foi mais ou menos assim. saí da editora globo, na zona oeste de são paulo, sem almoçar e após dar a última lambida na edição de julho da revista monet, que tinha acabado de ir para a gráfica. peguei o carro e fui rumo a sede paulista da tv record para encontrar marcos mion, que só tinha aquela tarde de quarta disponível para uma entrevista (era um frila para a capa da edição de julho da revista voetrip). cheguei uns 20 minutos adiantado, tudo tranquilo. mas a poucos metros do estacionamento um micro ônibus apareceu do nada e rasgou/amassou a lateral esquerda do meu carro (o silvera). foi mais ou menos assim que cheguei para entrevistar o mion, de pernas bambas, com fome e nervoso com todo o processo pós-sinistro. mas deu tudo certo que eu sou profissional e não desisto nunca. ah, nessa pauta - que segue aqui na versão integral, a que mandei pro pessoal da voetrip - estive mais uma vez com o fotógrafo & bróder jefferson dias.
MARCOS MION NÃO É MAIS AQUELE
Ele parece muito seguro. Certamente está feliz. Do alto de seus 31 anos, casado e pai de três filhos (dois meninos e uma menina), Marcos Chaib Mion entrou em uma nova fase da vida com a estreia de Legendários. O programa, que vai ao ar nos sábados à noite na TV Record, vem conseguindo manter um sólido segundo lugar desde que estreou no início de abril. Mas dessa vez ele não é apenas um rostinho bonito e uma presença divertida na telinha. Co-idealizador de Legendários, Mion agora está presente em todas as fases da produção, sabe de tudo, e sente na pele o frenesi do sobe-e-desce da audiência durante a exibição do programa, que é ao vivo. Dez anos após ter estourado na MTV com o anárquivo e jovem Piores Clipes do Mundo, o paulistano sentiu a necessidade de falar com um público mais amplo, de todas as classes e idades. "É a maturidade", confirma o ator, apresentador e homem de negócios em seu sóbrio escritório sem janelas. Mas ali em um canto, em cima de um aparelho de DVD, um grupo de bonequinhos coloridos pode até jurar que esse pai de família ainda tem muito o que aprontar na televisão. Confira abaixo uma entrevista exclusiva onde Marcos Mion fala de seus primeiros passos artísticos, sua paixão pela televisão e dos novos desafios que vem enfrentando com o bom humor de sempre.
Quando você considera que foi o teu início na carreira artística?
Foi quando entrei pela primeira vez no Teatro Escola Célia Helena e comecei a estudar teatro. A princípio, mais por curiosidade, sem saber ao certo no que isso ia dar. Óbvio que eu era do tipo de moleque que fazia todas as peças na escola e só queria fazer se fosse o protagonista [risos]. Sempre fui esse tipo de pessoa acostumado a fazer com que as pessoas me ouvissem. Naturalmente. E aí entrei no Célia Helena com uns 14, 15 anos. Foi uma grande sacada da minha mãe. Mãe, né? Conhece a gente melhor que a gente mesmo imagina. Foi ela que sugeriu que fosse lá ter aulas de teatro, que ia me fazer bem. E realmente foi amor à primeira vista. Nas primeira conversas que tinha um novo mundo possível ali, um mundo de faz-de-conta no qual poderia ser qualquer coisa, contar qualquer história e viver qualquer vida. Isso me fascinou muito. Mas não era um curso profissionalizante. Era uma vez por semana pra brincar, pra perder a timidez de falar em público, então tinha gente de todas as idades. Fiz o curso, era de 6 meses, e logo emplaquei outro, mais 6 meses. Foi nessa segunda vez que conheci e tive aula com a Ligia Cortez, filha da Célia Helena com o Raul Cortez e diretora do Teatro Escola. Nessa época eu estava com muitas questões na cabeça, começando a descobrir muita coisa, e foi ela que me incentivou a fazer o curso pra valer: 3 anos, carga horária, diploma, etc. E eu fui, acreditando nela. Na verdade, mais acreditando nela que em mim mesmo.
E como foi o curso?
Uma loucura. Pirou minha cabeça porque vi que o palco era como uma casa pra mim. Quando chegou no final do curso era época de prestar vestibular e começaram a pintar uma dúvidas, porque minha família toda é de médicos e nunca me faltou nada. Se fosse por ali tava garantido, mas por outro lado tinha essa história que era minha paixão. Quando chegou a hora de entregar a papelada da inscrição tava tudo preenchido, menos a opção do curso. Fui com a minha mãe e ficamos conversando, conversando. Estava na dúvida entre Medicina ou Filosofia, que era pra poder interpretar melhor os textos, entrar em contato com a psique dos personagens, e ser um melhor ator. Quando chegou a minha vez respirei fundo, preenchi Filosofia e entreguei pra Deus. Fiz três semestres e logo depois comecei a trabalhar.
No programa Sandy & Júnior...
Pois é. Na minha peça de formatura no Célia Helena apareceu uma diretora de elenco da TV Globo que acabou me chamando. Ela foi no domingo e na quarta eu já estava na Globo vendo cabelo, figurino, e nunca mais parei. Quer dizer, fiquei só no primeiro ano do Sandy & Júnior e logo depois fui pra MTV. Aliás, essa história é muito louca porque bati na porta da MTV antes de ir pra Globo. Sempre quis trabalhar na MTV, era realmente um sonho, porque cresci com a MTV, era uma linguagem que entendia. Por ser moderna, passar mensagens, ser consciente, ser ativa, por mexer com os jovens. Enfim, fiz um teste e foi muito legal, mas no momento eles não estavam contratando ninguém. Aí a Globo me chamou. Ainda tive o momento de ligar pra MTV e falar - "olha, a Globo tá me chamando" [risos] -, mas eles estavam precisando de uma mulher porque foi na época que a Astrid Fontenelle saiu. Quase um ano depois, quando estava pra acabar o contrato com a Globo, liguei de novo pra MTV. Poderia ter assinado por mais um ano, mas aí foi quando o Cazé Peçanha saiu. Foi minha deixa pra entrar na MTV.
Você teve algum conflito por deixar de atuar para ser um apresentador quando entrou na MTV? Claro que também existia uma representação, mas no caso o personagem era você mesmo, né?
Duelei muito internamente com isso. Do mesmo jeito que foi na Globo de fazer uma série. Porque me formei fazendo Antígona do Sofócles com o Marco Antônio Rodrigues, o diretor mais vertical, mais casca-grossa que poderia existir, e fui fazer Sandy & Junior três dias depois, entendeu? [risos] Quer dizer, é preciso estar aberto para o universo pop, coisa que não acontece muito com as pessoas do teatro. Mas na MTV sofri menos porque era o meu sonho. E tem outra... quando cheguei na MTV já tinha uma opinião formada sobre o que tava faltando na programação, o modo como queria atuar. O teste que fiz já era o Piores Clipes do Mundo, porque era uma coisa que sentia falta, uma molecagem, uma coisa questionadora. Então deu super certo. Sempre pensei em como queria atuar de acordo com o canal, com a situação, etc. Larguei a interpretação clássica, mas fui me virando com o que tinha na mão e criando tipos.
Mas esse teu personagem criado na MTV, e que de outra forma esteve também na Bandeirantes e na volta à MTV, mudou com o decorrer do tempo?
Esse personagem que criei - que é o cara que fala o que todo mundo quer falar, mas não tem coragem, que tira sarro, que é questionador, que é esse do Piores Clipes do Mundo - realmente foi um acerto e caiu como uma luva pra MTV. Poderia fazer ele por anos e anos porque é muito real pra mim. Ele na verdade sou eu com 15, 16 anos [risos]. Pra colocar um boné e falar atrocidades é um segundo pra mim. É muito orgânico. A primeira vez que não me pauto por ele está acontecendo agora com o Legendários, porque o objetivo aqui é atingir um público maior, de todas as idades, de todas as classes. O desafio é outro. Esse personagem que fiz na MTV não fala com 10 pontos de audiência. Ele é mais segmentado. Mas trago comigo e vou me adaptando conforme as situações. Se precisar ele volta.
Então foi uma necessidade tua dar uma pausa nesse personagem?
Foi sim. Porque o que mantém um artista vivo é o desafio. É acreditar que você tem que sair da sua zona de conforto. Porque eu tava querendo falar com um público mais próximo da minha idade, dos meus amigos, e também assuntos mais variados e não só do universo pop. Senti a necessidade de dar esse passo e de ampliar meu público.
Chega a ser uma frustração não trabalhar como ator?
Não, porque me apaixonei pela televisão e vi que ela é mais carente do que o teatro, na verdade. Não de verba, claro. Mas de alma e de gente apaixonada pelo meio. Eu me identifiquei muito com esse meio e sempre quis fazer diferença nele. Trabalhei em algumas peças de teatro, com gente que admiro muito, e que fizeram sucesso. Isso, de certa forma, aplacou minha frustração. Então, agora esse é o meu negócio. E é um desafio gigantesco, e que nunca acaba. Porque posso ser líder uma semana, mas essa minha liderança dura sete dias, né? Então é uma estreia semanal, um desafio que te consome absurdamente. No teatro, apesar de um dia ser diferente do outro, é mais garantido, porque você sabe onde o povo vai rir, ou melhor, onde existe a maior probabilidade deles rirem. Sabe quantas pessoas esperar na plateia. Aqui toda semana é uma loucura.
Chegamos ao Legendários. Nessa transição entre MTV e Record, já existia a ideia do programa ou foi algo que se construiu depois que você foi contratado pelo Record?
A essência do programa veio depois. Quer dizer, nunca chego de mãos abanando. Gostaria de fazer um programa de humor, porque é algo que sei fazer muito bem. Tinha essa vontade, mas não sabia como poderia ser, principalmente porque não conhecia a emissora à fundo. Só depois que entrei que fui saber melhor de como são as coisas por aqui... o código de ética, o padrão de qualidade. Aí esse programa de humor foi se adaptando e virou o que é o Legendários hoje, que não é um programa de humor, e sim de entretenimento baseado no humor. Acho que a gente é mais Fantástico do que Casseta & Planeta, Pânico ou qualquer coisa.
Já tinha ideia da faixa de horário, essas coisas?
Isso foi uma loucura. A gente começou com um programa de 2 horas durante a semana. Aí pesquisa, pesquisa, pesquisa, e a gente chegou a conclusão que era um programa pra terça ou quinta. Mas esses dias são as faixas de reality shows da Record, que eles já vem trabalhando há muitos anos pra consolidar. Tirando isso, nossa melhor opção era apostar no sábado. Porque faz tempo que não tem um programa ao vivo no sábado e o Zorra Total tá lá há muitos anos como única opção. E apesar dos humoristas do Zorra serem muito bons e saberem falar com o publico brasileiro na veia, acredito que tenha uma certa saturação em cima do programa. Não conheço ninguém que fale: "Nossa, é sábado! Vou ver Zorra!" [risos] Imaginamos que seria um lugar legal pra entrar e pegar essa fatia do mercado. Então nos instalamos no sábado com 1h20 de duração. Mas tenho elenco pra um programa de 2 horas.
E agora que você está com um programa maior e mais por dentro da produção dele em todas as etapas... como é agora a batalha da audiência pra você?
Essa pressão é real, existe. Estamos numa emissora que é a segunda do país e audiência é um parâmetro pra vários aspectos, tanto de anunciante quanto de imprensa e tudo mais. E a gente tem uma preocupação muito grande de falar com todo mundo. Vejo o Legendários como um supermercado. Tem que agradar todo mundo. Ninguém sai insatisfeito de um supermercado. Sempre se acha alguma coisa. Você pode não achar no primeiro ou no segundo corredor, mas acha no quarto e no quinto. Então a gente trabalha focando em todos os públicos e todas as idades, e nossa audiência tem sido boa.
Você acompanha a medição de audiência durante o programa?
Sim, acompanho. Essa é uma das motivações pra ter o programa ao vivo, pra poder mexer nas estratégias. A gente sai daqui com um espelho, um roteiro que é sempre concluído meia-hora antes do programa ir para o ar. Aí chega lá e... muda tudo. Por exemplo, muda de acordo com a hora que novela da Globo vai acabar. Aí a gente troca uma matéria por outra, e vai vendo, porque sabemos que quando a novela tá no ar a gente demora a pegar. A novela acabou? É a nossa hora. Se a audiência tiver boa, a gente segura o break e joga mais pra frente. Uma loucura.
Isso é novidade pra você.
É novo. Nesse grau de intensidade é totalmente novo. Mas é que nem jogar na seleção brasileira, entendeu? Quando termina um programa e as estratégias deram certo é como marcar um gol contra a Argentina. É a melhor coisa do mundo.
Logo depois do início do programa houve uma certa polêmica na internet desqualificando o programa porque fazia um "humor do bem". Como surgiu isso?
O Danilo Gentilli [do CQC] criou esse termo pra dar uma queimada. Olha, mas uma das coisas boas do Legendários é que pela primeira vez houve uma união entre o Pânico e o CQC [risos]. Isso foi bacana. Os dois mega-concorrentes se uniram contra um novo “inimigo”. Mas no final das contas a gente deu risada. Assim, quando comecei a conhecer a emissora, o público, as expectativas eu vi que era o caso de fazer uma coisa que tem muito mais a ver comigo hoje em dia. Sou pai de família, tô em outra pegada, penso muito mais no mundo pelo viés dos meus filhos, no povo mesmo. Televisão hoje em dia é educação. Tem uma grande parcela do país que se educa pela televisão. Então comecei a sair disso de fazer um programa de humor como o Pânico ou CQC e tentar uma vertente diferente. Não melhor, nem pior, só diferente. E o que fazia sentido pra mim? Fazer um programa positivo. Fazer um programa "do bem". E foi daí que surgiu essa história. Eu não quero que o cara ligue a TV no sábado a noite e veja um cara sendo humilhado, pessoas rindo da cara do povo ou apelando. Quero uma coisa que passe uma mensagem legal e que ao mesmo tempo fale pra toda família brasileira mesmo, entendeu? Que a avó e o neto possam assistir, conversar e gostar. Então começou essa história de fazer um programa positivo, que tivesse assistencialismo, que tivesse sustentabilidade, e tem humor também. Tem todo um leque. Eu não quero rir das pessoas. Eu quero rir com as pessoas. Isso gerou uma reação em alguns colegas que se apressaram pra tentar pixar o programa. Mas muito disso aconteceu só na internet, não chegou no povão não. Enfim, não criei esse termo, mas visto ele com o maior prazer. Porque uma piada não é apenas uma piada, tudo tem uma consequência. Não dá pra ser isento. Isso tem a ver com maturidade, com paternidade, com ter um conhecimento maior sobre o povo. É sair do microcosmos.
A vida do Legendários tá começando agora, tem pouco mais de dois meses. O que você planeja pro futuro dessa criança?
Tenho contrato com a Record até 2015 e acho que o Legendários terá uma vida longa, principalmente pela diversidade de assuntos que pode e deve abordar, porque a gente pode ir moldando ele de acordo com o que tá acontecendo no país.
Você sente falta de algo na televisão? Ou de algo que você ainda não fez?
Ah, quero fazer muita coisa ainda. Vendo os profissionais que estão na ativa hoje eu tenho mais uns 40 anos de TV, pelo menos [risos]. Dá pra fazer muita coisa.
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