sábado, 31 de março de 2012

yahoo #34

depois que escrevi esse "estamos perdidos?" lá no ultrapop na semana passada, o affair entre o ministério da cultura (gestão ana de hollanda) e o famigerado e enigmático ecad, trazido à baila pelos colegas do farofafá, ganhou alguns novos capítulos. o cineasta cacá diegues saiu em defesa do jeitinho ana-ecad ("a cultura é a alma de um povo"), o colunista d'o globo ancelmo góis lançou notinha venenosa sobre o farofafá e o próprio site do ministério da cultura republicou, como se fosse um clipping, um artigo em sua defesa escrito no estadão por josé nêumanne. artigo, aliás, equivocado, elitista e míope de cabo a rabo (como costuma ser o pensamento de nêumanne, nenhuma novidade nisso). de resto, um revelador pacto de silêncio entre governo, oposição e grande imprensa mantém a ministra de amsterdã no cargo e, consequentemente, o atual estado das coisas.


já o texto dessa semana, "o mal e as más", teve um tema mais, digamos assim, ameno: a maldade de duas vilãs recentes de novelas e como elas podem explicar os seus autores (no caso, joão emanuel carneiro e aguinaldo silva).





ESTAMOS PERDIDOS?

O bicho tá pegando. O couro tá comendo. A estrovenga tá girando. Quem acompanha notícias relacionadas à cultura musical brasileira sabe que vivemos um momento curiosamente ambivalente. Tipo euforia e depressão. Bipolar, apontariam os estudos.  Na internet, ou através dela, vivemos num frenesi inesgotável de eventos, discussões, lançamentos gratuitos, transmissões e compartilhamentos, isto é, variedade e disponibilidade. Enquanto isso, no mundo real, a Ministra da Cultura Ana de Amsterdã afirma, em sabatina no Congresso, que “hoje em dia a pirataria é feita assim. É copiado através da internet, e isso se multiplica, está sendo distribuído e vendido pela internet. (...) Isso vai matar a produção cultural brasileira se não tomarmos cuidado”.

Não parecem ser o mesmo mundo, confere? Aí fiquei dando tratos a bola... mas que mundo é esse da Ministra de Hollanda, seus assessores e secretários, que considera compartilhamento o mesmo que pirataria? E que acredita, consequentemente, que a internet é O MAL disseminador dessa praga que pode matar a produção cultural brasileira? Peraí, que cultura brasileira é essa que pode ser feita em pedacinhos pelos www da vida?

Todas essas perguntas vinham sendo respondidas nas próprias ações do MinC desde seus primeiros passos no início do ano passado. Em poucas semanas, Ana, a ministra, deu um catiripapo nos progressistas oito anos da gestão Gilberto Gil/Juca Ferreira e transformou a internet em inimiga da coisa toda. Começaram uns papinhos aqui e ali com as poderosas (e míopes) organizações norte-americanas de defesa dos direitos autorais e com o ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), o enigmático & muito nosso órgão privado que não pode ser investigado, que nunca explica direito como arrecada e distribui e que, recentemente, meteu os pés pelas mãos ao tentar cobrar blogs que incorporassem vídeos do You Tube.


O tal artista que o Ministério diz estar defendendo não é o artista que compõe, grava e faz ao vivo e sim o “artista” que lucra com suas retransmissões, isto é, a iniciativa privada. E que hoje não passa de um pequeno grupo de carpideiras de discos de ouro passados, invariavelmente multinacionais. Não estou falando da boca pra fora. Recentemente, o colega aqui de Yahoo! Brasil, Pedro Alexandre Sanches, vem assinando no Farofafá, em parceria com Jotabê Medeiros e Eduardo Nunomura, uma série de reportagens sobre a estranha promiscuidade entre o MinC e o ECAD, com direito a favorecer de um (público) em prol do outro (privado) em um processo contra formação de cartel. Mas, infelizmente, nada disso deve ir muito longe, afinal ninguém liga para a cultura mesmo, não é mesmo Governo e Oposição?

Muito bem. Pouco antes, em fevereiro, durante um evento em Porto Alegre, o ex-ministro Gilberto Gil disse que “a internet chegou para bagunçar o coreto. E tem aqueles que acham que por ordem no coreto é reivindicar a restauração, a ordem tal como ela foi até agora. Para outros não, é preciso criar novas ordens, novas formas de regulação, novas formas de atendimento a questão dos direitos. (...) Essas são as novas disputas e que estão em todas as áreas, no econômico, no político, no cultural, etc.” Para Gil, como para muitos outros (e outras), não estamos nada perdidos. Vivemos é um novo estado das coisas em constante transformação. Nada é sólido e tudo tem que ser para todos, fato que deve causar arrepios nessa gestão vazia, isolada e equivocada do Ministério da Cultura.

Agora, para finalizar, que cultura (musical) brasileira é essa que está sendo ameaçada pela malvada internet? Com certeza não é a de artistas que se viralizaram pela rede, disponibilizando seus trabalhos para download gratuito, e que estão curtindo a dor e a delícia de serem donos de suas próprias carreiras, tais como Criolo, Emicida, Karina Buhr, Wado e Romulo Fróes. Já neste ano três outros artistas (Lucas Santtana, Letuce e Siba) também lançaram e distribuíram seus novos trabalhos no mesmo esquema. Para nenhum deles, a internet é vilã. Talvez esse MinC esteja defendendo a turma de padres-pastores(as) que cantam e que ultimamente tem sido a tábua de salvação (opa!) do mercado fonográfico. Mas como acredito (e não só eu) que santo de casa não faz milagre...

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