segunda-feira, 2 de novembro de 2009

tom zé chora quando vê moça nua

entrevistei tom zé apenas uma vez e foi na época da tam magazine da spring e do genial disco estudando o pagode - na opereta segregamulher e amor (trama, 2005). fui lá com o pessoal da cia. de foto e passamos um divertido fim de tarde. de lá pra cá, o baiano não parou: lançou o irregular danç-êh-sá (elo music/tratore, 2006), o dvd e álbum virtual danç-êh-sá - dvd ao vivo (trama, 2008) e o interessante, e muito feminino, estudando a bossa - nordeste plaza (biscoito fino, 2008), além de fazer muitos e lotados shows. em tempo: acho que estudando o pagode é um dos melhores e mais finos trabalhos de tom zé (com méritos a produção de jair oliveira), o que não é pouca coisa.

foto tirada durante a coletiva/happening pro disco estudando o pagode

OUTRO BAIANO QUE AMA AS MULHERES

Acompanhar o raciocínio sinuoso, bem humorado e instigante de Tom Zé é uma aventura em si. Sua fala e mais ainda sua música são uma sucessão de corredeiras, montanhas, vales, cascatas e lagoas. Em alguns momentos pode assustar, mas na maioria das vezes a viagem é repleta de surpresas delirantes. Mais elétrico que nunca, este jovem de 67 anos, acaba de lançar seu mais novo trabalho pela Trama, o CD Estudando o Pagode, onde trata de dois assuntos que lhe são muito caros no momento: a cultura de massa e a segregação da mulher.

“Eu trabalho no fio da navalha entre o ridículo e o brilhante”, avisa para quem possa achar que tais assuntos são indigestos para o universo da canção popular brasileira. Nada de tese ou panfletos. O que Tom Zé faz mais uma vez é colocar a política a serviço da música para mostrar mais uma vez que ama as mulheres. Está ao lado delas contra os homens, esses “pobres miseráveis”, que não sabem como satisfazê-las. Não é a toa que são cantoras que mais o interpretam. A lista possui nomes que vão de Mônica Salmaso a Zélia Duncan, passando por Rita Lee, Jussara Silveira, Ana Carolina e Gal Costa, e neste disco o time é reforçado por Suzana Salles, Luciana Mello e Patrícia Marx.

Há pouco tempo atrás o baiano de Irará escreveu uma música reveladora de sua atração pelo sexo oposto no disco Jogos de Armar. Reveladora tanto no título, “Medo de mulher”, quanto em seus deliciosos últimos versos: “Boi, boi, boi cara de lua / Toim Zé ainda chora / Quando vê moça nua”. Confira abaixo o que Tom Zé acha disso tudo:

Qual era a sua expectativa antes de lançar o disco?
Tem duas versões para essa resposta. A primeira é a que eu esperava conseguir vender os 40 mil discos que costumo vender. A outra... quando você faz um disco pensa que tá fazendo o melhor do mundo... não diz isso a ninguém, mas no íntimo você pensa... e que você vai criar um problema na porta das lojas. Esse é o sonho. Mas depois você vê a realidade que não é tanto nem tão pouco. Penso assim: o que adianta você ter algumas idéias se você não ama o público? Você precisa amar as pessoas que lhe sustentam. Quem me sustenta é esse público, então tenho que atender a estas pessoas com algo que dê auto-estima, vontade de aprender alguma coisa e um leque maior de diversificação estética. E tenho que reduzir isso a um sistema que fique viável pra eles. Por isso que resolvi fazer música popular, para ver alegria e entusiasmo nos olhos das pessoas. Trabalho para isso e também para produzir essa proteína chamada rebeldia.

E o que você achou da recepção?
Tenho sempre que agradecer a crítica que é sempre muito gentil. Mas dessa vez foi um pouco mais que o de costume. E o show... ninguém esperava lotar o Sesc Pinheiros três noites seguidas. Mil pessoas por noite. A gente teve medo, mas quando chegou de tarde lá já soube que tava lotado. Foi uma alegria, virei o maior lotador de teatro. Na França não é surpresa, uma semana antes já estava lotado. É mais surpresa ser bom aqui no Brasil porque geralmente o exterior me recebe com muita alegria.

A maioria das matérias sobre o disco privilegiou mais a questão do pagode que a da mulher e isso ficou ainda mais patente na sua participação no Roda Viva (TV Cultura). Porque você acha que a crítica foi mais por esse lado?
O machão brasileiro prova mais uma vez que ele não trata do assunto que não quer tratar (risos), mas não posso querer mal a ninguém, porque as pessoas me ajudam... o engraçado é que todo mundo sente que tá elogiando quando falam que sou um artista complexo, difícil e tal, e eu venho lutando para ser mais popular... mas voltando, o preconceito contra a mulher é muito forte, contra homossexuais, lésbicas, pobres e contra tudo é muito forte. Tanto que as perguntas eram... você fez pra esculachar o pagode? E o assunto de que uma classe no Brasil colocada de lado, completamente excluída, que não tem direito a nenhuma educação e que é submetida a uma cultura de massa terrível... isso não interessa. Só interessa falar mal do pagode.

E qual a saída para o homem deixar de ser esse pateta miserável?
Se soubesse a resposta não tinha feito o disco (risos). Mas é o caso de voltar ao meu tempo de solteiro. A minha primeira namorada... na década de 1960 você não transava com as namoradas, mas quando a intimidade vai aumentando, cinco ou seis anos, você já pega em tudo como todo mundo. E ela, à cada novidade que surgia, interiormente comemorava, vibrava. Com outras namoradas isso não aconteceu e eu não sabia o porquê. Depois soube: elas não vibravam, não gozavam. Era como se não tivesse acontecido nada. A minha tese é que as mulheres não gozam porque foram criadas com preconceito em relação ao sexo. A condição feminina é vilipendiada em todo lugar. Fora isso as mulheres não são convenientemente excitadas ou são largadas pelo macho depois que goza. Esse assunto tem que ser mais discutido. O homem precisa deixar de ser esse autista para ver que é uma desvantagem ter a mulher como uma inimiga em potencial. Foi um péssimo negócio. Olha, a mulher com o pé atrás torna a vida na Terra um desastre.

O homem precisa de educação, de alteridade...
Muito bem. Nós estamos muito ruins nesse negócio de alteridade. Estamos ruins com as mulheres, com os pobres, com as religiões e com o planeta. Respeitar os outros, né? Tudo na vida é um constante aprendizado e cada dia é um mistério.


e pra encerrar, o clipe de "o amor é um rock", um das melhores faixas do disco.

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