback e marco costa.
pra encerrar essa postagem uma gravação que achei nessas
buscas e que me impressionou bastante. gravada em 2012, essa “marcianita” traz
ana clara cantando acompanhada pelo trio molho negro e por felipe cordeiro,
todos paraenses. baita versão, mais pesada e pop, e com uma parte em espanhol
levada no tecnobrega.
p.s.: e ainda tem os trapalhões (sim, isso mesmo, os trapalhões numa versão absolutamente fuleira), bobby di carlo, alípio martins, léo jaime, o “marcianito” de sueli, e uma recentíssima do felipe cordeiro, etc.
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domingo, 12 de maio de 2013
mexidão #09
uma coisa certa nessa vida: tom zé é foda. hoje com 76 anos, o artista segue produzindo a mil por hora, experimentando, olhando e pensando sobre o presente e o futuro da cultura e da música popular, e com bom humor, sem parar, sem parar. as críticas que surgiram com sua participação em uma propaganda da coca-cola o fizeram criar um de seus trabalhos mais interessantes e divertidos dos últimos anos, o EP tribunal do feicebuqui. lá no yahoo falei dessa resposta-musical que ainda contou com a participação de uma boa turma de jovens músicos paulistanos - o terno, emicida, tatá aeroplano, trupe chá de boldo e filarmônica da pasárgada - sob curadoria do jornalista marcus preto. de seus discos dos anos 2000 gosto muito de estudando o pagode e jogos de armar, gosto de estudando a bossa, imprensa cantada e pirulito da ciência, achei danç-êh-sá muito chato e ainda não entendi direito o tropicalismo lixo lógico. só a partir dessa listinha é possível ver o muito que o baiano produziu nos últimos anos e sempre muito intensamente. quer dizer, você pode não entender, pode até não gostar, mas é impossível não respeitar um cara apaixonado como ele e que ainda faz tanto pela música e pelo brasil... após ter lançado tribunal do feicebuqui deu ótima entrevista no programa roda viva e pagou um esporro federal durante show no circo voador (porque alguém jogou um copo de cerveja no palco).
O ARROTO GOSTOSO DE TOM ZÉ
Foi no início de março deste ano que apareceu na TV e na
internet uma propaganda da Coca-Cola narrada por Tom Zé. Rapidamente, como sempre nos tempos
de hoje, apareceram um tanto de comentários críticos à participação do artista
na publicidade do refrigerante. “Tom Zé, seu vendido” foi o mantra repetido ad nauseam nas redes sociais.
O baiano de Irará, 76 anos, é um dos maiores artistas da
música brasileira (e, consequentemente, do mundo). Também é um dos mais
irrequietos, originais e coerentes. Por tudo isso ele já merecia um pouco de
mais maturidade nas críticas, mas Tom Zé nunca fez sucesso (em sucesso leia-se,
no caso, dinheiro) na vida, apesar de ser referência para centenas de artistas
brasileiros e internacionais. E durante cerca de 15 anos, do final da década de
1970 ao inícios dos anos 1990, passou por profundas dificuldades financeiras
que quase o fizeram desistir da carreira.
Mas os mimados
da internet se acham no direito de julgar e apontar o dedo – quem destes
comprou um disco dele ou foi em shows? – e tanto fizeram que Tom Zé publicou um
texto
em seu blog. Genuinamente preocupado, afirmou o seguinte: “É curioso que
quando fui consultado sobre o anúncio nem pensei nessa probabilidade [das críticas negativas]. No ano passado
meu disco [Tropicália Lixo Lógico] fora
patrocinado pela Natura e como eu nunca tinha recebido patrocínio desse tipo –
nem de nenhum outro – , cara, eu me senti como um artista levado em conta!”.
Não tem nada de errado na propaganda da Coca narrada por Tom
Zé. Tem uma graça e um otimismo pelo Brasil que são típicos dele. Mas certos
fãs que ainda acreditam que o refrigerante é o “líquido negro do capitalismo”
ou algo parecido não lhe perdoaram (e, veja bem, a Natura, que é bem
brasileira, não é nada
santa). E não adiantou o compositor de clássicos como “Angélica, Augusta,
Consolação” falar que o dinheiro ganho será reinvestido em sua própria música
(nada de carrões, iate, cobertura de luxo, etc).
“Atualmente sinto paixão pela retomada do projeto dos instrumentos
experimentais de 1972. Com a eficiente colaboração do engenheiro Marcelo
Blanck, começamos a desenvolver alguma tecnologia, mas com recursos parcos,
insuficientes. (...) Aí entrou o anúncio da Coca-Cola que, mesmo sem ela saber,
patrocinaria boa parte da pesquisa”, disse no blog. Humildemente ainda
perguntou: “Será que o uso dos recursos obtidos com o anúncio muda a avaliação
de vocês?”. Olha o tamanho da fofurice e da atenção do sujeito! Eu já teria
mandado todo mundo catar coquinho na ladeira.
Só que Tom Zé é mais, muito mais. Nesse meio tempo ele se
reuniu com um grupo de jovens artistas de São Paulo (Emicida, O Terno, Tatá
Aeroplano, Filamônica de Pasargada e Trupe Chá de Boldo), gravou e acabou de
lançar o EP Tribunal do Feicebuqui
para dowload gratuito em seu site oficial.
Nas cinco faixas do disco, Tom Zé dá um tapa com luva de
pelica nos patrulheiros da vida alheia. Estão lá versos irônicos como “Que é
que custava morrer de fome só pra fazer música?” (em “Tom Zé Mané”) ou “O povo,
querida, com pedras na mão voltadas contra o imperialismo pagão / E na
cerimônia do beija-pé / Papa Francisco perdoa Tom Zé / No Feicebuqui da Santa
Sé / Papa Francisco perdoa Tom Zé” (em “Francisco perdoa Tom Zé). É isso, meu
caro Tom Zé, arrota melhor quem arrota melhor.
p.s.: seguem abaixo as cinco músicas do tribunal do feicebuqui.
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quinta-feira, 9 de maio de 2013
segunda-feira, 6 de maio de 2013
mexidão #08
li muita coisa sobre a redução da maioridade penal antes e depois de escrever esse texto para o mexidão. simplesmente não consigo entender como até algumas pessoas inteligentes levaram a sério uma questão que pra mim é uma das mais cretinas e danosas da atualidade. pensar num aumento da reclusão para menores que cometeram crimes violentos (latrocínio, estupro, etc.) é uma coisa, mas generalizar em forma de lei é de uma cegueira absurda. é a boa e velha tática conservadora de atacar os fins e não os meios.
se o juizado de menores vier,
melhor que venha armado...
REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL:
O OPORTUNISMO DE SEMPRE
O OPORTUNISMO DE SEMPRE
Dez
dias atrás, o estudante Victor Hugo Deppman, 19 anos, foi assassinado com um
tiro na cabeça em frente ao prédio que morava com a família no Belém, bairro da
Zona Leste de São Paulo. Victor não reagiu e mesmo assim o assaltante de 17
anos atirou à queima roupa. Mais uma tragédia com armas de fogo, mais uma
família em luto pra vida toda.
Só
que, mais uma vez, uma parte da opinião pública e a grande imprensa transformaram
a dor em gritaria pela redução da maioridade penal (de 18 para 16 anos) como se
uma tragédia isolada fosse um problema crônico. Nos últimos anos houve um
aumento de crimes juvenis? Não, não houve. Em nota técnica contrária à
redução da maioridade penal, a Fundação Abrinq afirmou, via Levantamento
Nacional de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei
(2011), “que de 2002 para 2011 houve uma redução percentual de atos graves
contra pessoa e o homicídio apresentou redução de 14,9% para 8,4%; a prática de
latrocínio reduziu de 5,5% para 1,9%; o estupro de 3,3% para 1,0% e lesão
corporal de 2,2% para 1,3%”.
Enquanto
o espírito linchador insistir que é preciso prender mais e por mais tempo nada
disso vai mudar, muito menos melhorar. Não adianta atacar, como é costume de
políticos oportunistas como o Governador Geraldo Alckmin (SP), os fins e não as
causas da violência. E, acima de tudo, não é possível legislar ou mudar leis com base na
emoção. Estimular e melhorar a infraestrutura de medidas sócio-educativas é o
melhor caminho para tirar os jovens do mundo do crime.
Em
ótimo texto sobre o assunto,
Vinícius Boncato, aluno de Jornalismo na mesma Casper Líbero no qual Victor
Deppman estudava Rádio e TV, faz uma pergunta muito importante: a questão é
tentar reduzir a violência ou atender a um desejo coletivo de vingança? É
vingança, claro, como diz o jornalista Leonardo Sakamoto em “Jovem rico erra.
'Menor' pobre comete crime” (também de sua pena é o texto provocativo “Maioridade penal
aos seis. Afinal, nessa idade, eles já se vestem sozinhos”).
De
volta à nota da Abrinq é bom que se entenda que “antes de criminalizarmos a
adolescência, é preciso que os direitos sociais, tais como, educação, saúde,
moradia, lazer, segurança, entre outros, estejam assegurados para cada
adolescente brasileiro. Somente assim poderemos ser de fato um país
democrático, rico e com justiça social”. É por isso que a gente tem que lutar.
p.s.:
Vale assistir um documentário curto sobre os
benefícios da prática de yoga para detentos da Fundação Casa e também as
ponderações do antropólogo Paulo Malvasi no programa Encontros com Fátima Bernardes. São dois vídeos: “Medidas
sócio-educativas são a melhor opção para recuperar menores” e “Redução da maioridade
é atitude paliativa”.
domingo, 5 de maio de 2013
elas cantam ele, eles cantam ela
neste ano, o selo jóia
moderna lançou dois excelentes tributos. não foram os primeiros da curta
vida do selo criado pelo dj zé pedro – antes aconteceram literalmente loucas - as canções de marina lima (2011) e a voz da mulher na obra de guilherme
arantes (2012) –, mas certamente são os melhores até agora (achei o da
marina bom e o do guilherme arantes muito fraco). mulheres
de péricles (2013) traz um punhado de cantoras da nova geração ao redor
do compositor péricles
cavalcanti, enquanto coitadinha bem feito (2013) faz o
mesmo com jovens cantores e as músicas de ângela ro ro. ah, como se não
bastassem trazer interpretações surpreendentes para algumas canções bem
conhecidas, os dois tributos também estão disponíveis para download gratuito.
mulheres de péricles - péricles cavalcanti é um ilustre desconhecido. todos sabem
cantar pelo menos uma de suas composições, mas poucos conhecem seus discos
solos (são 5) ou associam seu nome a canções gravadas por gal (“negro amor”), caetano (“elegia”), arnaldo antunes (“eva e eu”) e adriana calcanhotto (“medo de amar nº3”). não que isso seja um
problema ou motivo de ressentimento para ele (não parece), mas de qualquer
forma esse disco é uma oportunidade e tanto para colocar alguns pingos nos is,
principalmente sobre a poesia sofisticada e popular de suas letras. por outro
lado, a escolha dessas jovens vozes femininas confere diversos tons de
delicadeza (sexual, rascante, derramada, etc.) e experimentações musicais das
mais variadas a canções feitas no decorrer das últimas quatro décadas. todas
soam igualmente fresquinhas, urgentes. cada ouvinte terá suas preferidas e
as minhas são “clariô” (marietta vital e mairah rocha), “blues” (céu), “porto
alegre” (tulipa ruiz), “elegia” (mallu magalhães), “quem nasceu?” (laura lavieri) e “ode primitiva” (bárbara
eugênia). detalhe: os anos indicados após as músicas (o mesmo vale para o
próximo tributo) são das gravações originais.
1. céu – “blues” (péricles cavalcanti, 1981)
2. nina becker – “o céu e o som” (péricles cavalcanti, 1974)
3. blubell – “bossa nova” (péricles cavalcanti, 2004)
4. mallu magalhães – “elegia” (péricles cavalcanti & augusto de campos, 1979)
5. bárbara eugênia – “ode primitiva” (péricles cavalcanti & haroldo de campos, 1991)
6. marietta vital & mairah rocha – “clariô” (péricles cavalcanti, 1977)
7. tulipa ruiz – “porto alegre” (péricles cavalcanti, 2007)
8. iara rennó – “nossa bagdá” (péricles cavalcanti, 2004)
9. anelis & serena assumpção – “eva e eu” (péricles cavalcanti & arnaldo antunes, 1996)
10. laura lavieri – “quem nasceu?” (péricles cavalcanti, 1974)
11. karina buhr – “negro amor” (péricles cavalcanti & caetano veloso, 1977)
12. juliana kehl – “será o amor?” (péricles cavalcanti, 2004)
13. ava rocha – “musical” (péricles cavalcanti, 1983)
14. tiê – “medo de amar nº3” (péricles cavalcanti, 2000)
15. juliana perdigão – “canto maneiro” (péricles cavalcanti, 1991)
coitadinha bem feito - felizmente ângela ro ro se tornou objeto de culto ainda em
vida, e a partir dos anos 2000 voltou a fazer shows, a gravar e até emplacou um
programa de televisão. coitadinha bem
feito é um coroamento desse movimento e uma bela homenagem a uma das
compositoras mais fortes da música popular brasileira. a costura do repertório
é menos original que a do mulheres de
péricles – tanto que metade do tributo veio diretamente do disco de estreia
de ângela, de 1979 –, mas a escolha por (e dos) intérpretes masculinos é um
belo contraponto ao estilo da carioca. suas ironias mudam de lugar, seu romantismo
rasgado ganha distância, seu blues ganha novas cores. as preferidas da casa são
(sem nenhuma ordem, sempre) “balada da arrasada” (tatá aeroplano), “perdoai-os
pai” (rael), “coitadinha bem feito” (otto), “não há cabeça” (pélico), “me
acalmo danando” (hélio flanders), “came e case” (léo cavalcanti), “abre o
coração” (gui amabis) e “fogueira” (rodrigo campos). baixe aí e veja quais são
suas preferidas porque música boa é que não falta.
1. lucas santtana – “amor meu grande amor” (ângela ro ro &
ana terra, 1979)
2. lira – “renúncia” (ângela ro ro, 1980)
3. leo cavalcanti – “came e case” (sérgio bandeira & ângela
ro ro, 1981)
4. rómulo froés – “só nos resta viver” (ângela ro ro, 1980)
5. thiago pethit – “mares da espanha” (ângela ro ro, 1979)
6. tatá aeroplano – “balada da arrasada” (ângela ro ro,
1979)
7. otto – “coitadinha bem feito” (sérgio bandeira & ângela
ro ro, 1981)
8. gui amabis – “abre o coração” (ângela ro ro, 1979)
9. adriano cintra – “gota de sangue” (ângela ro ro, 1979)
10. pélico – “não há cabeça” (ângela ro ro, 1979)
11. rodrigo campos – “fogueira” (ângela ro ro, 1984)
12. kiko dinucci – “tango da bronquite” (ângela ro ro, 1980)
13. rael – “perdoai-os pai” (sérgio bandeira & ângela ro
ro, 1981)
14. gustavo galo – “fraca e abusada” (ângela ro ro, 1981)
15. dani black – “tola foi você” (ângela ro ro, 1979)
16. juliano gauche – “a mim e a mais ninguém” (ângela ro ro,
1979)
17. helio flanders – “me acalmo danando” (ângela ro ro,
1979)
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quarta-feira, 1 de maio de 2013
mexidão #07
fui percebendo com o tempo que a mistura de cultura e política se tornou um dos principais tópicos da minha vida profissional. mais ou menos evidente em tudo que escrevo, mas principalmente no yahoo. então, por exemplo, dei um tempo das polêmicas quentes do cotidiano lá no mexidão para falar do cantor e compositor rodriguez e da sua história contada magnificamente pelo documentário searching for sugar man. obviamente a política acabou se metendo lá pelas tantas... coisas da minha vida, minha nega, e de mais um monte gente.
O CULTUADO ANONIMATO DE RODRIGUEZ
Conheci a música de Rodriguez
– ou Sixto Rodriguez
ou Jesus Rodriguez – uns três anos atrás por causa de um relançamento de seu
primeiro disco, Cold Fact (1970). Não
sou fã de folk music, gosto de uma coisa aqui e outra ali, mas tinha algo de
muito urgente em suas crônicas urbanas sobre despossuídos como ele (viciados,
moradores de rua, trabalhadores braçais, etc.). Sem falar que canções como
“Sugar Man”, “Inner City Blues”, “Crucify Your Mind” e “Rich Folks Hoax”
ganharam arranjos inspiradíssimos criados pelos produtores-músicos Dennis
Coffey e Mike Theodore.
Mas não sabia nada sobre sua vida e de sua carreira só tinha
conhecimento que havia lançado outro disco, Coming
from Reality (1971), e depois que este também não fez sucesso nos Estados
Unidos ele sumiu do mapa. Então surgiu o longa Searching for the Sugar Man (2012), do diretor sueco Malik
Bendjelloul, com uma história tão absurdamente fantástica que nenhum
ficcionista poderia ter imaginado. O filme acabou ganhando, este ano, o Oscar
de Melhor Documentário.
É que enquanto sua terra natal o ignorava solenemente – e ele
voltava a trabalhar, sem crise, na construção civil de Detroit –, Rodriguez se
tornou objeto de culto na distante África do Sul. Segundo a lenda, uma
americana levou o disco para o país nos anos 1970 e jovens brancos (os afrikaners descendentes de holandeses)
começaram a fazer cópias e cópias em fitas K-7. Foi a época mais violenta do apartheid e toda a comunicação era
controlada por um dos mais autoritários e segregacionistas Estados do século
20. A crítica social nas letras de Rodriguez caiu como uma luva nos corações
daqueles que viam o absurdo de ver a grande maioria negra e nativa ser perseguida,
brutalizada, sem nenhum direito.
Só que Rodriguez não sabia de sua fama na África do Sul, do
quanto influenciou a juventude e de que possivelmente seu disco Cold Fact vendeu cerca de 500 mil cópias
por lá. Também não sabia que outra lenda
afirmava que ele tinha suicidado em pleno palco e as versões variavam entre um
tiro na cabeça e o ateamento de fogo em seu próprio corpo. Esse desconhecimento
mútuo durou até 1997 quando um fã sul-africano criou uma página na internet
para tentar descobrir o paradeiro do ídolo (já sabendo que ele estava vivinho
da silva). Não demorou muito para que uma das três filhas do compositor de
origem hispânico-indígena entrasse em contato girando a roda viva de um
emocionante reconhecimento tardio. Flores em vida, diria Nelson Cavaquinho.
De lá para cá, Rodriguez voltou a fazer shows e ganhou
reconhecimento em seu país, sem nunca deixar de ser um cara que canta a dor das
ruas, um trabalhador-artista meio louco e muito lúcido. Ouvindo Rodriguez e sua
história tão bem contada em Searching for
Sugar Man acabei lembrando uma passagem de A Lebre da Patagônia, livro de memórias do cineasta e escritor
Claude Lanzmann: “(...) os humanos só são humanos porquê tem a capacidade de
transformar num valor aquilo que os oprime e sacrificar-se por ele. Isso é a
humanidade em si, mas também pode ser chamado de tradição, como vimos, e mais
ainda, de cultura” (pág. 272). Podiscrê.
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