sexta-feira, 1 de março de 2024

todas as mulheres de kate

o assunto do mês na minha colaboração pra Revista Monet é a atriz Kate Winslet, e seu novo trabalho, a minissérie The Regime pra HBO. não consegui ver, pois não liberaram antecipadamente, mas pelos trailers pareceu divertida e interessante e Winslet brincando muito à vontade com uma personagem que não lhe é comum.

Uma chanceler muito louca

TODAS AS MULHERES DE KATE

Ao interpretar uma chanceler na sátira política The Regime, Kate Winslet coloca mais um quadro na sua galeria de mulheres fortes

Aos 48 anos de idade, e com pouco mais de 30 de carreira, Kate Winslet não precisa provar nada para ninguém já faz um bom tempo. Mas nem sempre foi assim, e o problema foi justamente o fato de a atriz britânica ter feito muito sucesso logo no começo da carreira. “Depois de Titanic fiz escolhas que deliberadamente iam contra o que era esperado de mim. Porque certamente eu não estava pronta pra ser uma pessoa famosa e foi muito assustador ser tão famosa, tão rapidamente, tão da noite pro dia”, confessou Winslet ao podcast Happy Sad Confused, em dezembro de 2022. 

Prestes a lançar The Regime, sua terceira minissérie pela HBO, Winslet segue buscando o que é inesperado. Tanto é verdade que ela, conhecida e premiada por papéis intensos e dramáticos, agora pôde se divertir ao interpretar Elena Vernham, uma chanceler populista e vaidosa em um país fictício na Europa central no turbilhão de uma grande crise. 

Criada por Will Tracy – que foi roteirista de Last Week Tonight with John Oliver e escreveu o longa O Menu e alguns episódios de Succession –, a minissérie em seis episódios é uma sátira política que poder ser definida como o encontro de The Great com Veep. Mas pouquíssimo material foi distribuído para a imprensa e dois teasers de pouco menos de 2 minutos cada esconderam a trama enquanto deixaram claro que será um trabalho com direção de arte opulenta, texto afiado e atuações comicamente intensas. 

Além de Winslet, o elenco principal conta com Matthias Schoenaerts como um militar desconhecido que é alçado à braço direito da chanceler, Andrea Riseborough como a gerente do palácio e braço esquerdo da chanceler, Guillaume Gallienne como o marido humilhado da chanceler, Martha Plimpton como a Secretária de Estado dos EUA e Hugh Grant como o líder da oposição cuja prisão dá início a uma grande crise no país. Filmada na Áustria e na Inglaterra, a minissérie teve a direção dividida entre Stephen Frears (Ligações Perigosas, Alta Fidelidade e A Rainha) e Jessica Hobbs (The Crown). 

Se The Regime seguir o mesmo padrão de sucesso das duas minisséries anteriormente protagonizadas por Kate Winslet para a HBO, a próxima temporada de premiações será uma festa para a atriz. Em 2011, sob direção, roteiro e produção de Todd Haynes, Winslet estrelou Mildred Pierce e ganhou Emmy e Globo de Ouro de Melhor Atriz. Os prêmios se repetiram cerca de dez anos depois com sua atuação na ainda mais elogiada Mare of Easttown, criação do roteirista e produtor Brad Ingelsby. 


UM ROSTO, MUITAS VIDAS

A chanceler ególatra em The Regime, a policial fragilizada em Mare of Easttown e a mãe superprotetora em Mildred Pierce, encontraram em Winslet a forma mais intensa de ganhar vida. E a atriz sempre foi assim, desde quando apareceu para o mundo, aos 18 anos, como uma adolescente perdida em um perigoso mundo de fantasias e repressão. O filme? Almas Gêmeas. O diretor? Um iniciante Peter Jackson.

As jovens mulheres de uma jovem Kate Winslet seguem se equilibrando e desequilibrando entre a fantasia, a paixão e a tragédia. É assim com sua Marianne Dashwood em Razão e Sensibilidade (1995), de Ang Lee; com Sue Bridehead em Jude (1996), de Michael Winterbottom; com sua Ofélia em Hamlet (1996), de Kenneth Branagh; e, finalmente, com sua Rose, a jovem rica que deseja mais da vida, em Titanic (1997), de James Cameron.

Nos anos 2000, após o nascimento de dois dos seus três filhos (Mia é de 2000 e Joe de 2003), um novo e poderoso ingrediente potencializou as escolhas da atriz: a angústia. Foi assim com sua Iris Murdoch em Iris (2011), de Richard Eyre; sua Clementine em Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (2004), de Michel Gondry; com Sarah Pierce em Pecados Íntimos (2006), de Todd Field; com Hanna Schmitz em O Leitor (2008), de Stephen Daldry; e com April Wheeler em Foi Apenas Um Sonho (2008), de Sam Mendes. Winslet ganhou um Globo de Ouro e um Oscar por sua atuação em O Leitor e um Globo de Ouro por Foi Apenas Um Sonho, filme que marcou a única vez que foi dirigida pelo seu então marido, o cineasta Sam Mendes, e o reencontro com Leonardo DiCaprio pouco mais de dez anos após Titanic.

Em uma entrevista em 2014, Winslet afirmou que se conecta com “mulheres que estão buscando a saída para uma situação difícil, procurando por amor, tendo alguma luta dentro do amor, ou questionando as grandes coisas da vida”. Esses interesses continuaram direcionando a escolha por trabalhos da atriz, mas a década de 2010 foi a mais irregular de sua carreira, um tanto porque também priorizou a família (seu terceiro filho, Bear, nasceu em 2013).

Dentro desse turbilhão ainda saíram uma doutora em tempos de pandemia em Contágio (2011), de Steven Soderbergh; uma mulher frustrada no casamento e com problemas alcóolicos em Deus da Carnificina (2011), de Roman Polanski; uma mãe solteira apaixonada por um fugitivo em Refém da Paixão (2013), de Jason Reitman; uma líder tirana em um futuro distópico nos filmes Divergente (2014) e Insurgente (2015), os dois primeiros de uma trilogia; uma executiva de marketing nos primórdios da Apple em Steve Jobs (2015), de Danny Boyle; e uma mulher que queria ser atriz e agora precisa se contentar com um casamento falido e um amante que a traí com a própria enteada em Roda Gigante (2017), de Woody Allen.

Em outra entrevista de 2014, Winslet confessa que as mulheres que interpreta entram em sua vida e não largam fácil. “Ainda tenho dificuldade em me livrar delas”, diz sobre suas personagens. “Eu sei que é apenas um trabalho. Mas é um trabalho que usa suas emoções, todas elas têm que vir de algum lugar, e é difícil simplesmente deixar passar. Eu sei que deveria, mas não consigo. Não posso simplesmente aprender minhas falas e fazê-las, mas talvez seja porque não quero atuar, quero ser. E acho que há uma diferença grande aí”.

Nos últimos anos, com mais tempo pra si, afinal de contas já tem dois filhos adultos, Winslet pôde ser dar ao luxo de produzir e mergulhar na pesquisa para a minissérie Mare of Easttown (2021), fazer narração de documentários, ser uma rainha Na’vi no reencontro com James Cameron em Avatar 2 – O Caminho da Água (2022) e, então, brincar de ser má, inconsequente, irresponsável e criminosa em The Regime. Existem muitas em Kate Winslet e outras tantas virão.

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