terça-feira, 6 de abril de 2010

o horror, o horror

a crueldade humana é coisa assustadora. pode ser diária, pequena, cotidiana (alô nardonis, alô anônimos que soltaram fogos). ou então extrordinária, em grande escala, espetacular (alô hitler, alô israel). tudo é crueldade, e não adianta vir com papinho que o inferno são os outros. o inferno somos nozes. está tudo dentro da gente, esse horror de muitas caras. por isso que é importante ouvir, mais que falar, porque só assim entendemos o outro, viramos o outro.

pensando alto, na verdade. sabe como é, fui pego por aquelas coincidências que fazem a gente parar e refletir. nessa segunda, 5 de abril, a organização wikileaks divulgou um video assustador conseguido de dentro do exército americano com imagens de um ataque de helicóptero a alvos civis em bagdá em 12 de julho de 2007. collateral murder tem pouco mais de 17 minutos e traz imagens dos dois helicópteros apache (com o áudio legendado de seus tripulantes) disparando fogo pesado em uma dúzia de pessoas, incluindo um fotógrafo da reuters e seu motorista. ah, todo esse oba-oba porque teve jornalista! ah, mas foram só 12 pessoas em uma guerra de muitos milhares de mortos! o ponto aqui é outro. o video é muito revelador da gratuidade do ataque, de como os soldados tratam tudo como se fosse uma não-realidade de game, e riem, e zombam, e atiram e atiram. fiquei sabendo do video de manhã por um link que me levou ao the huffington post (no meio da torrente de informações, perdi a pessoa que colocou no twitter), e à noite li essa repercussão no new york times.



essas cenas ficaram ecoando na minha cabeça junto com imagens de um impressionante documentário que vi ontem no futura: divórcio na albânia (2007). o filme da búlgara adela peeva conta a história de três casais que foram brutalmente separados e presos pelo regime ditatorial de enver hoxha (1908-1985) durante a década de 1960. são microhistórias que contam muito sobre um dos países mais fechados do mundo e que, após o rompimento com a união soviética no final da década de 1950, passou a tratar todo estrangeiro como espião de fato. em todos esses casais absolutamente normais, uma estrangeira (duas russas e uma polonesa) virou o bode expiatório por se recusar a deixar a família. quem não renegou a "estrangeira" da casa (e isso, claro, nunca foi o motivo alegado pelas autoridades e sim a "proteção da albânia de perigo externos") foi preso, torturado, sem possibilidade de defesa. a diretora também ouve três responsáveis pelas prisões que mesmo hoje acreditam ter feito o certo. de novo, a crueldade, mas agora em escala institucional.



por outro lado, temos o pessoal do wikileaks e adela peeva que tiveram coragem, foram atrás, ouviram e, desafiando, nos trouxeram histórias importantíssimas que não deveriam nunca se repetir.

p.s.: albânia, como todos os países dos balcãs, é uma pequena obsessão minha (agradecimentos ao escritor ismail kadaré que injetou em mim, nos tempos que lia ficção, essa curiosidade com títulos como abril despedaçado, concerto no fim do inverno, dossiê h, e o general do exército fantasmao palácio dos sonhos), mas isso são outras histórias.

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