o ano tá acabando, muita coisa acontecendo, e ainda não consegui ouvir com a devida atenção alguns dos últimos lançamentos musicais brasileiros. no entanto, os acontecimentos do início da semana acabaram me dando esse tempo. ouvi mais vezes eddie (veraneio) e china (moto-contínuo), discos que tinham me parecido legais nas primeiras audições e que cresceram bastante; me surpreendi com os cariocas do me & the plant (the romantic journeys of pollen); confirmei que o junio barreto (setembro) é apenas bom, um tanto repetitivo e sem grandes músicas; o wado (samba 808) tá excepcional, bem como o bambas 2 e os instrumentais do bixiga 70 (bixiga 70), caçapa (elefantes na rua nova), arthur de faria & seu conjunto (música para ouvir sentado) e são paulo underground (três cabeças loucuras); karina buhr (longe de onde) continua mandando muito bem; e ainda tenho pela frente autoramas (música crocante), ava (diurno), o agridoce da pitty e celso fonseca & ronaldo bastos (liebe paradiso), entre outros. não ouvi o da marisa monte, por exemplo, e o esperado disco novo da gal costa tá chegando agora aos 47 do segundo tempo para as listas de melhores do ano (daqui há pouco elas chegam por aqui também).
nenhum desses me causou tanto espanto (no bom sentido) quanto o lira (independente, 2011), de lirinha, ex-cordel do fogo encantado. acho que demorei pra ouví-lo por causa exatamente do cordel, um grupo que eu mais respeitava que gostava. me incomodava o tom apocaliptico-profetico e a falta de música, era tudo muito pesado. e o que lirinha iria aprontar sozinho? coloquei o disco pra tocar e logo tomei um tapão nas ideias com a linda faixa de abertura, "ah, se não fosse o amor". poesia, força, sentido pop/rock e um tanto de surpresas. e vieram outras músicas sensacionais como "adebayor", "ela vai dançar" (parceria com fábio trummer, do eddie, e também registrada em veraneio), "noite fria", "sidarta", "memória" e "valete". porra, "valete"!
cantada a três vozes - simplesmente angela ro ro, otto e lirinha -, "valete" é uma canção de amor, de fim de amor, e essas vozes formam uma colcha de retalhos de sensações e pensamentos sobre esse fim. uma sobre a outra, uma comentando a outra, uma loucura de significados. a música, também de lirinha, é épica e dramaticamente romântica, e o produtor pupillo (nação zumbi) a veste de teclados, guitarras com efeitos e percussão da pesada. aliás, a produção de pupillo para o disco é uma maravilha a parte, discreta, simples, cheia de pegada e muito variada. enfim, ouça o disco todo e procure suas próprias surpresas, mas "valete", porra, "valete" é outro nível de mil grau.
valete (josé paes de lira)
angela
vê
vou te contar minha paixão por um valete de paus
e ele vivia aqui na minha mão
lira
vê quanta força há!
angela
até que um dia o vento carregou
lira
carregou, carregou
angela
revirou, suspendeu o meu amor
lira
você quer um coração tonto?
angela
carregou, carregou pra nunca mais voltar
lira
só é preciso soprar, só soprar
otto
menos mal, menos mal
fica o cheiro do perfume que quebrou
fica mais
a saudade é, a verdade é
otto & lira
que plantei e cresceu, vá buscar
eu disse, vá buscar
angela
vê
meu coração se deslocou por um valete de paus
lira
é a carta de um baralho
angela
e ele circula aqui seguindo planos
e os pés descalços entre as armadilhas
e bebe a noite como quem bebe água
levanta o corpo e se quebra em ondas
otto & lira
sei ganhar, sei perder
otto
dentro deste, outro este
otto & lira
desconcerto de papel
otto
não sei nada, não li nada
otto & lira
só joguei e rodei sem parar
lira
escorrer pela tampa e molhar
p.s.: além de otto e angela ro ro, lira conta ainda com as participações cirúrgicas de fernando catatau, maestro forró, lula cortês, duani, luisa maita e junio barreto.
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