quinta-feira, 29 de agosto de 2013

mexidão #33

nunca me identifiquei direito com o humor cearense, talvez porque só tenha vivido lá até os 9 anos. mas quando vi o trailer de cine holliúdy, longa fenômeno de bilheteria dirigido por haldon halder gomes, parece que fiz as pazes, rolou um reencontro. o sotaque, a velocidade da fala, o deboche, as gírias, tudo é familiar e foi uma delícia ver isso retratado em um filme. não assisti ainda, claro, pois a estratégia de lançamento privilegiou o ceará e a partir dessa sexta, 30 de agosto, o resto do norte e nordeste. sul e sudeste, atrasadões, ficaram para depois. enquanto isso, só posso ficar rindo de rachar com o moleque falando "ô cego ignorante" pro personagem do falcão. posso também, como fiz no yahoo, bater um papinho com o diretor desse filme profundamente cearense.



O CINEMA PARADISO DA FULERAGEM

Por essa pouca gente esperava. Uma comédia independente, sem atores famosos, cearense e com legendas (isso mesmo, legendas pra entender melhor o “cearensês”), pode ser o grande sucesso nacional de 2013, desbancando o atual hit do ano, Minha Mãe é uma Peça. Mesmo que fique em segundo lugar, o longa Cine Holliúdy já é um grande vencedor, afinal estreou na semana passada em alguns cinemas de Fortaleza, Sobral, Maracanaú e Limoeiro do Norte e vendeu 43 mil ingressos em apenas 6 dias (45% do total da bilheteria do Estado). São números impressionantes e que prometem aumentar quando o filme de Haldon Halder Gomes estrear, em 30 de agosto, em outras cidades e capitais do Norte e Nordeste (Sul, Sudeste e Centro Oeste ficarão mais pra frente numa interessante e regionalizada nova estratégia de lançamento).

Rodado em seis semanas e com um orçamento de R$ 1 milhão, Cine Holliúdy é a história de Francisgleydisson (Edmilson Filho), um homem apaixonado por cinema que organiza, junto com a mulher e o filho, exibições improvisadas de filmes em uma cidade no interior do Ceará, na década de 1970. A divertida fauna humana da cidade e as confusões geradas por um projetor quebrado completam o quadro dessa comédia escrachada e profundamente cearense. E as legendas servem para outros Estados entenderem palavras como “catrevagem”, “espilicute”, “bonequeiro”, “cangapé” ou expressões como “tenha nervo”, “do tempo que o King Kong era soim” e “chiba nos possuídos”.

Diretor de filmes de ação (Sunland Heat), terror (The Morgue) e drama espírita (As Mães de Chico Xavier), Haldon Halder Gomes batalhou durantes anos para transformar um curta que fez em 2004 (Cine Holiúdy - O Astista Contra o Cabra do Mal) em um longa que homenageasse as coisas que mais ama na vida: o cinema, o humor e sua terra. E agora está feliz “que só uma porra”. Falaí, macho réi.


Como foram as exibições em Fortaleza?
Sensacionais! Todas as sessões esgotadas horas e dias antes, em todos os cinemas e em todos os horários. As pessoas não saem simplesmente satisfeitas - o que já seria excelente -, mas, sim, militantes do filme. Tenho visitado e aberto sessões diariamente nos cinemas da cidade pra agradecer este carinho.

E sua expectativa pra recepção do filme em outras regiões do Brasil, especialmente Sul e Sudeste?
Também espero uma ótima recepção. O filme já esteve em vários lugares do mundo, e andou pelo Brasil, em festivais, e tem encantado por onde passa. É uma história de amor universal, acima de tudo. Muitos críticos o chamaram de Cinema Paradiso Brasileiro.

Em seus filmes anteriores você trabalhou em gêneros (ação, comédia, terror) e temas (espirituosidade) bastante populares. Que cineastas ou artistas são referências no seu trabalho? Que outros tipos de gêneros você gostaria de trabalhar?
Minha vida sempre foi muito intensa e eclética de universos: luta, surf, futebol, artes plásticas, etc. Quero contar histórias com que me identifico, por isso esta pluralidade. Não tenho tantas referências, sou mais de fazer reverências a muita gente e coisas que gosto, como pintura, músicas, filmes, futebol, etc. Isto sempre está presente nos meus filmes. No momento, quero fazer mais comédias de ação, em parceria com a Downtown Filmes,  e, em seguida, um filme autoral, sobre um pintor no fim da vida, Vermelho Monet.

Haldon Halder Gomes no set de Cine Holliúdy; peguei a foto aqui

Ouvi você falando em outras entrevistas que existe uma procura consciente da sua parte pelo público, pela comunicação com a plateia. O que você acha que os brasileiros querem ver na tela? E como lutar contra Hollywood?
Sim, faço minhas pesquisas empíricas de mercado. Procuro nichos latentes e seus anseios. O cinema nacional precisa saber se posicionar e compreender sua diversidade cultural e regionalização em virtude de suas dimensões continentais e populacionais. Cine Holliúdy está aí pra mostrar ao cinema nacional independente como enfrentar Hollywood.

O que você aprendeu nos seus anos de Estados Unidos em termos de produção e comunicação?
Uni meus conhecimentos em administração de empresas e especialização em marketing a aplicação no cinema, como produção e lançamento. Pude aprender o que eles fazem de melhor e aplicar à nossa realidade, com precisão e cadeia produtiva, sem perder a autoralidade.

O Ceará é muito conhecido por seu humor e seus humoristas. Como você descreveria o humor cearense?
O humor cearense é diferenciado devido a nossa capacidade de saber rir de si, de não ter barreiras para a piada sem medo de perder o amigo. Este exercício diário de humor aguçado nos deixa mais criativos e com timing perfeito pro humor. Tanto é que no Ceará não existe bullying. Nós temos o anti-bullying, que é uma expressão local que diz “Aí dentu!”. Assim, todo mundo tira onda com todo mundo, e assim vivemos um show de humor no cotidiano.

com vocês, o curta cine holiúdy - o astista contra o cabra do mal.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

jovem guarda cigana

dia desses apareceu no exystence um disco impressionante. stand up, people: gypsy pop songs from tito’s yugoslavia 1964-1980 reúne, em 19 faixas, uma ampla perspectiva de como a música cigana foi sendo incorporada e mudando a música pop do leste europeu em parte do século passado. tudo caminhava lindamente, várias músicas bem boas, mas a última faixa dessa coletânea fez todo o resto parecer brincadeira de criança. fui descobrir depois que "djelem, djelem" é considerada um hino por parte do povo cigano e que o compositor zarko jovanovic escreveu sua letra em 1949 a partir de uma melodia tradicional (tem tradução em português aqui). a grafia do título e partes da letra mudam conforme o dialeto cigano e por causa disso existem muitas versões. mas a que está no stand up, people é simplesmente sensacional. escuta só.



gravada originalmente em 1968 por um grupo que teve vida curta ali entre o final da década de 1960 e início dos anos 70, essa "djelem, djelem" é uma deliciosa jovem guarda psicodélica. olha a capa estilosa mediterrânea do EP de onde essa música foi tirada.


mas, como disse, existem muitas versões que vão desde a instrumental do hot club of belgrade até o jazz latino de vlada maricic trio & friends, passando pela célebre kocani orkestar, e por cantores tradicionais como a impressionante esma redzepova e pelo ligeiramente cafona saban bajmarovic. para se ter ideia da importância de "djelem, djelem", a música fez parte de um dos melhores filmes ciganos já feitos, i've even met happy gypsies (1967) de aleksandar petrovic. sente o drama...

mexidão #27

uma das minhas obsessões desse ano foi o documentário the act of killing, de joshua oppenheimer. achei duas versões nos torrents da vida - a mais recente com cerca de meia hora a mais -, vi e revi inúmeras vezes, absolutamente assombrado com a história e com o corajoso formato do filme (não foi a toa que dois grandes cineastas, errol morris e werner herzog, entraram como produtores executivos do filme). nesse texto que fiz pro yahoo toquei em algumas das muitas discussões levantadas pelo filme, mas tem mais, muito mais...


O MAL, ESSE BANAL

Impressionante como as pessoas não percebem o tanto de maldade que carregam por aí. Recentemente, o assassinato de MC Daleste durante uma apresentação em Campinas gerou uma enormidade de comentários do tipo “tem que morrer mesmo!” (por ser funkeiro ou por ter feito proibidões no passado ou por ser da periferia, ou por tudo). Claro que nem todos que falaram coisas assim na internet são assassinos em potencial, mas só o fato de darem tão pouca importância para uma vida, qualquer vida, é um sinal alarmante de que a coisa não anda nada bem. Porque a história é a seguinte: se você acha que outra pessoa deve morrer é porque você não a considera igual. É menor, não é gente como você, não é nem gente.

Lembrei-me dessas reações à morte de Daleste ao assistir, entre calafrios e assombros, o documentário The Act of Killing (2012). Em cartaz nos Estados Unidos, Holanda, França e Reino Unido (e espero que saia pelo menos em DVD ou VOD aqui; caso contrário só nos torrents), o extraordinário longa de Joshua Oppenheimer é uma porrada na cara e logo de início dá a letra de sua proposta perturbadora.

“Em 1965, o governo da Indonésia foi deposto por militares. Qualquer um que se opusesse à ditadura militar poderia ser acusado de ser comunista: sindicalistas, agricultores sem terra, intelectuais e chineses. Em menos de um ano, e com a ajuda direta de governos ocidentais, mais de 1 milhão de ‘comunistas’ foram mortos. O exército usou grupos paramilitares e gangsters para darem conta da matança. Estes homens estão no poder e perseguem seus oponentes desde então. Quando nos encontramos com os assassinos eles contaram, com orgulho, histórias sobre o que fizeram. Para entender o porquê pedimos a eles que criassem cenas sobre os assassinatos do jeito que bem entendessem. Este filme segue este processo e documenta suas consequências”.


Os assassinos de 1965 estão hoje com pouco mais ou menos de 60 anos. Todos pais, avôs, religiosos, geralmente fanfarrões, ocasionalmente carinhosos e absolutamente normais como Anwar Congo, o personagem central do filme. Durante as pouco mais de duas horas de The Act of Killing, Anwar e outros colegas e amigos fantasiam o passado sangrento de seu país a partir de clichês do cinema hollywoodiano, de musicais a faroestes, de filmes de guerra a policiais (na verdade, mantém a versão oficial da luta dos justiceiros do bem em nome da ordem militar contra os comunistas maus). Ao mesmo tempo, nos bastidores e em conversas entre si, são confrontados com a própria crueldade e violência que protagonizaram naquele tempo (alguns mataram centenas com as próprias mãos).

“Se conseguirmos fazer esse filme [com realismo] o que vai acontecer é que vamos acabar mostrando que na verdade nós é que fomos os cruéis e não os comunistas. (...) É uma questão de imagem”, diz Adi Zulkadry, outro personagem importante do filme e o mais brutalmente consciente dos crimes do passado (“Matar é algo rápido. Depois é só se livrar dos corpos e voltar pra casa”). Fala que não se sente culpado porque “crimes de guerra” são definidos pelos vencedores e ele é um vencedor, portanto ele pode criar a definição que achar melhor. 

 Assassinos e atores: Adi Zulkadry e Anwar Congo sendo maquiados

Anwar Congo não consegue mais manter a frieza de outrora e com o decorrer das filmagens vai se abalando com a lembrança de tanto sangue nas mãos. Confessa que tem pesadelos recorrentes e teme os espíritos dos mortos e os olhares de suas vítimas. Diz que teve que matar, que foi sua consciência que o mandou, e não consegue explicar mais nada. Engasga, quase vomita.

“Acho que ao se identificar com Anwar, o espectador é forçado a ser confrontar com o fato de que estamos mais próximos de ser assassinos do que gostamos de acreditar”, disse o diretor Joshua Oppenheimer em entrevista ao site Inside Indonesia.

Anwar Congo, Adi Zulkadry e outros personagens de The Act of Killing mataram milhares na Indonésia por razões distintas. Uns foram em busca de poder financeiro e/ou político, uns por puro sadismo, e outros obedecendo a ordens superiores (seguindo a teoria da “banalidade do mal” de Hannah Arendt), para ficarmos apenas em alguns exemplos. Mas todos consideravam que os assassinados não eram gente o bastante para viver. Não eram nem gente. Eram exatamente o contrário deles, pessoas normais.


Epílogo jornalístico

Em determinado momento do documentário surge a figura de Ibrahim Sinik, editor do maior jornal do norte de Sumatra (a maior ilha da Indonésia) e amigo de políticos poderosos de ontem e hoje. Sobre seu papel como imprensa nos sangrentos eventos de 1965 e 1966 diz que coletava informações e comandava interrogatórios. “Independente de qualquer pergunta que fizéssemos, a gente mudava as respostas pra fazer com que eles parecessem maus. Como jornalista meu trabalho era fazer com que as pessoas odiassem eles [comunistas]”, relembra e logo completa, sem disfarçar certo orgulho, que bastava uma piscadela sua para que o interrogado da vez fosse levado para o matadouro de Anwar Congo & Cia.

Moral dessa história? Toda imprensa que está aliada ao poder (situação, oposição ou iniciativa privada) e não aos seus leitores se comporta da mesma forma.



p.s.: Para quem lê em inglês vale muito a pena encarar “The Murders of Gonzago - How did we forget the mass killings in Indonesia? And what might they have taught us about Vietnam?”, texto de Errol Morris, diretor do oscarizado Sob a Névoa da Guerra (2003) e um dos produtores executivos de The Act of Killing. Mais um destaque para a ótima entrevista em vídeo da Vice com Morris e outro entusiasmado produtor executivo do documentário, o cineasta Werner Herzog, de O Homem Urso (2005).

terça-feira, 20 de agosto de 2013

diversão é solução sim

"nós estamos aqui no mappin pra curtir aquele som, pra achar aquele som que nós queremos curtir. todo mundo. não só os negro, como os branco, os mulato. nós queremos curtir o jazz, queremos curtir o pop, o samba, o rock. todo mundo quer curtir aquele som, vc entende? nós viemos aqui pra achar aquele meio social que nós queremos curtir, aquele salão. um determinado lugar que você se sente bem, que você se sente gente... não que você vegeta! você quer sentir, você quer sentir gente", depoimento dessa moça da imagem abaixo e que tá no documentário feito por mano brown para o dvd 1000 trutas, 1000 tretas (2006).



era no calçadão do falecido mappin, em frente ao teatro municipal de são paulo, que no início dos anos 1970 a moçada fazia a divulgação das festas black da cidade.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

mexidão #24 e #31

entre inúmeros passaralhos e algumas novidades, o jornalismo brasileiro tem sido alvo de muitas e importantes discussões. tratei do assunto recentemente em duas colunas no yahoo. no final de junho entrevistei o colega bruno torturra sobre a mídia ninja e agora no início de agosto tratei das demissões que chegaram a editora abril (com direito a várias revistas fechadas como a bravo). resolvi reunir os dois textos aqui no esforçado e ainda acrescentei o programa roda viva, que foi ao ar ontem e entrevistou torturra e pablo capilé (fora do eixo).


JORNALISMO EM FOGO CRUZADO

São Paulo, 18 de junho de 2013. Duas horas após um grupo de alucinados tentarem invadir a Prefeitura de São Paulo, o Choque da PM do governador Geraldo Alckmin chegou ao centro da cidade e foi subindo até a Avenida Paulista expulsando todo mundo da rua com bombas e gás. Quando chegaram ao cruzamento da Paulista com a Rua da Consolação encontraram um painel da Coca Cola em chamas e o cercaram. Ninguém mais pode se aproximar a não ser dois catadores de latinha que fizeram a festa com os restos do painel-propaganda.

Belo Horizonte, 26 de junho de 2013. Dez minutos após a PM do governador Antônio Anastasia expulsar com bombas e gás centenas de manifestantes que estavam pacificamente na Praça 7 de Setembro, um trio elétrico aparece. Nada de Daniela Mercury ou Ivete Sangalo, e sim o Comandante Xuxa (sim, esse era seu nome) da PM mineira com o microfone na mão a falar que a polícia estava devolvendo a cidade às “pessoas de bem nesse momento histórico de resgate da democracia”.

Quem acompanhou ou está acompanhando as manifestações que tomaram o país neste junho pela mídia tradicional nem chegou perto dessas aparentemente pequenas, mas muito reveladoras, cenas brasileiras. Bem, pra falar a verdade, quem está acompanhando as manifestações pela mídia tradicional não está sabendo de muita coisa além de “pequeno grupo de vândalos” ou “a PM jogou bombas de efeito moral para conter a manifestação” e um bando de análises chutadas de especialistas que não tem a mínima ideia do que está acontecendo.

O pessoal da mídia Ninja também não sabe o que está acontecendo, mas eles estão cobrindo as manifestações em várias cidades com disposição, sangue frio e interesse, e tudo ali de muito perto da ação em transmissões ao vivo e sem cortes pela internet (vi as cenas descritas no alto do texto durante as transmissões). É, sem sombra de dúvida, o mais interessante acontecimento jornalístico desses novos tempos. Daí que fui conversar com o jornalista Bruno Torturra (@torturra), um dos idealizadores e linha de frente do Ninja, sobre a origem, os métodos e a assumida não-neutralidade da cobertura que estão fazendo dos protestos Brasil afora.

Belo Horizonte, 26.06.13 [foto: Mídia NINJA]

Você pode contar um pouco da história do surgimento (quando, como) da mídia Ninja e qual seu propósito. E quais outras coberturas importantes que vocês fizeram nesse período de existência.
O Ninja vem sendo pensado e articulado nos bastidores há alguns meses a partir da experiência da postv.org e de coberturas fotográficas pontuais que fizemos em rede. Antes de ser um veículo, começou como a tentativa de pensar e experimentar uma rede de jornalismo independente e descentralizada. Recentemente, no texto “O Ficaralho”, fizemos um chamado público para uma reunião aberta para a apresentação de um projeto e da criação de um banco de colaboradores. No dia da reunião [13 de junho], com mais de 300 confirmados, tivemos que adiá-la por conta do protesto do Passe Livre que terminou sendo o mais reprimido pela PM. Em vez de lançá-lo como um projeto, o Ninja acabou se lançando como um veículo na rua naquele dia. Outras coberturas importantes que fizemos: o Fórum Social Mundial na Tunísia, o julgamento dos acusados pelo assassinato de Zé Cláudio e Maria em Marabá. A cobertura de conflitos entre fazendeiros e povos indígenas no Mato Grosso. Os blocos de rua de SP e algumas cidades do Brasil. E incontáveis marchas e protestos pelo país.

Essas manifestações certamente estão sendo uma prova de fogo (tecnológica e conceitual) para vocês. O que estão aprendendo? Quais os acertos? Houve erros?
Aprendendo, como sempre, fazendo. A grande tecnologia Ninja é a recusa a dizer que "não vai dar". Todos os recursos, digitais e analógicos, podem ser utilizados para cobrir algo na rua. Os maiores acertos do ponto de vista técnico foram as construções e gambiarras cada vez mais portáteis e eficazes de transmissão de vídeo e fotos em tempo real. Do ponto de vista humano, a grande diferença é a disponibilidade 24hs dos envolvidos, a disposição de entrar no meio da ação e a base da articulação de colaboradores no país todo. Erros sempre acontecem. Desde deslizes técnicos a vacilos editoriais, comentários inadequados ou informações que poderiam ter sido melhor apuradas.

Você vê similaridade, na estrutura horizontal, entre a Ninja e movimentos sociais novos como o MPL?
Difícil responder por que não conheço bem o MPL por dentro. Talvez sim. Mas horizontalidade não é um conceito bem definido, nem homogêneo para nos compararmos com eles. Temos o maior respeito e admiração pela capacidade, maturidade e pelos argumentos do movimento passe livre. Mas, olhando de fora, vemos nosso trabalho mais como complementar, dentro de uma grande atualização dos processos políticos e de comunicação do que uma similaridade estrutural.

Já vi críticas à cobertura Ninja por sua “parcialidade”. O que você acha dessa crítica?
Entendo de onde vem a crítica, mas acho, no geral, um pouco equivocada. Nosso ponto de vista, nossa suposta parcialidade é, antes de tudo, assumida. Emitir uma opinião não pode significar, na era da rede, uma quebra da objetividade. Pelo contrário, cada vez mais ser subjetivo é ser objetivo também. Ser “neutro” diante de situações que consideramos injustas não é ser objetivo, é ser omisso. Mas me recuso a aceitar que somos tendenciosos. Basta ver nossa política de não edição. Transmitimos ao vivo, sem corte, direto da rua, dialogando e dando absoluta liberdade de expressão a todos os envolvidos nos protestos. Dos militantes de partidos, aos cidadãos de verde e amarelo, aos fascistas quase assumidos, aos policiais.

Qual sua avaliação pessoal desse momento no Brasil?
Antes de qualquer conclusão, acho que o mais importante nesse momento é a profunda ativação do pensamento político no país. Dos mais sofisticados pensadores ao mané mais despolitizado. O campo está aberto e todo mundo deu as caras na rua e na rede. É uma grande terapia coletiva ainda longe de acabar. Não me arrisco a grandes interpretações nesse ponto, mas sinto que é algo essencialmente bom. E que vai fortalecer, principalmente, os movimentos e organizações que trabalham causas e políticas quando a temperatura estava mais baixa.

Quantas pessoas estão envolvidas nas operações Ninja de cobertura das manifestações?

Difícil responder, já que pelo país muita gente está ajudando na cobertura colaborativamente. Mas existe um núcleo mais ativo em São Paulo e algumas capitais. Esse núcleo, que já estava trabalhando antes dos protestos começarem, e do Ninja ganhar tanta exposição, é de umas 10 ou 15 pessoas.

Belo Horizonte, 26.06.13 [foto: Mídia NINJA]

JORNALISMO TÁ MORTO?! TÁ NADA!

Pouco mais de dois anos atrás o jornalismo brasileiro começou a sofrer regulares ataques cardíacos. Também conhecidos como “passaralhos”, essas demissões em massa atingiram grandes empresas como as editoras Globo e Trip e os jornais Folha de S. Paulo e Estadão (do falecido Jornal da Tarde). Então, logo após a morte Roberto Civita em maio, o tsunami da crise chegou aos costados da Editora Abril. Em junho alguns executivos foram demitidos e entre ontem e hoje a tal “reestruturação” anunciada mostrou sua cara feia: foram encerradas as revistas Bravo, Alfa, Lola e Gloss, bem como os sites da revista Contigo e o abril.com.

As mais de 150 demissões previstas por esses dias alcançaram também as redações das revistas Info, Recreio, Contigo, Quatro Rodas, Viagem & Turismo, Placar, Men´s Health, Claudia e Veja, o portal M de Mulher e o site Bebê.com.

“A Abril encara esta fase como parte da evolução natural dos negócios e segue com a missão de difundir a informação, com excelência editorial, pioneirismo e integridade”, afirmou Fábio Barbosa, presidente da Abril S.A., em comunicado oficial & surreal. Claro que nem ele nem outros grandes executivos de empresas jornalísticas explicam como é possível ter excelência editorial com redações muito menores e profissionais sobrecarregados ou ganhando menos.

Precarizar a profissão jornalística é um caminho sem volta e quem perde mais com isso são justamente a credibilidade da informação e os leitores (esse caminho de mão dupla que é a essência do trabalho). Mas executivos não ligam para detalhes tão pequenos de nós todos e muito menos para os profissionais que estão na rua. Vivem de números, perdem aqui e ganham acolá, e bem podiam comandar a Comunicação de uma empresa farmacêutica ou o marketing de um banco, tanto faz.


Claro que existe uma crise no mercado e que ela tem atingido com mais contundência o jornalismo impresso que o televisivo, só que tantas demissões podem ser melhor explicadas por uma mistura de mau gerenciamento, soberba, investimentos errados, falta de visão estratégica, imediatismo e obsessão cega pelos anunciantes (Será que os anunciantes tão bajulados, e ocasionalmente intrometidos na linha editorial, continuarão juntos de um jornalismo cada vez mais raquítico?).

O jornalismo é maior que empresas jornalísticas e certamente sobreviverá a muitas delas. Para sorte de quem vive e ama a profissão, a boa notícia é que o jornalismo está se reinventando às próprias custas. Às vezes em coletivos independentes como a Pública – Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo, o Centro de Mídia Independente ou a Mídia Ninja e também dentro da grande imprensa por profissionais sérios e dedicados (de todas as gerações).

Vivemos também um momento no qual novas ferramentas jornalísticas estão disponíveis para todos, possibilitando que cada um crie seus próprios paradigmas de informação e comunicação (Não gosta da Folha? Não gosta da Mídia Ninja? Seja você mesmo sua mídia!). E isso é bom, caótico, transparente e renovador.

Tudo isso junto fará diferença para o futuro do jornalismo (além de pensar novas formas de negócio, obviamente) e não abraços simbólicos em homenagem a patrões.

p.s.: em 5 de agosto, o programa roda viva (tv cultura) entrevistou bruno torturra e pablo capilé sobre a mídia ninja.

sábado, 3 de agosto de 2013

emicida, racionais, kanye west & jay z,
ou o rap é grande

passamos agora da metade desse muy loco 2013 e me dei conta, após assistir o excelente vídeo de "picasso baby" do jay z, que mais uma vez o rap é a música/cultura mais relevante e poderosa da atualidade. lembrei imediatamente de outros videos que bateram forte este ano, desde a crueza do lamento documental sambístico de emicida em "crisântemo" - e o paulistano lançara agora em agosto, seu primeiro disco, o glorioso retorno de quem nunca esteve aqui - até a apresentação histórica dos racionais na virada cultural em são paulo.





realidade, transformações, misturas, é o rap quem está cantando e está mais próximo de tudo que realmente importa hoje em dia. os exemplos aqui e no mundo são muitos e das mais variadas gerações, nem adianta fazer lista (deixa isso pro fim de ano). mas seguem aqui o vídeo de "picasso baby" (uma das melhores músicas do ótimo magna carta... holy grail) e a apresentação ao vivo de kanye west e sua potente "new slaves" no programa saturday night live. essa música está no mais recente disco de kanye, o estranho e interessante yeezus.