terça-feira, 31 de julho de 2012

o corpo ainda é pouco

no meio dessas novas correrias na istoé esqueci de colocar o último frila que fiz antes de ir pras bandas da lapa de baixo. foi pra revista voetrip esse perfil dos quatro titãs restantes na atual conjuntura 2012, com um pé no passado (reedição luxuosa do clássico cabeça dinossauro nos 30 anos de estrada) e olhos no futuro (começando disco novo, mas ironicamente o site oficial está surrealmente desatualizado). e na urgência de tudo e todos foi por email mesmo. paciência, iracema, paciência. de resto, as fotos que ilustram essa postagem são reproduções celulares de detalhes dos retratos feitos por kiko ferrite.


O PULSO AINDA PULSA

No começo eram nove. Ficaram famosos como oito. Mas agora, 30 anos após seu nascimento, os Titãs são quatro. Não é pouca coisa no eternamente jovem mundo do rock, principalmente se for levado em conta que o grupo segue produzindo material novo e lotando shows. Por essas e outras, os titânicos Paulo Miklos, Sérgio Britto, Branco Mello e Tony Bellotto estão comemorando a data redonda em alto estilo com a reedição, e consequentes apresentações, de Cabeça Dinossauro (1986), o terceiro e mais célebre de todos os trabalhos dos paulistanos.

“Vamos fazer a turnê do Cabeça Dinossauro neste primeiro semestre e, no segundo, seis shows com os ex-Titãs Arnaldo Antunes e Charles. Gavin. O Nando Reis não tem disponibilidade de datas. Para 2013 estamos preparando um disco de inéditas, rápido e pesado, mas com uma certa brasilidade. Um cruzamento entre Cabeça e Õ Blésq Blom. Vamos ver no que vai dar”, explicou Britto.

Futuro, presente e passado vivem se encontrando na trajetória do grupo, mas a oportunidade de reviver e compartilhar a glória criativa e cheia de energia do então octeto tem sido uma fonte de surpresas. É que agora os novos e velhos fãs podem ouvir o disco original remasterizado e, pela primeira vez, a demotape com as versões cruas de clássicos como “Família”, “Homem primata”, “Igreja” e “Polícia”, além da inédita “Vai pra rua” (“Porrada” entrou em seu lugar no disco). “Nessa demo que gravamos em dois dias o que chamou atenção foi a sonoridade crua, com arranjos diretos e contundentes que já havíamos concebidos antes da gravação e que foram potencializados na produção do disco [a cargo de Liminha]”, relembrou Mello.

O Titãs já era bastante conhecido na época – as rádios tocavam “Sonífera ilha”, “Televisão” e “Insensível”, músicas dos dois discos anteriores -, mas os oito rapazes ainda não tinham conseguido registrar o peso sonoro que viam em si mesmos. Tudo mudaria em novembro de 1985 com a prisão de Tony Bellotto e Arnaldo Antunes (o primeiro por porte e o segundo por porte e tráfico de heroína, o que acabou fazendo com ficasse um mês na cadeia). As traumáticas experiências da prisão, da violência policial, do moralismo da sociedade e dos meios de comunicação deram um caráter de urgência ao conteúdo do novo disco.

“No ano em que lançamos o Cabeça, os Paralamas lançaram Selvagem? e o Legião Urbana, o Dois. São três discos antológicos, cheios de qualidades, mas completamente diferentes entre si. O Cabeça é a ponta mais ácida e virulenta dessa tríade e talvez por isso mesmo seja um fenômeno mais raro ainda no panorama geral da música popular brasileira. Acho que um disco assim, barulhento, com palavrões, cheio de atitude e contestação ainda é coisa muito rara no mainstream”, disse Britto.

E todo esse barulho, toda a crítica social das 13 faixas do disco, caiu como uma luva naquele momento de redemocratização brasileira. Para se ter uma ideia, nem as multas pela veiculação dos palavrões de “Bichos escrotos” impediram as rádios de tocarem (muito) a música e o disco acabou vendendo mais de 250 mil cópias. “Tenho a lembrança que éramos muito jovens, fazendo a nossa música, descobrindo o Brasil e já com a certeza de que era isso que queríamos pras nossas vidas. Deu pra perceber o quanto estávamos sintonizados e afiados para realizar esse disco”, vangloria-se Mello.


Cabeça Dinossauro é o primeiro disco titânico a sair nesse formato luxuoso. Outros álbuns que o grupo lançou pela Warner terão o mesmo fim e os mais esperados são Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas (1987) e Õ Blésq Blom (1989). “Temos muito material extra. Fitas demo ou caseiras feitas antes de cada disco com o material ainda recém arranjado, em estado bruto. E muito material gravado em ensaios. Pretendemos escolher com cuidado entre estes arquivos o que pode ser lançado em futuras edições especiais”, diz Miklos, muito preocupado com a qualidade e relevância do material a ser lançado, mas acima de tudo, animado.

Por outro lado, essas olhadelas no passado protagonizadas pelos remanescentes acabam revivendo as saídas de Arnaldo Antunes (1992), Nando Reis (2002) e Charles Gavin (2010), além da morte de Marcelo Fromer (2001). Com a palavra, o guitarrista Tony Bellotto: “A saída de um ou mais integrantes muda muita coisa em uma banda. Quando algumas pessoas decidem formar um grupo e tocar é por que elas têm química. Não é à toa que a maioria das bandas acaba ou se desconfigura quando alguém decide sair. No caso dos Titãs, cada saída foi triste, mas a morte do Marcelo [Fromer] foi, sem dúvida, o momento mais doloroso que enfrentamos. É sempre difícil superar perdas, ainda mais neste caso.”

E eles superaram, seguiram em frente, porque o show não pode parar e ainda tem muita química para rolar. “Somos um grupo sui generis, com compositores e cantores. Essa característica nos favorece musicalmente. Sempre soubemos ocupar o vazio deixado, nunca ficou um buraco na questão da sonoridade. Mas é claro que as amizades sempre fazem muita falta”, completa Bellotto.


O fato de todos os integrantes conseguirem tocar seus projetos pessoais ajudou a manter acesa a chama dos encontros titânicos: Bellotto se mostrou um hábil escritor de livros policiais; Miklos ganhou fama como ator (O Invasor, É Proibido Fumar e até uma novela, Bang Bang); Mello assinou projetos infantis como Eu e Meu Guarda-Chuva; e Britto encampou novas sonoridades em seus discos solo no decorrer dos anos 2000.

Envelhecer dentro do rock também não é um problema para nenhum dos quatro, que já estão na altura de seus 50 e poucos anos. “O que muda com o passar do tempo são outros aspectos da vida, o lado pessoal e as atitudes. Claro que fazer rock estará sempre ligado a uma ideia de juventude, mas quando estamos juntos parece que somos ainda aquele bando de garotos que se reuniu pela primeira vez para tocar. O espírito continua o mesmo”, reflete Bellotto.

Miklos concorda com o amigo de tempos de colégio, mas vai mais fundo na diversão e se define como um Titã revigorado, positivo e operante. “Atingimos outro patamar depois de mais uma mutação na formação da banda. Estamos nos divertindo como nunca e isto está muito evidente para o público. Esta excursão comemorativa do Cabeça Dinossauro está nos trazendo muitas alegrias. Casas cheias e o encontro carinhoso com os fãs. É muito bom comemorar com rock’n’roll e encontrar as pessoas em meio a toda essa energia”, resume Miklos, titã de corpo presente.

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